Importação de arroz priorizará o Mercosul. Indústria e produtores são contra
(Por Cleiton Evandro, AgroDados/Planeta Arroz) Os efeitos do fenômeno El Niño sobre a safra de arroz 2023/24 no Rio Grande do Sul, que causou pelo menos três enchentes, entre elas a maior da história na bacia do Jacuí-Guaíba, deu ao governo federal a oportunidade e o argumento para consolidar a iniciativa de importação do grão, visando reduzir os preços médios praticados nas gôndolas dos supermercados. A intenção já havia sido deixada clara pelo presidente Lula em discurso recente, em que lamentou que no final do ano o governo não importou arroz “da Venezuela”. Uma série de memes nas redes sociais, que viralizaram no Brasil, dizendo que em seu governo o arroz se tornou inacessível para grupos vulneráveis ou de baixa renda.
O anúncio de importação causou reação das entidades arrozeiras, em especial as do Rio Grande do Sul, que asseguram haver capacidade de abastecimento do mercado nacional, mesmo com a quebra importante na colheita. O Irga antecipou o anúncio de volume de safra, estimando em 7,1 milhão de toneladas a colheita atual, apenas 100 mil toneladas a menos do que a anterior. O aumento de área ajudou a chegar a este número, mesmo que boa parte dos 100 mil hectares por colher estejam embaixo d´água. Federarroz, Farsul e entidades representantes da indústria gaúcha, anunciaram posição contrária ao programa do governo. Entendem que o próprio mercado se regula e que a iniciativa da indústria em importar 75 mil toneladas de arroz branco, 100%BG, já seria suficiente para balizar o mercado e deflagrar um fluxo adequado de comercialização.
Equipes da Conab e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) estão trabalhando na elaboração de uma Medida Provisória que autoriza a importação de até 1 milhão de toneladas de arroz pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). No entanto, o presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), o gaúcho Edegar Pretto, buscou tranquilizar o mercado ao informar, em entrevista, que num primeiro momento a intenção é de realizar um leilão de compra de 200 mil toneladas, priorizando aquisições do Mercosul, e que após essa aquisição será avaliada a necessidade de novas operações. “A meta é ser pontual, para atender gargalos do mercado”, explicou.
Segundo o Irga, 84% da safra de arroz do Rio Grande do Sul já foi colhida e armazenada, mas as enchentes colocaram parte desses estoques. Em coletiva, o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, afirmou que a criação da Medida Provisória não visa competir com os produtores locais, mas sim evitar aumentos abusivos nos preços. “A importação de arroz não tem a intenção de competir com os produtores locais para baixar os preços e prejudicar sua situação financeira. Nosso objetivo é evitar o desabastecimento e a especulação financeira durante esse momento de crise”, explicou Fávaro. “Queremos equilibrar a relação de mercado, que no momento está desequilibrada em desfavor do consumidor”, acrescentou.
Pretto explicou que a importação de arroz não deverá competir com a produção nacional. A medida visa suprir regiões do país que não produzem o grão, como o Nordeste, Norte e Sudeste, garantindo o acesso ao produto sem riscos de inflação ou escassez. “A quantidade e o momento da aquisição serão planejados e pontuais para não prejudicar os produtores nacionais. Nosso foco é abastecer as regiões que dependem do arroz importado, garantindo o acesso ao produto para todos os consumidores”, destacou Pretto. O governo também deixou nas entrelinhas que pretende retomar a formação de estoques reguladores, que não passaram de 30 mil toneladas na última década, mas que já chegaram a beirar 3 milhões de toneladas num passado não tão distante. Na época, o governo brasileiro carregava o estoque de passagem de todo o Mercosul.
INDÚSTRIA DESAPROVA
Para o presidente do Sindicato da Indústria do Arroz no Estado do Rio Grande do Sul (Sindarroz-RS), Carlos Eduardo Borba Nunes, a medida governamental é desnecessária e inoportuna. “Estamos vivendo um momento de dificuldade logística em função do evento climático que afetou as rotas e estradas de boa parte dos centros de distribuição e das indústrias. Mas, temos grão suficiente para abastecer o mercado brasileiro ao somar a safra em andamento, os estoques de passagem e as exportações privadas do Mercosul e, agora, da Tailândia”, enfatizou. As entidades industriais irão publicar uma nota se posicionando contrárias à medida. Entendem que o Brasil fatalmente importará perto de 1,5 milhão de toneladas sem intervenção do governo, e que em função dos preços atualmente praticados no país, dificilmente serão exportados mais de 800 mil toneladas de arroz, de uma previsão também de 1,5 milhão de t. “O arroz que deixará de ser exportado, pelo cenário de preços, cobrirá a quebra estimada para a safra gaúcha”, explicou Borba Nunes.
A diretora-executiva da Associação Brasileira da Indústria do Arroz (Abiarroz), Andressa Silva, reforçou que a indústria entende como desnecessária a importação por parte do governo. “Além de mais onerosa e menos ágil ainda corre o risco de pesar a mão e desregular o mercado”, acrescentou. Segundo ela, a importação privada de 75 mil toneladas de arroz branco da Tailândia pela indústria se mostrou necessária para assegurar a oferta nesse momento em que o produtor está retraído, devido às incertezas que pairam, de forma a assegurar o abastecimento. “É importante que o produtor mantenha a oferta regular ao mercado para assegurar a fala do presidente da Federarroz, Alexandre Velho, de que o abastecimento está garantido”, destacou.
Além de desregular o mercado interno com excesso de produto, o governo poderá desestimular os arrozeiros a retomarem área e produção na temporada 2024/25. “A intervenção do governo costuma ser nociva aos agricultores e à cadeia produtiva, que levam vários anos de baixa rentabilidade na última década. O mercado se regula e o governo, quando intervêm, desorganiza tudo”, explicou um industrial que preferiu não ser identificado. Ele também lembrou que as aquisições deverão refletir na elevação dos estoques de passagem.
AGF ESPECIAL
Inicialmente, a intenção do governo federal é realizar leilões de compra de arroz beneficiado, tipo 1, com origem externa comprovada, empacotado, para distribuir a pequenos varejistas e comunidades carentes em programas sociais. O leilão funcionará como uma espécie de AGF (Aquisição do Governo Federal) especial, com regras próprias. O produto desta importação só poderá ser comercializado no Sudeste, Norte e Nordeste (excluindo Sul e Centro-Oeste). Será possível, por exemplo, importar arroz em casca e beneficiar no Brasil, empacotar e participar da concorrência. Não será retirada, em princípio, a Tarifa Externa Comum (TEC).
A indústria aponta, porém, que não há arroz em casca disponível para comprar nos mercados internacionais. Tanto o Mercosul quanto a Ásia, e os Estados Unidos – que estão em pico de entressafra e não dispõe de volume de produto para negociar – não comercializam arroz em casca. O Brasil é um dos raros países que exporta matéria-prima. Alguns industriais ouvidos por Planeta Arroz, entendem que o governo federal poderia retirar a TEC de 10% sobre o arroz em casca e 12% sobre o arroz beneficiado dos terceiros mercados – fora do Mercosul – se a preocupação for realmente garantir o fluxo de oferta. Entendem que uma alta dos preços do arroz no Brasil é inevitável por causa do momento logístico e do ajuste na colheita, e sob estas condições os agricultores costumam segurar a oferta esperando preços ainda maiores.
O governo federal, por sua vez, aponta que diante das dificuldades logísticas causadas pelas enchentes e que dificultam o abastecimento de alimentos, como o caso do arroz, está trabalhando para restabelecer a infraestrutura de transporte e garantir atendimento aos locais mais necessitados. A Medida Provisória (MP) deve ser publicada até a próxima semana. A minuta está em discussão entre setores do governo. Outro tema que deve ser debatido, em curto prazo, pelo governo federal são os preços mínimos do arroz. Extraoficialmente, a proposta da Conab é de uma elevação que aproximaria os valores referenciais dos preços de mercado. E isso, ao menos, estabeleceria um piso para o mercado.
2 Comentários
O presidente da Associação dos Arrozeiros tem que convencer os produtores que não deixem a indústria desabastecida, caso haja especulação o governo vai acabar fazendo besteira, acho que não e necessário essa medida de importação esagerada, se olharmos as saídas de arroz do estado nos 3 primeiros meses, a média e de 490 mil tons, se seguir essa média, já temos produto colhido para suprir o mercado soma-se a isso as importações do Mercosul e mais o que vai vir da Tailândia, deu!
e ainda continua com a informação distorcida de ïmportar arroz da Venezuela¨. Até as torcidas do Inter e Gremio juntas já entenderam que o presidente quis dizer ¨não exportar para a Venezuela”, pois nos meses anteriores o Brasil havia exportado muito arroz para a Venezuela, a preços mais baratos. A indústria, como sempre, é contra interferências do governo, querendo elas gerenciar algo que é de interesse público. Fizeram toda a pressão pra acabar com os estoques reguladores e agora acham que podem legislar sobre políticas do governo. Garantem que o arroz não vai disparar de preços? Óbvio que não! Então aceitem que governo é pra isso mesmo