Arroz acompanha a curva ascendente das commodities

O boom do mercado global de commodities, que aumentou os preços de mercadorias tão diversas quanto a gasolina e o ouro, está agora elevando o preço do arroz – alimento básico em metade dos países do mundo – a seu nível mais alto em quase 20 anos.

A alta do arroz tem conseqüências complexas para a economia mundial. O cereal enfrenta o problema de safras ruins e oferta reduzida em alguns dos maiores países exportadores e consumidores, enquanto a demanda aumenta em países como Índia e Filipinas.

O aumento do preço é uma bênção para alguns produtores e investidores. Mas, ao mesmo tempo, deve contribuir para um período prolongado de inflação de alimentos, que pode ampliar a distância entre ricos e pobres no mundo.

– No final das contas, a disputa será entre o mundo industrializado e o mundo em desenvolvimento -, diz Michael Lewis, diretor-gerente do Deutsche Bank.

Uma preocupação humanitária em particular é que os consumidores mais pobres, muitos dos quais dependem do arroz, têm pouca ou nenhuma voz.

– Quando há escassez de alimentos, eles passam fome em silêncio -, diz Joachim Von Braun, diretor-geral do Instituto Internacional de Pesquisa de Política Alimentar.

A alta está atraindo investidores para esse mercado. Na Bolsa de Chicago (CBOT), o número de apostas em contratos de arroz acaba de alcançar um recorde – sinal de que mais traders esperam ganhar dinheiro com o aumento dos preços.

Investidores que tradicionalmente não lidavam com arroz, como fundos de hedge, estão começando a aplicar no cereal, segundo Fred Seamon, diretor-adjunto de análise de commodities da CBOT. Novos produtos de investimento negociáveis em bolsa, dirigidos a investidores individuais, também estão sendo lançados. Há dois meses, Jim Rogers, do Índice Internacional de Commodities Rogers, lançou a Nota Agrícola Rogers Negociável em Bolsa.

Enquanto os preços de outras commodities, como o petróleo, flertam há alguns meses com seus recordes históricos em valores corrigidos pela inflação em dólar, as commodities agrícolas têm espaço para subir antes de chegar a esse ponto.

À medida que o arroz sobe, a ajuda humanitária alimentar a países em desenvolvimento escasseia. E o preço internacional da quirera de arroz, um tipo barato popular em países africanos, subiu 40% desde 2006, segundo a FAO. Em Chicago, os contratos de arroz fecharam a semana passada a US$ 13,33 por 100 libras, ou 45 quilos, ante US$ 9,87 há um ano. Embora os preços não estejam perto dos recordes em termos reais, ameaçam exacerbar a pobreza em grandes áreas do mundo.

Um risco é que, em alguns casos, o preço em alta cause escassez de alimentos e conflitos sociais. De fato, uma rebelião ocorrida no Senegal em novembro foi, em parte, atribuída à alta do arroz, básico naquele país. Os rebelados, que atiraram pedras e incendiaram pneus, foram confrontados pela polícia, que atirou bombas de gás lacrimogêneo.

A história do arroz repete a de quase todas as commodities, seja petróleo, cobre ou trigo. Os preços de muitas commodities estão subindo graças à expansão da demanda de economias em Desenvolvimento, como a China. Isso causa um efeito dominó: o preço do aço encarece o custo da construção; a alta do petróleo ajuda a empurrar para cima as tarifas do transporte marítimo de cargas. A alta do petróleo também encarece o plantio e transporte do arroz e outros cereais – o que, por sua vez, empurra os alimentos.

As commodities agrícolas, é claro, tendem a ter um impacto humano mais direto do que petróleo ou aço. Os cereais estão sendo negociados em seus recordes históricos, ou perto deles, em parte por causa de uma mistura do aumento da demanda para fazer biocombustíveis (como o álcool feito a partir de cereais) com o aumento da população mundial.

Além disso, o dólar fraco ajudou na alta internacional do arroz, já que a maior parte dele é comercializada em dólar. Na Tailândia, maior exportador do mundo, o preço do arroz de grão longo subiu quase 20% desde 1996, segundo Nathan Childs, economista-sênior do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA).

Tudo isso reduziu os estoques globais de cereais para um nível que não é visto há décadas. O estoque de trigo está no seu nível mais baixo em 60 anos. O estoque de arroz está em seu menor nível em 24 anos. Complica, ainda, o fato de que, historicamente, o arroz é um cereal pouco comercializado no mercado internacional. Apenas cerca de 7% da produção global de arroz é exportada ou importada, segundo Childs. Isso significa que, no caso de choque de oferta, quem quiser importar arroz terá de girar o mundo, o que eleva o preço ainda mais. Em comparação, cerca de 16% dos outros cereais, como trigo e milho, são negociados no mercado internacional.

A alta do custo dos alimentos tende a atingir as pessoas nos países pobres com mais força do que nos desenvolvidos, porque os países em desenvolvimento gastam fatia maior da renda domiciliar com produtos alimentícios. Nos EUA, a alimentação representa cerca de 18% da cesta de produtos usada para o cálculo da inflação, ante até 40% em algumas economias emergentes, conforme relatório do Deutsche Bank.

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