Reforma tributária: a hora H

 Reforma tributária: a hora H

Novo sistema tributário brasileiro está em momento decisivo no Congresso Nacional

Os avanços e riscos da nova lei para a orizicultura do país

Tramita no Senado da República uma proposta de emenda à Constituição Federal (PEC 45/2019), já aprovada na Câmara dos Deputados, que altera a dinâmica dos impostos sobre o consumo no Brasil. A reforma substitui cinco tributos existentes por dois novos com o objetivo de simplificar o sistema, reduzir distorções e aumentar a transparência ao consumidor.
A proposta cria dois fundos, um de desenvolvimento regional e outro para a compensação de benefícios fiscais que serão extintos após a implementação da reforma.

O sistema tributário atual é considerado complexo e disfuncional, pois é cumulativo e penaliza setores com maiores cadeias de produção, baseado na tributação na origem. Isso onera investimentos e exportações e permite a chamada Guerra Fiscal, com múltiplas alíquotas, o que reduz a transparência ao consumidor e aumenta a litigiosidade.

A reforma tenta resolver isso ao adotar a não cumulatividade plena, a tributação no destino e as três alíquotas: padrão, reduzida e zero.

A proposta foi aprovada no Plenário da Câmara dos Deputados, em dois turnos, no último dia 7 de julho. Caso aprovada em definitivo, a transição dos tributos antigos para os novos começará em 2026. Além de passar no Congresso, há necessidade de aprovação de lei complementar que detalhe os novos tributos.

Questões como a definição do conceito de operações com serviços, regimes diferenciados e favorecidos, distribuição do imposto, definição de créditos para cálculo da não cumulatividade, definições acerca do Conselho Federativo, distribuição dos fundos, entre outras matérias, serão discutidas nessa segunda fase, que deverá ser ainda mais complexa.

Somente após a definição dos aspectos relegados à lei complementar é que será possível fazer o cálculo da alíquota de referência, mas os especialistas acreditam em um valor próximo de 25%.

 

Agro elencou prioridades

Projeto no Senado tem lobby por avanços no texto original da RT

O setor do agronegócio brasileiro apresentou 12 demandas a serem discutidas na tramitação da reforma tributária no Senado. A questão chave é a redução de 80% da alíquota a ser aplicada sobre insumos e produtos da agropecuária em relação à alíquota padrão. O texto aprovado na Câmara reduziu a alíquota ao setor em 60%. Dessa forma, a carga tributária sob o regime especial para o agronegócio seria equivaleria a 40% da alíquota de referência, estimada em 25%.

As prioridades foram apresentadas pelo Instituto Pensar Agro (IPA) e entregues pela Frente Parlamentar da Agropecuária ao coordenador relator do grupo de trabalho da reforma tributária no Senado, Efraim Filho (União Brasil-PB). Um ajuste considerado fundamental para o setor é a ampliação do teto de produtores desobrigados a aderir ao regime do imposto sobre bens e serviços (IBS), de faturamento máximo bruto de R$ 3,6 milhões para R$ 4,8 milhões por ano.

Outra preocupação é a possibilidade de Estados estabelecerem imposto sobre a exportação da cadeia primária em substituição a fundos regionais. O setor rechaça. Após obter a desoneração sobre os produtos da cesta básica, o IPA pede no Senado a aplicação de imposto zero para esses itens. Os temas são considerados essenciais. Embora a avaliação seja de que não houve prejuízos ao agro no texto aprovado na Câmara Federal, a expectativa é de que no Senado o setor busque avanços.

O setor do agronegócio brasileiro apresentou 12 demandas a serem discutidas na tramitação da reforma tributária no Senado

Os 12 pedidos
– Redução da alíquota – Ajustar de 60% para 80% a redução da alíquota de impostos para produtos agropecuários e regras de crédito.
– Aumentar o limite de faturamento anual de R$ 3,6 milhões para R$ 4,8 milhões ao ano para isenção de impostos aos produtores rurais.
– Impedir a criação dos fundos estaduais em substituição às atuais contribuições.
– Deixar claro que o ICMS não poderá ser majorado.
– Imposto zero para os itens da cesta básica desde a finalização do produto.
– Diminuir prazo para o ICMS e incluir PIS/Cofins em relação aos créditos acumulados.
– IPVA – Levar em consideração o impacto na produção do combustível, ou seja, que passe a ser considerado o impacto tributário da cadeia produtiva do combustível e não apenas levantamento que leve em consideração o veículo.
– Cálculo do tributo sobre a aquisição em relação ao crédito presumido deve ser feito sobre o valor da aquisição, levando em conta o valor da alíquota que incidirá, sem qualquer diminuição.
– Não tributar as exportações e não estornar créditos, com a garantia de restituição em até 60 dias, além da criação de regimes especiais para importação de produtos agrícolas.
– Adequação para que não haja imposto seletivo para cesta básica e demais itens essenciais que terão alíquota reduzida.
– Crédito da não cumulatividade – Não condicionar o aproveitamento ao recolhimento ou sub-rogação. Ou seja, quanto ao PIS/Cofins, citar expressamente que os créditos acumulados desses dois tributos poderão ser compensados com a CBS devida após a transição. E, quanto ao ICMS, diminuir o prazo para aproveitamento em até 60 meses (cinco anos, ao invés
de 20 anos propostos) e atualização pela Selic.
– ITCMD – Garantir na Constituição Federal que a lei complementar defina a não incidência de imposto no caso de sucessão familiar nas pequenas propriedades rurais acerca do imposto sobre herança.

O fim das distorções

O economista-chefe da Farsul, Antônio da Luz, entende que o fim das distorções causadas pelo atual sistema tributário deverá impactar positivamente a produtividade e o crescimento do Brasil, e isso vale para o agronegócio e a cadeia produtiva do arroz. “De 191 sistemas tributários acompanhados no Banco Mundial, o nosso é considerado o sexto pior. Mudanças, portanto, são muito bem-vindas”, observou.

No caso do arroz, o economista lembrou que a tributação tem “efeito cascata” e incide sobre os insumos, com os impostos sendo sucessivamente cobrados ao longo da cadeia produtiva. A burocracia também é gigantesca: “Uma indústria de arroz precisa ter departamento de contabilidade especializado nas regras do ICMS de cada uma das 27 unidades federativas do país e o ISS de mais de 5,5 mil municípios”, enfatizou.

Para Luz, só a redução dessa burocracia, com a estipulação de regras claras e únicas, já será um grande avanço, mas tem mais: produtos da cesta básica deverão ter a alíquota incidente zerada. Considerando que hoje, por causa da Guerra Fiscal, há prejuízos aos estados produtores, caso do Rio Grande do Sul no arroz, a alíquota única estabelece uma condição mais justa de competir, principalmente com o arroz que entra do Mercosul.

O economista da Farsul enfatizou que há ao menos dois pontos que eram preocupantes e foram superados. Foi vetada a tentativa de incluir insumos agrícolas no rol dos impostos seletivos, onde deverão ficar cigarros e bebidas, por exemplo.
Também a tentativa de tributar máquinas agrícolas, juntamente com iates, jatinhos e outros bens, foi rejeitada, uma vez que se tratam de equipamentos de bens de capital, não de consumo.

Para Antônio da Luz, embora ainda precise de ajustes, a reforma tem a característica, em linhas gerais, de tornar o produto brasileiro mais competitivo e estar blindando o risco de serem criados impostos sobre exportações, que são ameaças permanentes. “Corrige distorções como as vantagens que o produto importado, 100% desonerado, tem para ser mais competitivo”, frisou.

Resistência
O economista da Farsul entende que haverá atores setoriais que serão resistentes à proposta, mas lembrou que “quem é da área sabe de cor quais foram os economistas contrários ao plano real”, em alusão à necessidade de evolução do sistema tributário brasileiro.

Outro ponto sensível para Antônio da Luz é a necessidade de boa parte da reforma ser regulamentada por lei complementar, cujo teor ninguém sabe exatamente qual será. “Isso abre uma brecha para decisões políticas e, às vezes, oportunistas, que podem gerar novas distorções nas regras tributárias”, reconheceu.

“De maneira geral, a reforma vem pra ajudar e é positiva, mas o agronegócio precisa estar atento a cada passo, estabelecer suas metas, critérios, diálogos, para não reclamar depois”, avisou.

Cesta básica
Pela proposta de reforma tributária, o valor da cesta básica deverá ter diminuição quando uma lei complementar definir a lista nacional de produtos que terão alíquota zero. Ainda não se sabe o impacto final sobre os preços e nem o que constará na lista. Mas o arroz tem presença certa.

Combustíveis
A reforma tributária busca estabelecer um regime de tratamento diferenciado para combustíveis e lubrificantes. O imposto sobre valor adicionado (IVA) dual, com alíquota única, será cobrado no refino ou importação. Veículos que usarem combustíveis fósseis pagarão IVA mais alto. Há uma lista de exceção para evitar cobrança sobre veículos usados para a agricultura e serviços. São aeronaves agrícolas e certificadas para prestar serviços aéreos a terceiros, embarcações de pessoa jurídica com outorga de serviços de transporte aquaviário, tratores e máquinas agrícolas.

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