Ministro Marco Aurélio vota pela anulação da demarcação da Raposa
Ele havia pedido vista, em dezembro de 2008, da ação ajuizada por senadores do estado contra a demarcação e alegou que partes fundamentais interessadas na regularização da área foram excluídas no processo que resultou no reconhecimento da reserva.
Depois de pouco mais de seis horas de leitura de um extenso voto de 120 páginas, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello pediu ontem (18) a anulação da demarcação em faixa contínua da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, homologada em abril de 2005 pelo governo federal. Ele havia pedido vista, em dezembro de 2008, da ação ajuizada por senadores do estado contra a demarcação e alegou que partes fundamentais interessadas na regularização da área foram excluídas no processo que resultou no reconhecimento da reserva.
O placar no momento é de oitos votos a um pela demarcação contínua, já que todos os ministros que se manifestaram anteriormente a Marco Aurélio consideraram a ação improcedente e reafirmaram a área de 1,7 milhão de hectares como de uso exclusivo dos indígenas. Ainda faltam votar os ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes, presidente da Corte. Até a conclusão do julgamento, qualquer ministro pode rever seu voto.
O voto de Marco Aurélio foi longo. O ministro enfatizou que o estado de Roraima e os municípios de Uiramutã, Pacaraima e Normandia, cujas áreas geográficas são afetadas pela demarcação, não foram citados para que fossem ouvidos no processo de reconhecimento da área. Tal situação, de acordo com ele, acarretaria a nulidade da medida administrativa adotada pelo governo federal.
Segundo o ministro, uma nova ação demarcatória exige que sejam ouvidas todas as comunidades indígenas existentes na área a ser demarcada, os posseiros e titulares de domínio, o estado de Roraima e os municípios afetados, além do Conselho de Defesa Nacional quanto às áreas de fronteira.Marco Aurélio assinalou ainda que o novo levantamento antropológico e topográfico para definir a posse indígena deve ter como termo inicial a data da promulgação da Constituição Federal.
O ministro questionou o reconhecimento da totalidade da área como pertencente aos índios.
– Não se pode mesmo crer que, em 1988, número limitado de indígenas ocupasse, de forma contínua, área tão vasta – afirmou.
– Uma coisa é dar-se a verificação da posse pelos indígenas em 1988 e preservá-la, impedindo-se a permanência de terceiros. Outra diversa, que não se coaduna com os ditames constitucionais, que a todos submetem, é fazer-se a demarcação contínua e, aí, em área de tamanho incompatível com o conceito de posse, chegar-se à exclusão dos que não sejam considerados, na via direta ou indireta, indígenas – acrescentou.
Outro aspecto abordado por Marco Aurélio foi o fato de parte da população indígena da reserva não estar de acordo com a demarcação contínua. As comunidades que adotam esta posição não teriam sido consultadas para a elaboração do laudo que embasou a demarcação.
– O estágio de aculturamento talvez tenha avançado de tal maneira que não mais interessa o total isolamento do povo indígena, de forma a viabilizar a vidacomo em tempos ancestrais. Não cumprir o dever de consulta pode vir a provocar maior lesão aos direitos humanos, pois parte-se da premissa errônea de que todas as comunidades desejam o isolamento – ressaltou Mello.