Indústria tende a “rebaixar” cotações de variedade

 Indústria tende a “rebaixar” cotações de variedade

Cultivar em cheque: entre o desempenho agronômico e o interesse da indústria

Irga 424 RI tem excelente desempenho agronômico, mas a indústria vê defeitos em excesso e vem valorizando outras cultivares.

Por trás de todos os problemas gerados pelas perdas na safra passada, do avanço da brusone – doença fúngica mais importante da lavoura nacional -, e de um mercado no qual ao menos 50% da produção foi comercializada abaixo do custo de produção, uma polêmica só começou a ganhar corpo agora. E promete dar muito pano para a manga na próxima safra: a indústria está rebaixando as cotações e até rejeitando a compra de grãos da variedade Irga 424 RI, a que mais deve ter crescimento de área na próxima temporada e única que tem mostrado efetiva resistência à brusone.

O tema é preocupante e põe alguns agricultores entre “a cruz e a espada”. Ou plantam a variedade, reduzem custos com herbicidas e fungicidas e tem melhor produtividade, ou optam por cultivares mais susceptíveis à doença, a invasoras, que demandam mais trabalho de manejo, mas têm melhor mercado. O problema é que o cálculo não é simples, e não há garantia de que todo esse esforço realmente valha a pena. Nem para ganhar mais, nem para menos.

É normal o uso de duas a quatro variedades diferentes em quadros e etapas diferentes das lavouras. Mas, a presença da Irga 424 RI na próxima temporada deve abocanhar uma fatia maior do mercado.Na temporada passada a “424 RI” foi a terceira cultivar mais plantada no Rio Grande do Sul, alcançando 142 mil hectares, ou 13,5% da área, perdendo apenas para Guri Inta CL e Puitá Inta CL. A expectativa é de que na temporada 2016/17 a variedade alcance pelo menos 20% da superfície semeada, perto de 210 mil hectares. O seu ótimo desempenho agronômico, com muito boa produtividade e resistência à brusone e a característica de conter um gene tolerante aos herbicidas do grupo das Imidazolinonas, com menor efeito de fitotoxicidade sobre as plantas, eleva as características desejáveis para os produtores. A variedade permitiria uma redução no custo dos insumos.

Do ponto de vista comercial, no entanto, a variedade parece estar seguindo os passos da Irga 422 CL, que em função de alguns defeitos era sistematicamente “rebaixada” na compra em algumas regiões. O avanço de algumas indústrias de fora do Rio Grande do Sul desde julho, em busca das chamadas variedades nobres no Litoral Norte, na Planície Costeira Interna e até mesmo na Fronteira, vem estabelecendo parâmetros ainda mais rigorosos. A maior parte delas sequer considera a compra da variedade IRGA 424 RI, mas paga com sobrepreço pelas variedades BR Irga 409 e BR Irga 417. Estas duas variedades somaram apenas 71 mil hectares semeados em 2015/16, ou seja, metade da BR Irga 424 RI.

Empresas que estão financiando diretamente aos rizicultores, têm optado por imporem no contrato – ou sugerirem – o cultivo de outras variedades. Embora não seja uma regra, há diversos relatos neste sentido. A indústria considera que, apesar de alcançar bom percentual de inteiros, a variedade tem muito grão gessado/barriga branca, defeito que, no pacote, pode rebaixar o tipo do arroz.

O tema não é novidade no setor, mas além dos defeitos presentes na variedade – mais em algumas lavouras do que em outras – existem mais argumentos por detrás deste comportamento da indústria. Não é só o fato de haver um maior percentual de gessados nesta variedade em algumas lavouras, mas o que está em jogo aqui é uma expectativa de uma grande expansão de área plantada com essa semente na safra 2016/17, e um conjunto de fatores que fazem prever – embora seja muito cedo – uma safra cheia. Há os casos pontuais referentes aos defeitos, e isso é inegável, mas há também um recado, um posicionamento claro e prévio da indústria, de que está acreditando numa oferta abundante desta variedade e projeta – também por isso – uma queda de preços neste segmento de mercado.

Em ano de quebra mais significativa como o passado a indústria compra o arroz que tiver disponível, sem maiores exigências.

Há um padrão de qualidade, mas quando se precisa de matéria-prima há certa flexibilidade. Em Santa Catarina, que produz 1,1 milhão de toneladas para processar 1,6 milhões, por exemplo, a exigência é muito menor, seja desta variedade, do grau de umidade, de vermelho, etc… do que nos polos de processamento do Rio Grande do Sul. Isso porque os catarinenses demandam mais do que produzem. Nós, gaúchos, sabemos que vamos ter excedentes e isso cria uma conjuntura diferente. Algumas empresas podem se dar ao luxo de escolher o que comprar em alguns momentos do ano, seja por estratégia de comercialização, por linhas de produtos que oferecem, pelo excesso de oferta ou simplesmente para buscar rentabilidade.

O mesmo vem acontecendo com as indústrias de fora do RS. Sabemos que esse movimento de indústrias goianas e paulistas no Litoral Norte, em busca de variedades nobres, se dá porque compraram bastante do Paraguai, onde a própria Irga 424 RI tem boa presença, e agora precisam de grãos nobres para suas linhas tipo premium. O problema é que as variedades nobres estão com um custo de produção mais alto – pela demanda maior por fungicidas, por exemplo – e perto do seu limite de produtividade.

Algumas indústrias estão usando – em menor escala – outras variedades do Irga, como a 426 e a 428, na linha nobre, compondo um mix com a BR Irga 409 e a IRGA 417, sem prejuízos à qualidade que chamem a atenção.

Esta situação demonstra que há uma clara demanda para que os melhoristas atuem no sentido de produzirem variedades tão qualificadas quanto essas, e tolerantes a brusone e a herbicidas e, ainda por cima, de alto desempenho agronômico, produtivo e industrial. Parece simples, mas não é. É um grande desafio que pode levar décadas para ser resolvido. E quando o for, haverá outro nível de exigência do mercado e dos agricultores. Por ora, o jeito é fazer as contas – de acordo com cada realidade – e identificar o mais próximo possível quais as variedades compensam. Há fatores internos e externos que podem modificar o cenário até a colheita, mas pelo menos neste caso, a indústria já está colocando as cartas na mesa.

5 Comentários

  • A notícia tem de ser melhor detalhada, os produtores de 424 RI não poderão serem penalizados, o que entende-se é que as variedades como GURI, PAMPA, PUÍTA, 409 e 417 poderão ser comercializadas com bônus, pois o seu custo de produção é bem mais alto, com várias aplicações de fungicida e de potencial produtivo já esgotados (por degeneração).
    Os industriais que por ventura pensarem em assumir esta postura com certeza darão um tiro no pé, pois se trata de retrocesso em termos de comercialização.
    Com a palavra a ABIARROZ.

  • Ora o arrozeiro tem mesmo é de fazer cálculo, se uma variedade produz até próximo de 25% ou mais que as variedades nobres, se ele consegue vender a variedade que mais produz, tem mesmo que é que produzir o 424. Lógicamente se a industria quer o 417 ou 409 que pague o diferencial duns 25% pelos arroz nobres. Quem quer filé tem de pagar preço de filé, não adianta querer filé a preço de costela. Certas empresas apertam no recebimento e os descontos são muitas vezes leoninos. Certa vez fui vender um arroz a uma empresa, o mesmo arroz que vendia limpo e seco para fora do estado quiseram descontar perto de 10%, ora se para fora do estado se consegue vender temos mesmo é que plantar, mesmo com certa dificuldade vale a pena. As exigências aqui são maiores, descontos maiores e não querem pagar o que o produto vale. Cada um sabe onde o seu sapato aperta então deve saber o que fazer, mas faça cálculo, se não querer pagar, digamos por suposição 25% a mais para um arroz que produz menos tem mesmo é que plantar o de maior produtividade. Veja como é, usam o argumento que o parâmetro para tabelar preço de arroz é arroz do Paraguai que é o 424, mas querem pagar 409 a preço de 424, esse é mais um argumento para desvalorizar nosso produto. Querem filé paguem preço de filé!

  • As industrias deveriam fazer uma pesquisa aos consumidores de suas marcas se eles preferem um arroz contaminado com ate 5 aplicaçoes de fungicidas e claro 5 vezes mais residuos ao chegar na panela ou um arroz que talvez não tenha tantos atributosas que pode ser produzido sem aplicação de fungicidas. Qual a reação terá a FEPAM quando se derem por conta que estamos estrapolando em residuos meio ambiente.Acho que o 424 é um novo nicho deercado que se abre com beneficios importantes aos produtores aos consumidores e ao meio ambiente. A questão do preço ,vamos discutir uma tabela de preços diferenciados para cada variedade e o produtor decide o que plantar.Chega de so o produtor arcar com tudo.Se o consumidor quer um produto nobre o preço ao produtor tambem tem de ser nobre.

  • Eu já tinha ouvido comentários a respeito de contaminação de nossos arrozes. Não sei até que ponto isso é verdade e qual o nível de contaminação, essa necessidade de produzir cada vez mais, com cada vez mais adubo e outros herbicidas e defensivos pode nos levar realmente a contaminação. Isso precisa ser levado a sério. Há poucos dias li em algum estrangeiro site que os chineses com poder aquisitivo estão comendo e fazendo questão de comprar arroz importado dos japoneses, noutra ocasião em contato com chineses, me explicaram que determinados tipos de arroz na China tem um alto valor em relação aos arrozes mais comuns, são arrozes que tem um valor bem alto em relaçao ao comum e não são arrozes especiais, são arrozes com um pouco melhor qualidade e o seu valor é muito alto. Isso poderá ocorrer aqui com o tempo na medida que o consumidor tomar conhecimento do que ocorre se realmente estiver ocorrendo. Por outro lado o consumidor também deveria ter conhecimento do que ocorre com o produtor, deveríamos criar um selo de comércio justo, empresa que explora o produtor certamente não teria esse selo, na realidade seria uma propaganda negativa para certas marcas, ainda bem que o consumidor cada vez mais está se esclarecendo a respeito do que está ocorrendo. Os cartéis sempre foram e serão muito prejudiciais a sociedade como um todo, provocam concentração de riqueza nas mãos de poucos e um empobrecimento de outros por outro lado.

  • O menor valor, ou mesmo recusa dessa variedade, se dá por um único motivo: ela é horrível na panela! É um arroz que fica empapado, queima fácil, enfim, tudo o que a dona de casa não quer. É só uma indústria usar essa variedade, que chovem reclamações de consumidores. Não é a indústria que não gosta da variedade, e sim as pessoas que o comem! Mesmo retirando todos os defeitos, como os gessados, continua sendo um arroz que cozinha muito mal.

    E porque as indústrias de Santa Catarina não penalizam tanto com o 424? Porque em SC a maioria do arroz é parboilizado, aí mesmo com a pior variedade do mundo não vai ficar empapado. Ah, e por que as indústrias daqui não parboilizam todo o arroz também? Porque nem todo mundo gosta de comer parboilizado!

    Enquanto o IRGA achar que o ciclo do arroz acaba na colheita, o problema continua. É muito fácil colocar a culpa na indústria, mas esquecer que arroz não foi feito só para ser feito para ser colhido, e sim, comido!

    A melhor variedade do mundo na lavoura, que ninguém quiser comer, de nada serve. Já passou da hora do IRGA desenvolver variedades que sejam boas de manejo, mas sem esquecer que esse arroz vai ter de ser comido por alguém no final das contas.

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