Arroz com feijão continuará sendo o prato nacional?
Autoria: Carlos Magri Ferreira |Analista da Embrapa Arroz e Feijão.
Nos últimos anos os alimentos passaram por transformações quanto às técnicas de produção, processamento, formas de apresentação e outras. A convergência dos gostos dos consumidores foi facilitada também pela melhoria dos sistemas de distribuição e influência de comportamento vinculadas nas mensagens dos meios de comunicação. Entre outras coisas, as modificações suscitaram um novo conceito alimentar. Nesta estratégia os produtos básicos passam a ser utilizados como componentes secundários de produtos mais elaborados. A continuar esse processo, em longo prazo a sobrevivência de alimentos básicos e tradicionais vai depender muito mais de aspectos culturais.
A questão alimentar tem uma ampla relação com a condição humana e pode ser vista sob vários ângulos. Não reflete somente a satisfação de uma necessidade fisiológica, idêntica em todos os homens, ou o prazer de saborear uma comida por puro deleite. Trata-se de uma atividade biológica cercada de aspectos e valores culturais, financeiros, símbolos, mitos, ritos, normas, proibições, saúde. A alimentação depende das estruturas sociais, da visão do mundo, de questões dietéticas e religiosas e das receitas que delas resultam. Por fim, a alimentação faz parte de um conjunto de tradições construídas lentamente no decorrer dos séculos. Contribui para modelar a diversidade cultural, portanto, é um dos itens que expressam a identidade social de cada povo.
Diante dessas premissas é inevitável fazer a seguinte pergunta: “Está realmente surgindo um modelo universal de consumo padronizado ou apenas está ocorrendo um ajuste normal no sistema alimentar?”. Nesse contexto, o que ocorrerá com o tradicional arroz com feijão no prato do brasileiro?
Esse questionamento é muito comum. Um fato que dá força a essa questão é a suposta diminuição do consumo per capita de arroz no Brasil. A falta de informações concretas sobre esse assunto causa muita polêmica. A figura 1 apresenta o resultado de um cálculo do consumo per capita de arroz no Brasil a partir de dados da Conab. Para o cálculo considerou-se a produção, balanço entre importação e exportação, consumo como semente e estoque de passagem. No resultado encontrado observa-se que o consumo per capita apresentou uma grande oscilação. No entanto, a linha de tendência indica uma estabilidade de consumo, portanto, não se confirmando o declínio que é normalmente propalado. Ressalta-se que o arroz tem sido constantemente alvo de informações na mídia com conteúdos enfatizando que o seu consumo provoca efeitos colaterais indesejáveis, como facilidade no ganho de peso e outros.
Na figura 2 observa-se o consumo per capita de alguns países. Percebe-se que existem três padrões de consumo, alto, médio e baixo, que são identificados, respectivamente, padrão asiático, subtropical e ocidental.
Fonte: Adaptados de USDA.
As estatísticas quanto ao consumo de arroz são bastante variáveis e às vezes contraditórias. Segundo o USDA, no período de 1990 a 2009 observa-se uma queda no consumo no Brasil de 51,4 quilos/habitante/ano para 45,3 quilos/habitante/ano. A redução é uma tendência também observada em países de padrão de consumo asiático, como o Japão. Ainda nesse grupo a tendência de consumo em países como a Tailândia e Vietnã, no período considerado, é positiva. No grupo de consumo subtropical a tendência no Senegal e Cuba é positiva. Nesse caso é interessante perceber que outros países da África e da América Latina que pertencem a esse padrão de consumo apresentam propensão de aumentar a demanda. O mais curioso é o aumento em consumo nos países do grupo ocidental, como Estados Unidos e Suíça, pois supostamente não teriam interesse em consumir arroz. Cabe a países com potencial de exportação como o Brasil identificar os motivos dessa mudança e aproveitar para abrir mercados. São pequenos mercados, mas nichos seletivos e com capacidade de absorverem produtos com valor agregado.
Figura 3 – Consumo per capita do arroz, polido, em 1960 e 2010.
Fonte: Adaptados de USDA.
Para responder ao título deste artigo é fundamental considerar alguns componentes que normalmente são citados na literatura como responsáveis pela determinação do consumo de alimentos: a) aspectos socioeconômicos, renda e modo de vida da sociedade; b) disponibilidade de recursos naturais, clima, localização geográfica e tecnologia disponível; c) hábitos, costumes, saúde e religião; d) aspectos culturais; e) preço; f) marketing; g) disponibilidade e confiabilidade do produto ofertado; h) estrutura organizacional de apoio à produção, políticas e legislação nacional e internacional; i) eficiência da indústria de alimentos e do sistema de comercialização.
Antes de avaliar, porém, o caso brasileiro com relação ao arroz vale a pena salientar o caso do Japão, onde em 1960 o consumo per capita era de cerca de 130 quilos/habitante/ano e atualmente está em 65 quilos/habitante/ano. A partir de 2000 o consumo estabilizou. Uma explicação é que o Japão completou seu período de ajuste: os fatores que interferem no consumo entraram em equilíbrio. Pesaram para isso fatores como hábitos, costumes, saúde, religião e aspectos culturais.
Considerando que o Brasil também possui essas características e além disso oferece recursos naturais, clima e tecnologia que permitem a produção de arroz em todo o seu território, pode-se inferir que o brasileiro continuará consumindo altas quantidades de arroz. Assim, o tradicional arroz com feijão estará garantido. No entanto, não é possível prever quando estabilizará o consumo per capita, visto que o país ainda passa por mudanças socioeconômicas, o processo migratório do campo para a cidade persiste em algumas regiões e ainda ocorrem alterações no nível de renda e no modo de vida da sociedade.
2 Comentários
presado Carlos,é bastante interessante seu artigo, porem eu tenho uma visão divergente no aspecto que fala sobre o prato popular ser o arroz e feijão. eu que sou academica de administração de empresas 7° semestre, defendo a versão de que o prato popular hoje é o arroz eo frango, basta observar nos supermercados os produtos de mais saída pela classe popular,alem do mais pela praticidade da elaboração do prato, pelo status que representa um rizoto(prato de festas), pela economia de gaz,pela aceitação geral por toda a camada social e principalmente pelo preço! coxa e sobrecoxa por apenas 1,99, é inegável ! o prato popular hoje é o arroz e o frango!
um grande abraço rosa eliza
Ótima reportagem,onde produtores e industrias, não devem ficar focados sómente no brasil e mercosul e sim no mundo, só assim vamos poder analizar o mercado e conseguentemente vender melhor