Estudo identifica no arroz selvagem propriedade considerada exclusiva do grão cultivado

 Estudo identifica no arroz selvagem propriedade considerada exclusiva do grão cultivado

Felipe Ricachenevski: estratégia não é exclusiva do arroz comercial

Estudo permitiu inferir onde a estratégia combinada surgiu durante a evolução e que ela seria uma adaptação antiga, anterior à domesticação do arroz .

Pesquisadores brasileiros descobriram que espécies de arroz selvagem têm a capacidade de absorver ferro (Fe) por meio de uma característica considerada, até então, exclusiva do arroz cultivado. O estudo, publicado na revista Scientific Reports, permitiu inferir pela primeira vez onde essa propriedade – conhecida como “estratégia combinada” – surgiu durante a evolução e que ela seria uma adaptação antiga, anterior à domesticação do arroz pelos humanos.

A estratégia combinada permite que as plantas de arroz absorvam tanto Fe2+ quanto Fe3+, utilizando, para isso, dois sistemas distintos de transporte do solo para dentro da planta. “Isso é atípico para plantas em geral: até hoje, essa estratégia era considerada exclusiva do arroz que cultivamos”, explica Felipe Ricachenevsky, um dos autores do estudo e grantee do Serrapilheira pela 1ª Chamada Pública. “No entanto, mostramos que espécies de arroz selvagem, parentes do arroz que comemos e que pertencem ao mesmo gênero botânico, também apresentam essa característica.”

O biólogo conta que a pesquisa fundamental visou, essencialmente, responder a uma pergunta básica, que o grupo levantou há alguns anos: a domesticação do arroz teria levado ao surgimento de uma característica nova? “Nossa maneira de abordar o problema foi muito simples, e ainda gostaríamos de investigar mais a fundo para entender melhor como a absorção de ferro (Fe), um nutriente importante para plantas e para nós também, evoluiu.”

As consequências dessa absorção combinada de ferro ainda são pouco conhecidas, exceto pelo fato de que permitem à planta absorver duas formas diferentes do metal, que é essencial. Supõe-se que isso possa torná-la mais “versátil”, por exemplo. Ainda não se sabe, no entanto, se a planta cresce melhor nesses ambientes se depender somente de um ou de outro sistema de absorção.

Ricachenevsky acrescenta que há poucos estudos que investigam se a estratégia combinada estaria presente em outras plantas além do arroz. “Algumas evidências indicam que o milho pode utilizar uma estratégia parecida. Nós tentamos testar isso nesse trabalho, mas não foi conclusivo. O que parece é que, se o milho utiliza a mesma estratégia, isso deve ter uma origem evolutiva independente.”

Arroz selvagem x arroz domesticado

Em geral, plantas espécies de arroz selvagem, que não foram domesticadas, não são consumidas por humanos. “A melhor comparação é que eles são um lobo em relação ao cachorro: o lobo vive na natureza, enquanto o cachorro é um animal domesticado por nós a partir do lobo para fins específicos – no caso do arroz, para alimentação”, explica Ricachenevsky.

A sociedade domesticou o arroz durante cerca de 8 mil anos, o que levou as plantas atuais a terem alta produtividade, ausência de queda dos grãos (espécies de arroz selvagem costumam perder as sementes quando prontas, o que serve para espalhá-las) e baixa estatura (para evitar que a planta caia no chão, quando está cheia de sementes prontas). As espécies de arroz selvagem são muito variáveis, mas não costumam apresentar essas características. “Algumas delas são até plantas daninhas, que crescem na lavoura de arroz e competem com a planta cultivada por recursos – em alguns lugares elas são um problema grave!”

Os pesquisadores são da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Universidade do Vale do Taquari (Univates).

A íntegra do projeto está em https://www.nature.com/articles/s41598-019-52502-0 .

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