Cheias de arroz, luvas simulam sensação do útero e ajudam a acalmar bebês prematuros
(Por G1) Luvas hospitalares preenchidas com arroz viraram aliadas no cuidado de bebês prematuros no Hospital das Clínicas, vinculado à Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), na Zona Oeste do Recife. A técnica simula a sensação de quando eles estavam no útero e auxiliam as mães e as equipes de saúde para acalmar os recém-nascidos.
A técnica das “luvas proprioceptivas” foi desenvolvida na unidade neonatal do hospital pela terapeuta ocupacional Débora Danielle Santos, mas passou a ser reproduzida por diversas equipes do hospital. Ela disse que uma das primeiras “cobaias” foi o próprio filho, João Gabriel, hoje com três anos e meio.
Débora começou a trabalhar no HC em 2016. A ideia de utilizar uma uma luva para fazer uma leve pressão em cima dos bebês surgiu em 2017. Segundo ela, nas UTIs neonatais, as equipes costumam utilizar diversos artifícios para estimular os bebês a se desenvolverem.
“No útero, conforme o bebê cresce, ele fica acolhidinho, apertadinho. Se ele tenta esticar o braço, bate no saco gestacional, por exemplo. Quando ele nasce, digamos, antes do tempo, antes de 37 semanas, ele perde esse tempo que é necessário para que ele desenvolva seus sistemas sensoriais, suas funcionalidades”, explicou a terapeuta ocupacional.
Para ajudar os bebês a se acalmar, uma das técnicas utilizadas pelas equipes é chamada de toque positivo, em que os profissionais pressionam levemente o corpo dos recém-nascidos, para que eles tenham uma sensação de acolhimento semelhante à do útero. Além disso, uma espécie de ninho feito de pano é colocada ao redor das crianças.
“A gente junta as mãos e os pés do bebê e pressiona, para que ele sinta, com o aperto, uma sensação do acolhimento intraútero. Parece um milagre, porque o bebê rapidamente volta a uma postura tranquila, sem chorar, regulado. Mas eu me incomodava, porque não podia ficar o tempo todo segurando um bebê. A ideia veio daí”, disse.
As luvas são utilizadas somente nos bebês com maior irritabilidade, que choram mais frequentemente, e são feitas de acordo com as características de cada um. Em casos de bebês muito sonolentos, por exemplo, o tipo de estimulação precisa ser outro.
Uma das bebês auxiliadas foi Camilly, que nasceu na quinta-feira (9). A mãe, a estudante Roseane Cruz, saiu de Sirinhaém, na Zona da Mata de Pernambuco, porque estava com a pressão arterial alta, o que podia causar problemas tanto a ela quando à bebê.
“Ela é muito agitada, estava chorando muito. Eu achei muito bom, porque na hora que faziam a técnica da luva, ela parava de chorar. Nasceu com 1,6 quilo, bem pequena, com 32 semanas. Mas deu tudo certo”, afirmou a mãe. As duas receberam alta hospitalar nesta sexta-feira (10).
Dependendo do peso, tamanho e idade gestacional, mais ou menos arroz é colocado, para que o material fique maior ou menor, e mais ou menos pesado.
Débora Danielle afirmou que a ferramenta tem sido utilizada cada vez mais, já que as mães não conseguem ficar 24 hora por dia com os filhos e as equipes precisam dar assistência a vários recém-nascidos ao mesmo tempo.
“Primeiro, a gente precisa entender quem é aquele bebê, a funcionalidade dele, a integração dos sistemas sensoriais. Nos casos em que a criança se acalma com o toque, mas assim que eu tiro a mão ele volta a chorar, a luva é bastante útil. Assim, eu posso assistir outro bebê”, declarou.
A terapeuta ocupacional afirmou, também, que durante a pandemia de Covid-19, algumas mães precisam ficar mais ausentes do cuidado com os filhos recém-nascidos. Isso faz com que as luvas cheias de arroz sejam ainda mais importantes para os bebês.
“Muitas mães, às vezes, precisam ficar sem ver os filhos na UTI, porque estão com sintomas de Covid, por exemplo. Ou ficam internadas elas mesmas, por algum problema. Também temos mães de gêmeos, que não conseguem ficar com os dois ao mesmo tempo, ou que, em casa, precisam cuidar de outros filhos. Há, também, os casos de mães que entregam os bebês para adoção”, afirmou.
A escolha pela luva, segundo Débora, foi por uma questão de segurança, já que, para evitar infecções hospitalares, as equipes utilizam somente insumos que já estão no ambiente da UTI.
Atualmente, no HC, a enfermagem e a fisioterapia também já utilizam a técnica para auxiliar os pequenos pacientes, principalmente durante procedimentos como coleta de sangue e exames, que incomodam os bebês.
“Meu filho foi minha primeira cobaiazinha. Eu utilizei com ele todas as ferramentas que uso na UTI. A luva com arroz, por exemplo, e até mesmo o som do útero reproduzido no YouTube. Parece um chiado de televisão, mas é impressionante”, afirmou.