Crédito anunciado esbarra na burocracia e chega só em 2009
As divergências entre o discurso de ampliação do crédito e a chegada efetiva ao bolso do produtor podem impactar diretamente os planos de ampliar a produção nacional de grãos.
Os R$ 5,5 bilhões anunciados na terça-feira pelo governo federal só deverão chegar ao bolso dos produtores no início de 2009, após o plantio da safra de verão, a que mais demanda o crédito para cobrir custos.
As divergências entre o discurso de ampliação do crédito e a chegada efetiva ao bolso do produtor podem impactar diretamente os planos de ampliar a produção nacional de grãos.
Representantes dos produtores avaliam como positiva a preocupação do governo com o setor, mas afirmam que as boas intenções de nada adiantam, pois esbarram na burocracia e na lentidão.
Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), o setor privado deverá ofertar R$ 3 bilhões do total anunciado. “É uma boa atitude do governo, mas só terá efeito no médio e longo prazos”, avalia Ademiro Vian, assessor de técnico da Febraban.
Segundo disse, a reivindicação da instituição era a de que fosse utilizado o compulsório já retido no Banco Central, descontando os valores nas remessas mensais dos bancos.
– Seria mais eficiente, pois os produtores teriam acesso imediato a esse crédito – acrescenta.
– O governo precisa parar de anunciar e trabalhar na aplicação do que já foi prometido – protesta Carlos Sperotto, presidente da Comissão de Crédito Rural da Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).
Ele revela que, na prática, a lei que favorece o acesso dos produtores ao crédito não é cumprida.
– O aumento da classificação do risco do produtor somado aos impasses na prorrogação da dívida impedem o acesso. O produtor não pode ser penalizado por problemas inesperados que afetaram as lavouras e reduziram sua renda – observa.
No caso de Mato-Grosso, maior produtor de grãos do País, o atraso dos recursos causará um impacto direto na safra deste ano.
– Realmente o processo de liberação desses recursos é demorado. A agricultura como um todo precisa do dinheiro. Os maiores gastos ocorrem no momento do plantio – avalia Seneri Paludo, superintendente do Instituto Mato-grossense de Economia Agrícola (Imea).
Dados do Imea mostram que, em média, o estado toma apenas 8% do crédito oficial. Paludo explica que o percentual é pequeno em virtude da dificuldade em obter os recursos oficiais.
– O problema é a burocracia. O governo oferta pouco dinheiro no estado, por isso, a prioridade são os bancos privados – explica Paludo.
Ainda segundo o instituto, a projeção de crescimento de área foi revista.
– Os 3% que esperávamos já foram eliminados – diz.
A expectativa é que 5,6 milhões de hectares sejam plantados.
O presidente da Sociedade Rural Brasileira (SRB), Cesário Ramalho, disse que qualquer sinalização de ajuda é positiva.
– O governo está atento e fez o correto.
Mas lembra que os custos de produção subiram pelo menos 30% em uma ano, número que os recursos oficiais não acompanharam.
– A demanda está reprimida. Os gerentes de alguns bancos estão ansiosos por novas normas que ajudem a aprovação de novos contratos. Eles conhecem a realidade do produtor de perto – acrescenta Ramalho.
– Se o crédito realmente demorar será um atentado contra a inteligência – afirma Sperotto.
Conforme os dados divulgados pelo Banco do Brasil, maior financiador da safra brasileira, até o dia 10 de outubro, R$ 8,5 bilhões (43%) do total da verba para o custeio foram liberados.
– A expectativa é que esse número cresça 40% em relação ao ano passado – prevê José Carlos Vaz, diretor de agronegócio do banco.
Ele confirma que a demanda crítica por crédito ocorre durante o plantio, mas afirma que a expectativa é atender toda a demanda.
– Esperamos atender os clientes tradicionais e os que migraram por não achar crédito em tradings e outros bancos.
O banco responderá sozinho por R$ 2 bilhões do total anunciado.
– Esses novos recursos serão usados em 2009, pois já foram adiantados R$ 5 bilhões para custeio. Caso o dinheiro acabe, a ordem é antecipar o uso – diz.
Para Luiz Antonio Digiovani, superintendente da Federação da Agricultura do Paraná (Faep), a maior preocupação será a comercialização.
– Precisamos de ação efetiva na comercialização, senão vai acontecer igual ao trigo.