Arábia Saudita testa sua ‘agricultura à distância’

Árabes estudam produzir arroz nas Filipinas.

Financial Times – À medida que o trator se movia ruidosamente numa trilha uniforme em meio a fileiras de vegetais, deixando nuvens de poeira no seu rastro, os peões se curvavam para colher gordos alhos brancos e os acondicionavam em sacas. Cenas semelhantes se repetiam nas lavouras de batatas e uvas em outras partes desse canto de 36 mil hectares do noroeste da Arábia Saudita que está sendo cultivado pela Tabuk Agricultural Development Company. Dois meses antes, trigo e alfafa estavam sendo colhidos.

É a agricultura à moda saudita, carente de rios e lagos. Por 25 anos, a Tadco, uma das maiores empresas agrícolas do país, tem atuado no noroeste do reino, onde o clima é menos severo que em outras partes desérticas do país e onde o solo é enriquecido pelas colinas e montanhas vulcânicas que circundam as planícies. A água não vem da chuva – que praticamente inexiste -, mas é bombeada a partir de aquíferos e canalizada para irrigação. Mas a Tadco está precisando se ajustar. Visando proteger seus finitos recursos hídricos, o reino anunciou em 2008 que eliminará gradualmente a produção nacional de trigo até 2016, sendo que os agricultores deverão reduzir sua produção em 12,5% anualmente em relação às 2,5 milhões de toneladas produzidas em 2008.

Depois que essa decisão foi tomada, a crise alimentar mundial atingiu seu auge, levando à disparada da inflação no reino e desencadeando temores sobre segurança alimentar, à medida que os países produtores implantavam restrições às exportações, inclusive os que cultivavam o arroz basmati, preferido dos sauditas. O resultado foi a concepção da “iniciativa do rei Abdullah”, com a qual o governo espera garantir fontes de trigo, arroz, soja, milho e alfafa por meio de investimentos no exterior. O plano é que o setor privado assuma a iniciativa com apoio do governo, que já criou para isso uma companhia de US$ 800 milhões.

Os dois temas afetam a Tadco. Ela produz 40 mil toneladas de trigo no país e já começou a se lançar em empreendimentos no estrangeiro em busca de terra. A Tadco é a principal investidora na Jannat, companhia limitada que reúne sete empresas sauditas. Segundo Mohammed Abdulla al-Rajhi, presidente do conselho de administração da Jannat e vice-presidente do conselho da Tadco, a meta é obter entre 100 mil e 250 mil hectares de terra no exterior, incluindo US$ 100 milhões em investimentos na África. Projetos no Egito e no Sudão já estão em andamento.

A Jannat também mantém conversas com autoridades etíopes e avalia projetos de cultivo de banana e arroz nas Filipinas, diz Rajhi. Os planos da Arábia Saudita, bem como de outros países do Golfo, ficaram envoltos em controvérsia, particularmente devido ao conceito de países ricos em petróleo usarem seus petrodólares para cultivar lavouras em países pobres assolados por escassez de alimentos e enviarem os produtos agrícolas a seus países natais. Rajhi diz que a política da Jannat será assegurar “benefícios mútuos e parcerias justas com os países anfitriões e com os parceiros locais”.

Na propriedade saudita da Tadco, distante cerca de 60 quilômetros de Tabuk, começaram os preparativos para a nova era. Além de produzir 20 mil toneladas de batata e de alho anualmente, o estabelecimento produz pêssegos, pêras, ameixas e damascos. A ideia é que a companhia proteja seu fluxo de receita cultivando lavouras de alto valor, com mais mão-de-obra, melhores retornos e em áreas menores. Saad al-Swatt, principal executivo da Tadco, diz que existe um futuro para a agricultura na Arábia Saudita, mas admite que o setor terá de se adaptar. “Ainda sentimos que podemos continuar. Não com toda essa capacidade agrícola atual, mas uma boa parte dela poderá ser mantida com uso melhor e mais eficiente de água”, ele diz.

“Dois por cento da nossa terra é usada só para agricultura, e o problema não está nesses 2%, mas na concentração desses 2%”. (Tradução de Robert Bánvölgyi)

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