Expectativa frustrada
Produtores de Santa Catarina esperavam colher mais em razão do que foi investido na lavoura
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A produção orizícola no estado de Santa Catarina se caracteriza pela estabilidade no que diz respeito aos volumes colhidos ao longo dos últimos anos. Os números da safra 2014/15, levantados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) em seu último relatório mensal divulgado em julho, confirmam este desempenho. Mesmo com a redução de 1,5% da área plantada, as lavouras totalizaram 1,1 mil toneladas do grão no período, com destaque para a ótima qualidade do produto.
A produtividade média apresentou um crescimento de 0,6% em relação à safra anterior, mas em termos de volume a produção registrou uma queda de 0,9% se comparada ao 1.067 milhão de toneladas obtidas em 2013/14.
“O desempenho da safra passada, acima de 1 milhão de toneladas, foi positivo, mas os agricultores esperavam mais em razão do que foi investido. A expectativa de colhermos algo em torno de 170 e 180 sacas por hectare acabou sendo frustrada. De um modo geral, acabamos colhendo em média pouco mais de 130 sacas por hectare no estado”, relata o produtor catarinense André Acordi.
Às vésperas de dar início aos preparativos para o plantio da próxima safra, Acordi, que cultiva 150 hectares com arroz em Santa Catarina e outros 450 hectares de área arrendada no Rio Grande do Sul, se mostra apreensivo com o momento vivido pelo setor. “Os custos de produção estão mais altos, a energia elétrica subiu muito, a mão de obra é cada vez mais cara. Isso acaba
desestimulando os produtores.
As tabelas de cálculo da Conab estão defasadas em relação à evolução da lavoura. Hoje, fazemos uma agricultura de precisão, enquanto a Conab trabalha com os mesmos parâmetros de quando se produzia apenas 30 ou 40 sacas por hectare”, argumenta.
Apesar do clima de desânimo, ele não acredita que possa haver uma redução da área plantada no estado. “O clima está sendo favorável para o preparo do solo no sistema pré-germinado, mas, a exemplo de outros produtores, já estou cultivando quase 80% da lavoura no sistema convencional, que proporciona custos menores”, relata.
Além de produtor, Acordi é apontado como uma importante liderança setorial no estado e ainda faz parte da Cooperativa Central Brasileira de Arroz (Brazil Rice), entidade criada em 2012 que reúne a Cooperja, de Jacinto Machado, a Cooperjuriti, de Massaranduba, a Cravil, de Rio do Sul, a Coopersulca, de Turvo, e a Copagro, de Tubarão. Juntas, as cinco cooperativas colhem cerca de 450 mil toneladas por ano do cereal. O valor representa 35% de toda a produção catarinense, que é de 1 milhão de toneladas por ano.
Acordi é também um dos 32 produtores que integram a Associação de Produtores de Arroz do Município de Sombrio, no sul do estado, onde são cultivados 1.650 hectares de arroz. “Só eu planto 10% do volume colhido na região”, afirma.
Crise temporária
O impacto da recessão econômica, que afeta com maior intensidade a lavoura de arroz, na avaliação de André Acordi, poderia ser bem menor se o governo atacasse as questões estruturais da agricultura brasileira como um todo. “Do ponto de vista político, os agricultores estão cada vez mais desassistidos e os sindicatos, por sua vez, cada vez mais atrelados ao governo. Não existe uma política agrícola que contemple essas demandas do setor produtivo”, observa.
O produtor cita como exemplo o fato de o governo permitir a entrada de arroz do Mercosul e ao mesmo tempo proibir a aquisição de máquinas e insumos dos países vizinhos. “Uma colheitadeira produzida no Brasil, que aqui custa R$ 600 mil, no Uruguai e na Argentina sai por R$ 300 mil”, compara.
Embora reconheça que a crise vivida pelo setor seja temporária, Acordi teme que seus efeitos tenham consequências permanentes para os produtores. “Muitos agricultores, inclusive meus vizinhos, estão quebrados, outros vão quebrar e alguns ainda nem perceberam que já estão quebrados. Se um produtor como eu, que produz 100 mil sacas de arroz, passa por dificuldades, imagine os outros”, lamenta.
A alternativa encontrada por ele foi abrir mão dos financiamentos do governo para o custeio da lavoura. “Eu costumava pegar alguma coisa no Banco do Brasil, que aqui em Santa Catarina é mais exigente nas garantias em comparação com o Rio Grande do Sul.
Você tem que renovar o custeio todo o ano e eu tinha uma dívida há dois anos. Foi quando o Conselho Monetário Nacional baixou uma portaria prorrogando as dívidas por 10 anos. Ao utilizar este recurso, o banco parou de emprestar. Mas foi aí que consegui algum fôlego para continuar na atividade. Agora, investimento só com capital próprio”, assegura.
Segundo Acordi, as dificuldades financeiras têm feito grande parte dos produtores aderirem ao que é chamado no estado de “venda do arroz em erva”, ou seja:“Eles adquirem insumos e fertilizantes com 20% e até 30% de acréscimo para pagar com a entrega do arroz na colheita.
Algumas indústrias, por exemplo, se beneficiam da declaração de aptidão ao Pronaf (DAP) com recursos a uma taxa de 2% que são repassados aos produtores com reajuste de 20% a 30%, o que, a meu ver, é pura agiotagem. Se eu montasse um engenho para beneficiar parte da minha produção estaria ganhando dinheiro”, relata.