Deu “ruim”

 Deu “ruim”

Alimentação à base de arroz para bebês está sob monitoramento

Níveis de arsênio no arroz branco acende o alerta na alimentação para bebês
nos Estados Unidos e reflete no mundo
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Nem só de boas notícias é feito o mundo do arroz. A Agência de Drogas e Alimentos dos Estados Unidos (FDA) emitiu alerta quanto à presença de arsênio no cereal aos responsáveis por bebês cuja dieta tem a presença de papinhas de arroz e alimentos similares e ao uso de bolos deste cereal no lanche de crianças naquele país.

O arsênio (As) é um elemento químico da família do nitrogênio encontrado em minérios de chumbo e cobre (arsênico é o nome popular de um de seus compostos, o trióxido de arsênio, ou arsênio branco. Ambos podem ser letais dependendo da dose consumida). O bolo com farinha de arroz é um lanche muito tradicional entre as crianças estadunidenses.

De acordo com a FDA, o arroz branco e o integral contêm níveis mais altos de arsênio inorgânico do que qualquer outro alimento. O arsênio é um elemento natural encontrado no solo, na água e no ar. O arroz irrigado tem facilidade em absorvê-lo. Ainda segundo a nota, o excesso de consumo de arsênio inorgânico tem sido associado a problemas no sistema imunológico e no desenvolvimento neurológico de crianças naquele país. Os produtos não foram proibidos, mas entraram numa zona de “avaliação”.

Diante do alerta, a Academia Norte-Americana de Pediatria aconselhou aos pais buscarem alternativas, incluindo aveia, trigo e quinoa. Pesquisadores em todo o mundo têm se debruçado sobre estudos para reduzir a absorção da substância pela planta. Na Ásia, um dos trabalhos com resultados iniciais promissores é a produção de um arroz transgênico de baixa absorção do elemento natural.

O alerta norte-americano refletiu no mundo todo, onde diversos comunicados de organismos de saúde foram emitidos aos consumidores sugerindo alternativas aos alimentos à base de arroz para bebês. Todos os alertas pedem parcimônia no consumo das “papinhas” e cremes e sugerem substitutos eventuais para evitar o uso constante e repetido do mesmo alimento, que poderia gerar alta concentração da substância no organismo dos bebês.

No Brasil, as iniciativas ainda engatinham, parte delas buscando espaço na fila de financiamentos – cada vez mais escassos. O tema, vez por outra aparece nas discussões científicas, em projetos acadêmicos ou de um ou outro pesquisador, mas em se tratando de reduzir a absorção da substância pelas plantas, não há avanços. O setor trata o assunto veladamente, temendo que um debate mais forte leve à rejeição ao produto – e queda no consumo – e ao surgimento de radicais contra o grão. Postura corporativa que deve ser superada pelos princípios científicos e pelo objetivo de produzir um grão cada vez mais saudável.

Concentração também ocorre no Brasil
Uma das raras pesquisas brasileiras identificou concentrações expressivas da substância no arroz e conclui que o arroz, se não submetido a um controle de qualidade eficaz, pode apresentar uma concentração de variações de arsênio acima do ideal. O alerta veio da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto (FCFRP), da Universidade de São Paulo (USP). “Tal concentração elevada pode contribuir para o desenvolvimento de doenças crônicas como o câncer”, observa o farmacêutico bioquímico Bruno Lemos Batista, autor do estudo.

Batista identificou concentrações expressivas em diversas variedades de arroz comercializadas no país, tais como o branco (polido), o integral (sem polimento) e o parboilizado (do inglês partialboiled, ou seja, parcialmente fervido). Nas análises foram constatados níveis moderadamente elevados, na faixa dos 222 nanogramas (ng) por grama de arroz, similares a concentrações encontradas em outros países como a China.

O arroz do tipo integral foi um dos que apresentou maior presença de arsênio, pois, em geral, o elemento pode se acumular no farelo. “Decidimos fazer a especiação química destes grãos, verificando que, em média, eles possuem ao redor de 40% do arsênio presente nas formas orgânicas e 60% nas formas inorgânicas”, conta Batista.

Considerando a média de arsênio no arroz e que o brasileiro consome 86,5 gramas desse grão ao dia, a ingestão via arroz é pouco maior que via água em sua concentração máxima permitida para ingestão (10 microgramas [µg] de arsênio por litro de água) a partir da média de 2 litros de água diários. Experimentos muito incipientes estão sendo realizados para identificar como reduzir a presença no cereal.

Plantas extraem arsênio do solo e da água 

Substância é absorvida naturalmente pela planta

É nas lavouras que o arsênio é absorvido pelas plantas e levado até os grãos. A substância se apresenta na natureza (solo, alimentos, água) em mais de 20 formas diferentes, algumas mais e outras menos tóxicas aos seres humanos, animais e até plantas. Dependendo da forma e da quantidade ingerida pela pessoa, esta substância pode causar sérios danos ao organismo, como o câncer, causado pelo arsenito, uma das formas em que ele se apresenta. Por outro lado, existem formas que se ingeridas em grandes quantidades não causam danos ao organismo humano, como, por exemplo, a arsenobetaína, comumente encontrada em alimentos marinhos como o camarão.

Das 20 espécies presentes no ambiente, as cinco vistas como mais importantes foram utilizadas como objeto de estudo. As variações mais importantes são assim classificadas por serem mais comuns, mais estudadas ou mais tóxicas. Entre estas espécies destacam-se, em ordem crescente de toxicidade, a arsenobetaína (AsB), dimetil arsênio (DMA), monometil arsênio (MMA), arsenato (As5+) e arsenito (As3+). “Assim, por exemplo, o As3+ é mais tóxico, gera mais danos a um organismo que o DMA”, aponta o pesquisador Bruno Lemos Batista, autor do estudo.

Para ele, a fiscalização sobre o que consumimos deve estar entre as principais diretrizes das políticas públicas. E no caso do arroz, essa proposta não muda. “Temos que procurar sempre a segurança através, no mínimo, do monitoramento da concentração de arsênio e suas espécies químicas, principalmente as inorgânicas, e, na medida do possível e da necessidade, realizar pesquisas básicas para entendê-las num processo dinâmico desde plantas até o ser humano”. Para Batista, outros alimentos também deveriam entrar nesse monitoramento, “focando tanto na quantidade de elementos que causam danos ao organismo, como o mercúrio presente no peixe da Amazônia, como na quantidade de elementos químicos essenciais ao funcionamento do nosso organismo, como o selênio na castanha-do-pará”.

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