A safra 2010 no RN é irrecuperável

 A safra 2010 no RN é irrecuperável

Luís Gonzaga Araújo é analista de mercado de produtos agrícolas da Conab RN

Tanto o arroz e o feijão consumido pela maioria da população norte-riograndense vem de fora. A maior parte do arroz produzido no RN é da variedade “vermelho” – da terra, cujo consumo é regional. Enquanto que o arroz longo fino (que vem de fora) é o mais consumido no estado.

Pelo terceiro ano consecutivo, o Rio Grande do Norte colhe os frutos da imprevisibilidade do clima. Dois anos de chuvas em excesso levaram por água abaixo boa parte da produção de grãos potiguar. Agora, a escassez e, em alguns casos, intermitência de precipitações provocou em 2010 novas perdas. O resultado foi uma péssima colocação no ranking da safra nordestina: o Estado ficou com 2º lugar na queda da produção, quadro que não poderá ser mudado nos próximos meses tendo em vista que o período de plantio já passou.

Os prejuízos, se não chegam ao consumidor final e não devem afetar tantos os preços, são reais para quem plantou e acreditou em um resultado melhor. Porém, o fortalecimento do agricultor com mais técnica e infraestrutura poderia, se não pudesse impedir, ao menos teria reduzido o quadro negativo no RN. É o que avalia o analista da Conab RN, Luís Gonzaga de Araújo, lembrando que é necessária mais assistência ao produtor e garantia do preço em casos como o da cultura de girassol. Araújo destaca ainda que o estado precisa ampliar sua produção de alimentos e tentar organizar as culturas de base existentes hoje, para investir com mais força em novas lavouras.

Qual a situação hoje da safra brasileira de acordo com o levantamento mais recente da Conab?

A situação é favorável. A produção nacional de grãos da safra 2009/2010 está estimada em 147,09 milhões de toneladas, ou seja, é 8,8% superior à obtida na safra anterior. Isso foi possível em função das boas condições climáticas verificadas nas principais regiões produtoras.

E em relação ao Nordeste, qual foi o resultado?

Para o nordeste temos duas situações. A primeira é que a produção total atingiu 12 milhões de toneladas, representando acréscimo de 2,9% em relação à safra passada. Esse crescimento só foi possível graças às culturas plantadas nas região de cerrado, sobretudo a soja e milho, com destaque para a região oeste da Bahia, e o sul do Maranhão e Piauí. Entretanto, nas demais áreas do Nordeste, principalmente no semiárido tiveram perdas significativas devido à estiagem. Os dados constantes do levantamento apontam que a Paraíba foi o primeiro lugar com 95% de perdas na produção, o que representa 12,9 mil toneladas. Em seguida, está o Rio Grande do Norte com 29,2 mil toneladas perdidas, ou 69,4% da produção. O terceiro lugar ficou com o Ceará que perdeu 58,8% do que foi produzido, um volume de 347,6 mil toneladas. O ranking segue com Pernambuco que perdeu 323,2 mil toneladas (17,2% de sua produção); Piauí (1,3 milhão de toneladas) ou 13,2%; e Alagoas que perdeu 6,5% do produzido, correspondente a 94,9 mil toneladas. Por outro lado, Bahia teve crescimento de 17,3%, Maranhão, 14,8% e Sergipe 20,4%.

Dentro desse contexto climático da região, o RN foi afetado também e teve um resultado bastante negativo, então?

Sim, o Rio Grande do Norte, pela terceira safra consecutiva, vem passando por perdas significativas. Nas duas safras anteriores as perdas foram por excesso de chuvas. Em 2010, as perdas foram em função do retardamento das chuvas para o plantio da safra, escassez e estiagens prolongadas, ou seja, condições climáticas totalmente desfavorável.

O Rio Grande do Norte teve a segunda maior perda do Nordeste. Existe alguma explicação para que o nosso resultado seja pior que os demais Estados?

Dentre os estados nordestinos, o RN é quem tem a menor área cultivada com arroz, algodão, feijão, milho e sorgo. Por isso, o nosso volume de produção é menor. Além disso, as condições climáticas adversas no nosso estado foram muito intensas.

Quais os produtos que tiveram maior perda?

Entre os produtos cultivados nesta safra de 2010, a menor área plantada foi com girassol, correspondente a 19 hectares plantados, contra 1.607 hectares plantados em 2009, consequentemente iremos obter a menor produção. A perda com girassol será superior a 90% em relação à safra passada. As demais culturas tiveram as seguintes perdas: sorgo: 81,4%; milho: 79%; feijão macaçar: 65,2%; algodão: 66% e o arroz 9,6%.

É possível dizer quais as regiões mais afetadas?

Todas as regiões do estado sofrem perdas. Pode-se destacar que as mais atingidas foram as regiões Oeste e Seridó. Lembrando que a Região Oeste do estado conta com a maior área cultiva.

Entre as quedas, o senhor cita o girassol que, embora seja uma cultura ainda pequena, apresentou o maior prejuízo. Que efeitos negativos isso traz para o programa de biodiesel no Estado?

A produção de girassol desta safra será muito reduzida e insignificante no contexto do volume pela demanda estabelecida pelo projeto. Afora essa situação climática, há necessidade de organizar e capacitar o produtor de girassol, dando-lhe assistência técnica e garantia de preço na comercialização. Com o emprego de tecnologia em todo o processo – que vai desde do plantio até a colheita, é possível se obter produção mais expressiva.

A falta de um zoneamento adequado para essa cultura do girassol pode ser uma explicação para esse prejuízo?

O zoneamento também é de fundamental importância, aliadas às situações anteriormente mencionadas.

Falando das outras culturas, produtos como o sorgo – que é utilizado na ração avícola – e o milho – bastante utilizado em bovino e suinocultura – também foram afetados. Isso trará algum problema para os criadores do Estado?

A produção interna desses produtos não atendem à demanda de consumo. Anualmente, os criadores, produtores, pecuaristas) são obrigados a adquirir esses importantes insumos em outros centros produtores. A produção nacional de milho vai atingir 54.376,7 mil toneladas, representando 6,6% de acréscimo em relação à safra anterior. Os dados da Conab apontam que dentro do quadro da balança de oferta e demanda, o país irá contar com um estoque excedente (de passagem para o ano de 2011) de 11.960,7 mil toneladas. Então, bastante favorável para atender a demanda interna (nacional), com lançamento pelo Governo Federal de Leilões voltados ao escoamento da produção.

E com relação ao feijão e arroz que são produtos de consumo doméstico, vamos perceber o aumento dos preços na hora de fazer as compras?

Tanto o arroz e o feijão consumido pela maioria da população norte-riograndense vem de fora. A maior parte do arroz produzido no RN é da variedade “vermelho” – da terra, cujo consumo é regional. Enquanto que o arroz longo fino (que vem de fora) é o mais consumido no estado. O feijão produzido no RN é o da variedade macaçar. Também consumido com mais intensidade na zona rural. Nas principais cidades do estado o consumo maior é pelo feijão cores. Nesse contexto, a produção do RN tem pouco impacto na demanda pelo setor consumidor.

Visto que passamos o principal período de plantio na região, podemos dizer que as perdas para este ano são irrecuperáveis?

Sim. Agora é esperar para a próxima safra e contar com favoráveis situações climáticas. A exceção fica por conta do arroz produzido na região de Apodi que conta com cultivo semirrigado. Os produtos cultivados pelo processo de irrigação não irão sofrer perdas.

Os fatores climáticos são incontroláveis ao homem. Mas na opinião do senhor, a maior utilização de técnicas de plantio, além de uma infraestrutura irrigada melhor poderiam ter minimizado o resultado ruim da safra potiguar?

Sim. Entendo que o plantio das culturas nas regiões semiáridas estão sujeitas a perdas expressivas. Mesmo assim, entendo que o produtor continue desenvolvendo a cultura de sequeiro na sua propriedade. Para tanto, ele precisa receber mais atenção em todas as fases da sua atividade. Esse produtor vem utilizando suas terras com plantio há anos e até séculos, trata-se de um comportamento cultural. Ele precisa produzir alimentos para subsistência e quando a situação permitir, ele deve produzir excedente além porteira. Assim, ações concretas precisam ser direcionadas a esse segmento visando a sua manutenção na propriedade rural. É fato que precisamos produzir mais alimentos, já que a nossa atual produção não atende ao consumo. Para tanto é necessário: mais tecnologia desde do plantio. Executar um projeto voltado a incentivar a perfuração de poços nas áreas irrigáveis, vazantes; deve-se ampliar e reformar açudes; incentivar a organização dos produtores, qualificar as propriedades rurais visando diversificar seus produtos, fortalecer a produção de alimentos e de forragens, ensilagem, fenação. É essencial a capacitação do produtor rural.

Depois de anos consecutivos de perdas, o Estado ainda tem condições de pensar em pesquisa sobre novas culturas? Ou ainda é preciso fortalecer o que temos para investir em ampliação da nossa produção de grãos?

Precisamos aumentar a produção de alimentos. Atualmente os mecanismos de comercialização dos produtos agrícolas são favoráveis. A agricultura Familiar nunca contou com programas tão eficazes como os que estão ai. Existe demanda favorável para a comercialização de alimentos. Então, o espaço para o aumento da produção é evidente. Quanto às pesquisas essas devem se manter em processo evolutivo. É de fundamental importância a pesquisa para a produção de alimentos mais saudáveis. A adição de novos produtos, passa necessária por essa área. Veja o exemplo da atuação da Embrapa na região de Cerrado, quando até no final dos anos 60 só existiam vegetação (“cerrado”) nos estados do Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Hoje, esses estados são os maiores produtores de algodão, soja e milho do País. Por isso, acredito que a região semiárida nordestina, diante do seu potencial para a produção de alimentos, com o apoio da pesquisa, passe a ser importante centro de produção.

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