O campo envelhece
Modelo com dias contados.
Na propriedade-modelo de cultivo de arroz em Agronômica, Nilton Venturi, de 55 anos, e a esposa Janete Venturi, de 49, comemoram a escolha da sua plantação para a solenidade de abertura da colheita no município do Alto Vale do Itajaí, que carrega o título de maior produtividade mundial do cereal.
O arroz é a vida de Nilton, que acorda de madrugada para conferir cálculos e tratamentos ideais para a lavoura. É a mulher que o entrega:
– Às vezes, procuro por ele às 4h da manhã, ainda noite, e ele já está na sala, fazendo contas. Vive pro arroz o ano inteirinho, não só nos períodos de limpeza do solo, plantio e colheita. É quase uma obsessão.
Não é à toa que a lavoura de Nilton vai garantir 11 mil quilos de arroz por hectare, um número muito acima da média do Brasil, de 4,2 mil quilos por hectare, e um dos mais elevados do mundo. O segredo, diz o técnico agrícola da Epagri em Agronômica Olímpio de Paula, é cuidar da lavoura como se fosse um jardim, com melhoramento em cada metro quadrado.
Nilton, que vem de uma família de agricultores, faz exatamente isso: trata da terra como um canteiro de flores. Aprendeu desde cedo com o pai. Mas dentre os quatro irmãos, foi o único que optou por continuar na agricultura.
– Meu pai colocou nós quatro para trabalhar quando comprou estas terras. Mas só eu continuo. Hoje, com meus filhos, não posso fazer o mesmo. As terras são caras, o investimento é alto e o arroz está com o preço baixo. Eu consigo me manter, mas não vejo perspectiva para o futuro. Vou tocar até quando não der mais, mas minha família já escolheu outro caminho – ressalta.
Nilton e Janete têm três filhos. Fábio, o mais velho, tem 29 anos, é casado e optou pela carreira de vendedor. Claudia, com 24 anos, é casada, cuida da filha e vai fazer faculdade este ano. O caçula Flávio, com 20, trabalha numa concessionária de veículos em Rio do Sul.
O casal de agricultores acata as escolhas dos filhos e segue a vida sem saber quem vai levar adiante a propriedade modelo. Por isso, as suas decisões consideram a possibilidade de a agricultura acabar para a família Venturi.
– A cada ano que passa, nós aterramos uma parte da lavoura de arroz e reduzimos a nossa área plantada. Pretendemos vender os terrenos para a construção de imóveis. Assim, a gente ajuda Agronômica a crescer e assegura uma renda digna quando não puder mais trabalhar na lavoura – projeta Janete.
Além de plantar nos atuais 7,5 hectares que possui entre a BR-470 e a estrada principal de Agronômica, Nilton opta por arrendar terras de outros proprietários para manter a produção.
Chegou a investir numa colheitadeira, mas a vendeu em prestações. Não quer a responsabilidade de arcar com a manutenção de um equipamento tão caro. O pagamento é feito em colheitas pelo novo dono da máquina.
– Na época em que eu comecei com meu pai tudo era tração animal, muito cansativo. Hoje o maquinário facilita a lida na lavoura. Mesmo assim, para o pequeno agricultor, o arroz deixou de ser uma atividade rentável. Acho que só vão sobrar grandes fazendeiros na produção de alimentos em Santa Catarina. Não vejo muita esperança – decreta Nilton.
Envelhecimento e masculinização do campo
60%
das moças e 40% dos rapazes que saem das propriedades rurais não voltam para as atividades rurais.
50 anos
é a idade média dos chefes de estabelecimentos rurais.
Dos jovens com idades entre
15 e 24 anos, existem
17%
mais rapazes do que moças.
29%
das propriedades rurais não têm sucessores ou apenas um filho mora com os pais.
Quando perguntados sobre sua perspectiva de futuro:
62%
dos filhos de agricultores capitalizados* e 22% entre os descapitalizados** dizem que continuarão na agricultura.
26%
dos jovens entre 13 e 18 anos querem ser agricultores, mas 27% não querem e 18% preferem ter outra profissão.
Entre as mulheres, apenas
33%
querem permanecer e trabalhar no campo, enquanto 42% desejam trabalhar e morar na cidade.
53%
na faixa etária entre 13 e 18 anos querem trabalhar e morar na cidade e só 25% manifestam vontade de seguir como agricultora.
28%
das moças que vivem em unidades descapitalizadas têm o desejo de serem agricultoras, enquanto metade delas gostaria de trabalhar e morar na cidade.
* Rendem três salários mínimos ou mais por mês por pessoa ocupada
** Rendem menos de um salário mínimo
por mês por pessoa ocupada