Oferta controlada
Diversificação, clima e inteligência setorial seguraram área no RS
Maior produtor de arroz do Brasil, com cerca de 72% do volume anualmente colhido, o Rio Grande do Sul surpreendeu o mundo do arroz ao não elevar significativamente a sua área plantada e sua previsão de colheita depois de uma temporada de preços que chegaram a subir 170% (de médias de R$ 45,00 para até R$ 120,00). Ao longo da história, o rizicultor gaúcho aumentou a superfície semeada logo depois de uma temporada de preços mais altos. O problema é que todo mundo pensava assim, a oferta crescia sobre uma demanda estagnada ou em decréscimo, e isso derrubava as cotações para todo mundo. Parece que a lição serviu de alguma ajuda.
Embora só vá divulgar os dados finais de plantio da lavoura de arroz gaúcha nos primeiros dias de fevereiro e no fechamento desta edição ainda esteja colhendo informações, o Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga) deve confirmar que a área cultivada em 2020/21 – já em fase de colheita – será muito similar à superfície de 2019/20. Isso quer dizer que serão cerca de 937 mil hectares semeados. Ricardo Kroeff, diretor técnico do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), prefere indicar que a lavoura gaúcha ficará entre 930 mil e 940 mil hectares. “Detalhado, mesmo, pretendemos anunciar na abertura da colheita”.
O engenheiro agrônomo enfatiza que o fator fundamental para não confirmar-se a intenção de plantio, colhida em julho e divulgada em agosto, de 969 mil hectares, foi o dimensionamento da área plantada conforme a disponibilidade de água para a irrigação. “Da primavera de 2019 até agora tivemos um regime de chuvas mais baixo, e isso impediu a recomposição das barragens em algumas regiões. Também afetou arroios e cursos d´água menores e salinizou as águas das lagoas. Sem acesso a todo o volume de água necessário para irrigar, a lavoura ficou uns 30 mil hectares aquém da intenção de plantio”, explanou.
O anúncio de que o clima da safra teria interferência do fenômeno La Niña, que traz menores ocorrência e uniformidade de chuvas no Sul do Brasil, também gerou temor e precaução entre os produtores.
Em algumas regiões os produtores precisaram fazer mais investimentos em sistemas de irrigação, e isso aumentou o custo. Em princípio, a Campanha foi a região que ficou mais longe de confirmar a intenção de cultivo. Há também o fato de muitos produtores dimensionarem parte da água para o cultivo de soja em terras baixas com irrigação. A soja neste modelo supera 330 mil hectares, ou mais de um terço da área proporcional à orizicultura.
Roberto Ghigino, vice-presidente da Federarroz, também destaca o amadurecimento dos produtores. “O produtor sabe o trabalho e o custo que teve para chegar a temporada extraordinária como foi a passada, que aconteceu por circunstâncias muito especiais de uma tempestade perfeita em termos de consumo, exportação e alta dos preços mundiais. E também, depois de muito tempo sem renda, não tem mais capacidade de arriscar a ter prejuízos em função do clima. Então, foi cauteloso, tanto dimensionando suas áreas de acordo com o que tem de água, quanto com o tamanho do mercado consumidor”, avalia.
Por dentro da lavoura
Não foi apenas na falta de chuvas para recompor as barragens que possibilitam a irrigação das lavouras que o clima atrapalhou o desempenho em produtividade nos campos gaúchos de arroz. Uma recorrência em muitas regiões foi a maior presença de invasoras, em especial o arroz vermelho e o junquinho, impondo maior concorrência por nutrientes e maiores custos de produção para o controle. “Em algumas áreas a emergência levou mais tempo do que o esperado, o que atrasou a irrigação. O solo mais seco atrapalhou, o estande de plantas ficou mais ralo, espaçado, com nascimento de 150 a 170 plantas por metro quadrado, quando o ideal eram 230, 250. A lavoura demorou pra fechar e as plantas daninhas surgiram com força, em especial onde demorou mais pra chegar a água e nas taipas”, observa Adriano Walter, produtor na Várzea do Castagnino, em Cachoeira do Sul (RS).
Este tipo de comportamento ressuscitou uma figura quase em extinção na orizicultura gaúcha, as equipes de aplicação de barra química. “A irrigação é um dos principais fatores de supressão das invasoras, aliada a outras medidas prévias e o tratamento posterior. Quando a irrigação atrasa ou se torna inviável no tempo adequado, o arroz daninho encontra melhores condições de competir. Isso acaba exigindo o controle com defensivos e medidas como o uso da barra, que é uma ferramenta importante nesta etapa da lavoura”, explica Rodrigo Schoenfeld. Alerta, porém, que o custo se eleva. Um dos produtores ouvidos por Planeta Arroz afirma que o custo de uma equipe triplicou entre dezembro e o final de janeiro por causa do expressivo aumento da demanda. “Quem trabalha com isso, e se valoriza uma equipe experiente, ganhou dinheiro nesta temporada”, assegurou o agricultor.
Elton Machado, produtor em Arroio Grande, na Zona Sul gaúcha, teve problemas com a irrigação e precisou adequar sua estação de captação de água. “Passamos alguns dias com a lavoura seca até resolver a situação. Esta foi uma condição recorrente em muitas lavouras da região, até que ocorreram chuvas mais abundantes em janeiro. Isso fatalmente trará impacto na produtividade e no controle de ervas daninhas, mas ainda é cedo para mensurar”, disse Machado, que também preside a Associação de Arrozeiros local.
SAL
A salinidade, a redução do volume de água dos rios que entra nas lagoas dos Patos e Mirim, e o vento do continente também geraram dificuldades para os produtores de arroz das Planícies Costeiras e da Zona Sul gaúcha. Guilherme Gadret da Silva, produtor de soja e arroz em Arroio Grande e Santa Vitória do Palmar, precisou ampliar também sua rede de captação. A Lagoa Mirim, com o vento soprando do continente para o oceano e com a baixa entrada de água dos rios, chegou a exigir avanço de 800 metros, para as redes de alguns produtores.