Passado, presente e futuro: como o clima interfere na Metade Sul do Rio Grande do Sul?
Todo produtor rural tem seu negócio a céu aberto, não tendo domínio sobre as variações do clima. O que se consegue fazer é tentar prevê-lo e mitigar os seus efeitos danosos à produção agrícola.
Daqui em diante será feito um paralelo sobre os impactos do clima nas duas principais culturas, arroz irrigado e soja, cultivadas na Metade Sul do estado do Rio Grande do Sul, nos últimos 20 anos, e o que se esperar para as próximas duas décadas.
Sempre quando se conversa sobre clima com pessoas mais experientes, elas falam: antigamente chovia mais, ou, em tal ano a estiagem foi tão grande que o rio secou, e por aí vai. É porque o clima é governado por ciclos (os mais conhecidos e de maior impacto no Sul do Brasil são o El Niño e o La Niña). As séries de produtividades de grãos de arroz irrigado (Figura 1) e de soja (Figura 2) no RS mostram como elas foram influenciadas por esses ciclos nos últimos anos.
Para o arroz, como é irrigado, as flutuações na produtividade ao longo das safras não são tão bruscas, contudo se observa a tendência de diminuição em anos influenciados pelo El Niño e de aumento em anos influenciados pela La Niña e nos Neutros, à exemplo do que ocorreu nesta safra, 2019/20. Safras com La Niña ou Neutralidade têm incidência de alta radiação solar. Com mais radiação solar há aumento da taxa fotossintética das plantas e, em consequência, há maior aproveitamento do nitrogênio aplicado, resultando em maior produtividade.
O segundo fator que interfere na produtividade de arroz são os extremos de temperatura que ocorrem na fase reprodutiva. Com a antecipação da época de semeadura, preconizada pelo Projeto 10 do IRGA, a partir de 2004, os prejuízos devido à incidência de baixas temperaturas na microsporogênese diminuíram. Já a ocorrência de altas temperaturas na antese, como ocorreu na safra 2013/14, com longa sequência de dias com temperaturas superiores a 35 °C, foi uma das causas de redução da produtividade média do arroz, por aumentar a esterilidade de espiguetas. É possível que esse efeito de alta temperatura possa ter se verificado na safra 2019/20, em que também houve uma onda de calor, porém menos intensa que a da safra 2013/14.
Para culturas de sequeiro, os efeitos do El Niño, La Niña e Neutralidade são opostos, visto que a maioria das lavouras não possui irrigação complementar. Para o cultivo da soja no RS (Figura 2), a variação da produtividade de grãos no tempo é mais drástica, quando comparada ao arroz. Sem irrigação, as culturas de sequeiro ficam bem mais dependentes da água das chuvas. Por isso, em safras com El Niño as produtividades são maiores.
Por outro lado, em safras com El Niño, haverá redução na produtividade de grãos de soja quando cultivada em áreas de arroz irrigado, pois a drenagem é deficiente e o excesso hídrico diminui muito sua produtividade. Assim, como em anos muito secos, como ocorreu na safra 2011/12 e, provavelmente, é o que mostrarão os resultados da safra 2019/20.
Ou seja, os extremos muito secos ou muito chuvosos não são bons para a soja em áreas de rotação com arroz (Figura 3).
Falando agora do presente, a fase é de Neutralidade climática, que deverá continuar, ao menos, até o final do inverno de 2020. Com isso, espera-se que o final do outono e o inverno tenham chuvas entre o normal ou acima da média climatológica. As temperaturas deverão ficar acima do normal climatológico no trimestre maio, junho e julho em todas as regiões do RS.
E o que esperar dos próximos 20 anos? Com toda a certeza, os ciclos Neutros, de El Niño e de La Niña continuarão ocorrendo. Porém, não é possível dizer quando ocorrerão, nem com que intensidade. Mas, com base nos dados do passado, tem-se que das últimas 41 safras (de 1979/80 a 2019/20) 34,1% foram sob El Niño, 34,1 % foram sob La Niña e 31,7 % foram Neutras.
São muitos os fatores que influenciam o clima, o que torna a arte da agricultura tão desafiadora.
Além disso, muitos estudos têm sido feitos, com base em dados medidos em estações meteorológicas de todo o mundo, os quais têm constatado que a temperatura média do Planeta Terra está aumentando. Com isso, eventos extremos, como ondas de calor, estiagens e enchentes, deverão se tornar mais frequentes e intensos daqui por diante.