Assentados discutem produção de arroz ecológico em Tapes (RS)

Produtores apresentaram e debateram a tecnologia de produção de arroz ecológico em assentamentos.

Agricultores assentados da região metropolitana de Porto Alegre reuniram-se esta semana no assentamento Lagoa do Junco, em Tapes (RS), para discutir a produção de arroz ecológico. O 3º Seminário Regional sobre Arroz Orgânico envolveu a participação de aproximadamente 50 agricultores. O evento foi organizado pelos próprios assentados, com apoio da Cooperativa de Prestação de Serviços Técnicos Ltda (Coptec), entidade conveniada ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra); e Cooperativa Central dos Assentamentos do Rio Grande do Sul (Coceargs).

Foram debatidos aspectos da produção (manejo, produtividade, questões ambientais), comercialização (preços, mercados, certificação, marketing) e da organização dos assentados da reforma agrária que desenvolvem a orizicultura sem agrotóxicos no estado. O presidente da Coptec, Álvaro Delatorre, explicou que o objetivo do encontro foi construir uma unidade no grupo, identificando as dificuldades – do ponto de vista da produção e comercialização – e estabelecer uma alternativa concreta de produção com base nos princípios da agroecologia. Segundo ele, o início das experiências com arroz ecológico em assentamentos gaúchos data de 1997.

Desde então, a cada ano o número de famílias envolvidas com a atividade vem aumentando, o que motivou a constituição do chamado grupo do arroz ecológico e a realização desses seminários. “Com a ampliação do grupo, surgiu a necessidade de organização, visando a superação e o intercâmbio de experiências das atividades relacionadas à produção e às demais dimensões da cadeia produtiva: secagem, armazenagem, beneficiamento e comercialização”, destacou.

Hoje, existem cerca de 100 famílias de assentados diretamente envolvidas na produção do arroz ecológico, com uma produção de 45 mil sacos de arroz. “Atingimos a meta estipulada em 2003, no primeiro seminário”, enfatizou Delatorre, ressaltando que os agricultores, a assistência técnica e as cooperativas de assentados fizeram esforços importantes para cumprir os objetivos.

Outra evolução apontada diz respeito à qualificação e ampliação do debate sobre o tema. “No ano passado, não fizemos uma discussão sobre o objetivo estratégico da produção. Este ano, todos estão animados e motivados no sentido de construir um modelo de produção com base nos princípios da agroecologia”, afirma.

Ele explicou também as dimensões da opção agroecológica feita por esse grupo de assentados. “Queremos mostrar que isso tem uma dimensão ética, pois estamos produzindo um alimento sadio, social (porque não abrimos mão de ter o controle desse processo, inclusive da comercialização), e econômico, na medida em que o arroz ecológico se mostra uma alternativa concreta a esse modelo extremamente dependente dos agrotóxicos.”

Para o engenheiro agrônomo André Oliveira, a iniciativa do seminário é fundamental como ferramenta para a organização dos produtores. Segundo ele, há carência dos agricultores quanto a conhecimentos relativos à área de produção. “Falta amadurecimento do produtor no sentido de ser capaz de fazer uma avaliação e tomar as atitudes alternativas “lendo” a natureza, agindo mais diretamente com a natureza. Esse tipo de conhecimento não vem da academia, é provocado por encontros e trocas de experiências como essa.”

A opção pela produção orgânica

Convidado a participar do encontro para relatar aos assentados sua experiência pessoal, o agricultor Juarez Antônio Pereira empolgou a platéia do seminário com um depoimento emocionado. Nos cinco hectares que cultiva em Mariana Pimentel, o agricultor desenvolve 22 variedades de arroz orgânico, em um processo absolutamente autônomo, que vai desde a preparação das sementes, passando pelo plantio, colheita manual, secagem ao sol e comercialização do produto, feita diretamente ao consumidor nas feiras da cooperativa ecológica Coolméia, em Porto Alegre.

Durante 15 anos, Pereira se dedicou à agricultura convencional, até perceber que a lógica da produção de alimentos com o uso de agrotóxicos vai contra a lógica da preservação da vida e do meio ambiente. “Um dia, depois de voltar da lavoura irreconhecível atrás de máscara, macacão, botas e máquina, me dei conta que, como estava fazendo, eu precisava de uma operação de guerra para produzir alimentos. Tudo errado. Então, decretei o fim da utilização de agrotóxicos”, descreve.

Com determinação incomum e uma paixão cada vez maior pela produção orgânica e pelos valores que ela representa, o agricultor superou as dificuldades iniciais e, hoje, é conhecido, respeitado e requisitado para divulgar sua experiência, de forma a motivar outros produtores. “No início eu era taxado de louco pelos meus amigos. Depois, fui ignorado. Agora, desconfio que estou sendo `espiado'”, diverte-se.

Sem preocupação em aumentar a produção, mas sim melhorar a qualidade dos grãos e sementes que produz, Pereira destaca, entre as vantagens obtidas com a mudança para a produção de base ecológica, sua recuperação física e financeira, esta última conquistada com o fim das dívidas e da necessidade de recorrer a financiamentos.

– Sem precisar ir aos bancos em busca de financiamentos, me livrei da humilhação imposta pelo sistema bancário e passei a ter mais tempo para trabalhar na terra. A partir dali, deixei de ser apenas uma peça do processo e passei a ser um agricultor.

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