A Cadeia do Arroz, enfim, com os olhos voltados para o mercado!
Autoria: José Nei Telesca Barbosa.
A cidade de Mostardas no RS, no período de 19 a 21 de fevereiro acolheu delegações de todas as regiões produtoras para a 24ª Abertura da Colheita do Arroz. Tudo correu as mil maravilhas, da organização ao clima, da participação dos agentes (produtores, agroindustriais, técnicos, expositores) ao entusiasmo contagiante dos presentes. O ponto alto do evento foi a percepção da mudança comportamental da maioria dos agentes, ao invés de estarem com os olhos voltados para o governo, voltaram-se para o mercado.
O discurso do Presidente da Federarroz na solenidade de abertura registrou bem este novo direcionamento, manifestando poucas reivindicações aos representantes do governo: – reajuste do preço mínimo; liberação dos recursos de comercialização para que esta possa ser feita de forma escalonada; e, ações do IRGA para o setor buscar novas formas de comercialização. A visão da cadeia do arroz na direção do mercado já havia sido sinalizada pela feliz escolha das palestras técnicas, que teve no primeiro painel: – “O IRGA com Olhos no Futuro”, em que o presidente do instituto Cláudio Pereira proferiu conferência sobre as ações que estão sendo implementadas para a diversificação da lavoura de arroz com a soja e a integração lavoura pecuária para o fortalecimento da renda do produtor, ao livrar-se da monocultura do arroz. Consideramos como patriótica uma das suas falas e que já vem manifestando há algum tempo, repetindo-a na sua exposição, no sentido da “utilização do arroz como ingrediente de outros produtos”, aos moldes do que já é feito com o leite, o ovo etc, que já são consumidos em grande quantidade em outras formas processadas.
Também discorreu o Presidente do IRGA sobre as ações do Instituto na contratação por concurso público de um efetivo técnico para a Autarquia e as ações que estão sendo feitas para a exportação do arroz na parc eria com a Agência Apex-Brasil. Noutro painel, sobre a Competitividade da Produção de Arroz do RS, os apresentadores discorreram sobre a situação da cultura referente a oferta e demanda no Brasil e no mundo, ambas muito bem embasadas, tendo um deles avançado em relação a perspectiva de novos produtos à base de arroz, mas permaneceu um tanto pessimista quanto a infraestrutura e logística, numa análise pouco propositiva. No último painel do dia 19 sobre a Produção de Etanol de Arroz, sob a coordenação do Dr. Ariano Magalhães Junior da Embrapa/CPACT, este discorreu sobre a variedade de arroz Gigante apropriada para a produção de etanol e que deverá ser lançada na Expointer. Apresentou a seguir o Presidente da USI, Engº Agrº Flávio Malmann, que discorreu sobre o projeto da USI-Usinas Sociais Inteligentes que irá fomentar o plantio do arroz gigante para a produção de etanol, em parte da propriedade, fornecendo ao produtor o óleo diesel e os fertilizantes, num módulo com a área total de 1.500 hectares e que terá o primeiro projeto implantado ainda este ano no município de São Gabriel, juntamente com a usina que terá a capacidade de produção de 10.000 litros de álcool por dia. Haverá a participação da empresa CHS, que ficará encarregada da logística e comercialização do etanol produzido.
O outro integrante do painel, Engenheiro Vilson Neumann Machado apresentou a seguir o seu projeto de bio rrefinarias com o uso múltiplo de cereais inclusive o arroz, triticale e a batata doce, cujo projeto será lançado em breve pelo Governo do Estado do RS, agora contando com o estudo de viabilidade a ser elaborado pela empresa Katzen International Inc . No primeiro painel do dia 20, a palestra “Como transformar o Arroz em Caviar” apresentada pelo especialista em Marketing José Luiz Tejon Megido, a programação técnica e comercial teve o seu ápice. O palestrante enfatizou a necessidade de o arroz empregar as ferramentas do marketing na sua comercialização, seja na venda do produto beneficiado ou na diversificação de produtos, empregando o conceito não mais de indústria de alimentos, mas agora de indústria de nutrição.
Produtos saudáveis com origem controlada para um consumidor cada vez mais exigente. Um dos debatedores do Painel, o Presidente do Sindicato da Indústria do Arroz concordou com as afirmações do palestrante, mas sugeriu que os recursos para a implementação de um programa de marketing saísse da taxa CDO que é destinada ao IRGA. O palestrante retomou o tema de forma incisiva, sugerindo aspectos pontuais a serem trabalhados, apontando formas concretas de realização e conclamando o setor em buscar alternativas de nov as formas de inserção no mercado.
O outro debatedor e Presidente da Associação Braford e Hereford mostrou a forma de organização do seu grupo e os avanços que vem conquistando na comercialização da carne com selo de qualidade no mercado nacional e internacional. Também mostrou a fotografia de uma gôndola de arroz em um supermercado na cidade de Panamá, em que um pacote de arroz americano obtém um preço três vezes superior ao de uma marca brasileira, questionando o palestrante sobre o porque disso acontecer. No último painel “Como o arrozeiro gaúcho poderá ser um exportador” com o pioneiro na exportação de soja para a China, este afirmou a sua convicção de que a soja terá demanda crescente e o arroz também seguirá a mesma trajetória, diante da perspectiva do mundo por alimentos e o esgotamento das fronteiras agrícolas com aptidão para dar resposta a esta necessidade.
Sua fala limitou-se a exportação na forma de commodity, não adentrando na possibilidade enfatizada no painel anterior sobre a transformação do produto. Como já acompanhamos os problemas da socioeconomia da lavoura de arroz há 27 anos e com mais de vinte artigos publicados, entendemos ter havido um avanço significativo na postura do setor a partir deste evento realizado em Mostardas. No período mencionado, apontamos como os principais problemas da lavoura de arroz, a monocultura, o arrendamento, a alta imobilização de capital no negócio produtivo e a comercialização.
O efeito da quebra da monocultura já vem mostrando seus resultados nos preços de comercialização do arroz, assim como a compreensão pelo setor da necessidade de transformar o arroz em outros produtos com maior valor agregado e com a utilização das ferramentas do marketing trará maior renda aos agentes e as suas comunidades. O aspecto da gestão financeira da propriedade ainda não foi incluído nos dias de campo, embora conste da ata da Comissão Setorial do Arroz, tendo no custo do arrendamento da terra e da água o principal item a ser abordado. A oferta do arroz beneficiado em bolsa de mercadoria, também é outro item que ainda não vem sendo tratado pelo setor e que poderá abrir novas frentes de comercialização ao produtor e a novos entrantes.
O marco mais importante desta 24ª Abertura da Colheita do Arroz que devemos comemorar e apoiar é a mudança de postura dos novos líderes, que com atitude e coragem trazem nova perspectiva a um setor que pode trazer maior progresso a uma extensa região do RS com alto potencial de produção. Parabéns a todos!