Choque global

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Bento: arroz brasileiro é parte da aldeia global

Safra brasileira menor não traduziu melhora de preços até agora.

Para quem apostava que a redução de safra de 10,8% no Brasil e o dramático quadro de perdas de mais de 1,2 milhão de toneladas de arroz no Rio Grande do Sul por causa do clima seriam traduzidos em melhores preços de comercialização, a realidade bate à porta. Com sua produção integrando as duas pontas do comércio internacional, como um dos 10 maiores importadores mundiais e um dos 10 grandes exportadores nos últimos cinco anos, o Brasil hoje sofre influências visíveis das correntes e variáveis do mercado internacional e da macroeconomia, onde podemos incluir o câmbio.

Os preços internos, há muito influenciados pela capacidade exportadora do Mercosul, agora também são definidos por conjunturas que envolvem também as safras e oferta dos Estados Unidos e até da Ásia, além das demandas africana, do Oriente Médio, América do Sul e Caribe, principalmente. Uma decisão de exportar da Índia, por exemplo, pode enxugar alguns centavos, ou até reais, no preço de uma saca de 50 quilos de arroz em casca numa propriedade rural em Bagé (RS).

Embora muitos produtores ainda não tenham se dado conta e consolidem suas esperanças na relação volume de safra x preço, hoje o mercado do Brasil vê a formação de preços a partir também de bases constituídas pela oferta regional (Mercosul) e internacional, pelo câmbio (real valorizado perante o dólar), preço do petróleo e até as condições das safras mundiais de milho, trigo ou soja, que determinam movimentos em todo o mundo, inclusive no Brasil – além do peso da oferta e demanda interna, até o momento ajustada. A velha máxima de que as perdas na safra sempre resultavam em preços altos na entressafra perde força com o “choque global”, as paridades de importação e exportação e o câmbio, que estabelecem um teto e um piso de comercialização no mercado interno.

Assim, em 2010 a cadeia orizícola segue num dilema. Por um lado, os números de oferta e demanda mostram que o atual ciclo comercial será o mais apertado dos últimos anos, com demanda por importações, por outro, os preços internacionais estão entre 15% e 20% mais baixos em relação ao ano passado e, com a força do real em relação ao dólar, uma recuperação mais consistente das cotações esbarraria na paridade de importação. Dentro deste contexto, o varejo não se sente seguro em aceitar preços mais altos. Os engenhos, para manter os espaços nas gôndolas, também veem a possibilidade de repasse de eventuais altas do grão em casca estreitada. No final desta cadeia está o produtor, que se forçar uma elevação acaba ficando fora do mercado, pois existe a possibilidade de compras externas.


CENÁRIO

O analista Élcio Bento, da Safras & Mercado, considera que a situação do mercado externo não é a melhor para a formação de preços no Brasil. Apesar disso, ainda existem sete meses do atual ano comercial e pode haver muitas novidades movimentando as variáveis formadoras de preços. No mercado internacional o ano comercial 2010/11 inicia em agosto e eventuais quebras de safras podem resultar em recuperação dos preços.

“No Brasil, em ano de eleições presidenciais, o câmbio tende a ficar mais volátil. Além disso, num ano em que o quadro de abastecimento é muito justo, as movimentações nas variáveis exógenas costumam ter reflexos mais fortes sobre os preços. Por isso os agentes tendem a ficar menos expostos, para não correr os riscos de ficarem fora da realidade de mercado”, cita o analista. Segundo ele, o espaço para recuperação existe e, se os preços externos e o câmbio mantiverem o atual comportamento, devem limitá-lo, mas não impedi-lo.

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