Brasil e Argentina negociam salvaguarda ao arroz e outros produtos

O governo brasileiro voltará a negociar dentro de duas semanas a criação de um mecanismo de salvaguardas com a adoção de barreiras no comércio entre os dois países, em caso de ameaça à indústria local. A discussão, proposta pelos argentinos, finalmente foi aceita pelos brasileiros. O arroz e o vinho argentino devem estar entre os produtos com salvaguarda .

O Brasil já considera inevitável a adoção de algum mecanismo de salvaguarda e ou barreira para alguns produtos argentinos em contrapartida às medidas do gênero criadas pelo país vizinho. O assunto, antes classificado de inaceitável pela equipe econômica e pelo Itamaraty, finalmente passará a ser discutido. Os dois governos deverão formalizar regras para criação de cotas de importação hoje impostas informalmente em setores como geladeiras e calçados.

Os argentinos receberam do ministro da Fazenda, Antônio Palocci, a garantia de que o governo brasileiro se dispõe a discutir o assunto, antes colocado em segundo plano. O secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Márcio Fortes, foi encarregado de comandar as discussões com o governo vizinho. O futuro mecanismo foi criado pelo ministro da Economia da Argentina, Roberto Lavagna: Cláusula de Adaptação Competitiva (CAC).

Ontem, Márcio Fortes teve um encontro com a equipe argentina para discutir os problemas setoriais, de indústrias que se dizem ameaçadas pela concorrência do vizinho. Não confirmou, porém, se já nesse encontro foi apresentada a contraproposta brasileira ao documento entregue a Palocci por Lavagna, com as condições de funcionamento da CAC. A expectativa, entre os técnicos, é realizar uma reunião para discussão da proposta ainda na primeira quinzena de julho.

Há pontos polêmicos, que poderão ainda travar a discussão. Mas os integrantes do governo concordam em um ponto: houve uma inflexão do governo Lula, que antes considerava um retrocesso a existência de qualquer mecanismo formal de contenção de exportações entre os vizinhos – e agora aceita formalizar um sistema que já vinha funcionando informalmente, com produtos como calçados.

Pela proposta argentina, quando houver um súbito aumento de importações proveniente de um dos dois maiores sócios do Mercosul seriam criadas cotas (limites para venda dos importados no mercado afetado). Acima da cota, os produtores poderiam continuar vendendo, mas os produtos excedentes teriam de pagar a Tarifa Externa Comum (TEC), cobrada de mercadorias de terceiros países.

A criação da cota seria antecedida por negociações, que poderiam resultar em compromissos voluntários de restrição de exportação. Para a adoção das cotas será necessário comprovar o súbito aumento de importações e a real ameaça de dano à indústria nacional, o que exigirá estatísticas mostrando que os produtos sujeitos à salvaguarda ocupam parcela expressiva do mercado afetado, e que podem deslocar a produção local.

O governo brasileiro deixou claro aos argentinos que o mecanismo deverá ser bilateral, o que significa que empresários brasileiros afetados por importações de produtos argentinos – como os produtores de arroz e os vitivinicultores do Rio Grande do Sul – também poderão solicitar as salvaguardas, quando for criada a CAC.

A proposta argentina prevê a necessidade de apresentação de planos de recuperação do setor protegido pela futura salvaguarda, e prazo de duração, de até três anos. A discussão bilateral deve ser estendida, no futuro, ao Mercosul, onde o Paraguai, na última reunião de cúpula do bloco, em junho, já reivindicou mecanismo semelhante.

O que ainda desperta sério atrito entre as equipes da Argentina e do Brasil é a proposta argentina de que a Cláusula de Adaptação Competitiva também seja acionada porfatores macroeconômicos. Pela proposta, seriam criadas cotas também para produtos que fossem prejudicados por uma súbita mudança nas cotações das moedas dos dois países, capaz de dar maior competitividade aos produtos de um dos vizinhos.

A ocorrência de recessão em um dos países, capaz de levar os produtores do país a despejar mercadorias no mercado vizinho, também seria razão suficiente para acionar as salvaguardas. A equipe econômica resiste à medida, que equivaleria a criar uma espécie de “gatilho” na relação comercial dos dois países, mas a idéia não foi totalmente descartada no Brasil.

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