Consumo em queda, carga tributária e logística ameaçam a cultura do arroz
Apesar do bom momento do arroz no mercado internacional, com preços em torno de 17 dólares a saca de 50 kg, cerca de R$ 35,00, os rizicultores catarinenses enfrentam grave crise, causada pelo custo de produção e endividamento altos.
Redução de 19% no consumo per capita, logística deficiente e carga tributária elevada ameaçam a sustentabilidade da produção do arroz no Brasil. O diagnóstico é do editor do Boletim do Mercado de Arroz e diretor da Agrotendências Consultoria em Agronegócios, Tiago Sarmento Barata, que proferiu palestra para rizicultores e membros da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Arroz, que lotaram o auditório do Centro de Treinamento da Epagri, em Araranguá, na tarde desta segunda-feira (17).
Segundo o analista, o brasileiro continua comendo arroz, mas não tanto como antes. “O aumento de renda das famílias reduziu o consumo. Entraram a pizza e outras comidas prontas”, afirmou Sarmento, que recomendou a desconstrução dos mitos de que o arroz engorda ou que tem colesterol. “Pelo amor de Deus, isso tem que ser trabalhado”, declarou.
Logística & impostos
Sarmento criticou a infraestrutura portuária, “toda focada na soja”, como um entrave às exportações. Do mesmo modo a política tributária, que onera toda a cadeia produtiva, elevando os custos de produção, de beneficiamento, de transporte e de comercialização, minando a competitividade do arroz brasileiro, principalmente em relação aos parceiros do Mercosul. Ele insistiu que o setor deve incluir nas pautas de reivindicações a desoneração fiscal. “Vale a pena dar incentivo tributário para a cadeia fluir”, avaliou.
O caso de Santa Catarina
Apesar do bom momento do arroz no mercado internacional, com preços em torno de 17 dólares a saca de 50 kg, cerca de R$ 35,00, os rizicultores catarinenses enfrentam grave crise, causada pelo custo de produção e endividamento altos. Segundo Sarmento, a explicação para o fenômeno é múltipla.
Além do custo dos insumos e dos financiamentos, a falta de escala, derivada do modelo fundiário catarinense, baseado na pequena e média propriedades, bem como na geografia acidentada, que restringe o espaço ocupado pelas várzeas formadas nas beiras dos rios, seria um dos problemas.
Neste contexto, a maioria dos cerca de 12 mil produtores catarinenses não produz em escala suficiente para vender apenas parte da produção logo após a colheita, de forma a aguardar melhores preços para vender o restante, como seria o ideal, sendo obrigados a fazê-lo integralmente, para obter liquidez e quitar dívidas, principalmente junto às instituições financeiras.
Outro motivo é o acesso às exportações, também vinculado aos problemas de escala e de logística. De acordo com Sarmento, o Rio Grande do Sul responde por cerca de 97% das exportações brasileiras. Os restantes 3% estão divididos entre Santa Catarina, Mato Grosso do Sul e Maranhão.
As decisões da Câmara Setorial do Arroz
Antes da palestra do analista de mercado, os membros da Câmara Setorial da Cadeia Produtiva do Arroz, coordenada pelo deputado José Milton Scheffer (PP) e composta por nove representantes de órgãos governamentais e nove do setor produtivo, realizaram a primeira reunião ordinária no auditório do Cetrar/Epagri, em Araranguá.
Na oportunidade, os integrantes da Câmara Setorial do Arroz decidiram constituir grupos de trabalho para tratar do endividamento, armazenagem, retomada de pesquisas pela Epagri, licenciamento ambiental, seguro agrícola e preço mínimo para o produtor. De acordo com o deputado José Milton Scheffer, “a partir dos estudos dos grupos de trabalho serão encaminhados projetos e ações objetivando a sustentabilidade da cadeia produtiva e o ganho do produtor”.
Para o produtor Ludomir José Westrup, de Forquilhinha, “não adianta o preço a R$ 35 a saca se ninguém tem arroz para vender. Tem que ter preço no fim da colheita”.
Fernando Back, da Cooperativa Nova Força (Coopernova), também de Forquilhinha, afirmou que o problema é a oscilação dos preços. “Não foi criado nenhum mecanismo para estabilizar os preços. Esse é o grande desafio, garantir lucratividade para todos os setores da cadeia. Quando o preço começa cair, quem industrializa e vende tem condições de preservar a lucratividade repassando os custos para o consumidor, já os produtores não têm para quem repassar”, lamentou.
Back defendeu contratos de opção, com preços conhecidos, além da abertura de canais de exportações, “mesmo que subsidiadas”.
Osmar Volpato, da Cidasc, lembrou que nos últimos 22 anos, 15 safras tiveram resultados negativos, o que aumentou o endividamento. “Tem produtor devendo quase R$ 5 milhões e a dívida cresce todo dia. O governo precisa securitizar essas dívidas”, opinou.
Anselmo Acordi, de Turvo, reclamou que o preço mínimo é o mesmo de cinco anos atrás. “Nunca foi reajustado. Daqui dois anos vamos vender abaixo do preço mínimo de R$ 25,80”. Anselmo criticou a Epagri, que ensina a plantar, mas não a pagar a conta. “Crise igual essa eu nunca vi, nem quero ver. Vendi minhas terras e paguei a conta, quero dormir tranquilo”, relatou.
Investimento em pesquisa
Uma das principais reclamações dos produtores é a interrupção das pesquisas pela Epagri em torno do plantio do arroz. Para Maurício Mondo, da Associação Catarinense dos Produtores de Sementes de Arroz, a pesquisa e a extensão pararam. De acordo com Mondo, a associação paga, em forma de royalties pelo uso de variedades protegidas, cerca de R$ 700 mil por ano à Epagri. “Ainda não vimos esses royalties chegar com a devida transparência ao destino, que inclui a pesquisa”, ponderou.
1 Comentário
Muito acertadas suas palavras sr. Anselmo Acordi, no RS asituação é exatamente a mesma, principalmente na minha região que é de minifúncio, e a solução que se aproxima é exatamente a que o sr. tomou… e depois que apreendamos a lição : “jamais apostar apenas na cultura do arroz, (diversificar a produção) pois quando este vai mal…”