Pé na África

 Pé na África

Pesquisador João Marques, da Embrapa: ensaio fatorial de variedade versus sistemas

Embrapa apoia a
rizicultura no
continente africano

.

Entre as grandes vantagens competitivas que o Brasil vem apresentando ao mundo está o rápido desenvolvimento agropecuário vivenciado nas últimas três décadas. O esforço que a sociedade brasileira empreendeu, tanto o setor público como o privado, fez com que o país se inserisse no cenário mundial como uma grande potência na produção de alimentos. Um dos alicerces deste processo foi a pesquisa agropecuária, ao possibilitar que os índices de produtividade em diferentes atividades chegassem ao topo, refletindo na conquista de mercados e no crescimento contínuo do setor primário.

Há alguns anos, o país passou também a exportar a tecnologia agropecuária aqui desenvolvida, contribuindo de uma forma significativa para alavancar a agricultura em países ainda considerados subdesenvolvidos, como Senegal, Moçambique, Guiné Bissau, entre outros. Entre as experiências de transferência de tecnologias e de conhecimentos está o acordo de cooperação técnica para o desenvolvimento da rizicultura no Senegal. O acordo foi firmado entre o Ministério das Relações Exteriores do Brasil, por meio da Agência Brasileira de Cooperação-ABC, a Embrapa, a Emater-DF, o governo senegalês e o Instituto Senegalês de Pesquisa Agrícola (Isra).

Com pouco mais de 50 anos de independência da França, o Senegal ainda apresenta uma condição de extrema pobreza e falta de recursos básicos, como a água. No entanto, este país possui um grande potencial de aumentar sua produtividade, conforme constatado pelo coordenador das pesquisas em rizicultura no Senegal, João Batista Beltrão Marques.

Contribuições internacionais da Embrapa

Após quase três anos de atividades no Senegal, o pesquisador da Embrapa Pecuária Sul (Bagé-RS) João Batista Beltrão Marques retorna ao Brasil trazendo os resultados dessa experiência no continente africano. Atuando pela Secretaria de Relações Internacionais da Embrapa, ele foi o responsável pela coordenação das atividades de transferência de tecnologia da Embrapa Arroz e Feijão (Santo Antônio de Goiás-GO) no Senegal. O projeto iniciou-se em abril de 2010 e foi finalizado em abril de 2013, culminando com a indicação para homologação de quatro cultivares de arroz da Embrapa no país.

De acordo com Marques, a introdução de novas cultivares de arroz, um dos principais objetivos do projeto, foi realizada por meio de testes comparativos entre as variedades utilizadas no país africano com o intuito de melhorar a produtividade, bem como a qualidade do grão. No Senegal, o arroz é a base dos pratos típicos nacionais (tieboudiene e yassa), sendo amplamente utilizado. Por ano, cada habitante come, em média, 74 quilos do grão, sendo que, no Brasil, a média é de 40 quilos por pessoa/ano. Isto faz com que o país figure entre os maiores consumidores de arroz da África Ocidental.

No entanto, somente entre 20% e 30% do arroz consumido é produzido pelos próprios senegaleses. Todo o restante é importado, sendo o Brasil um dos principais fornecedores, o que causa um grande déficit na balança comercial do Senegal. Esta desarticulação no sistema produtivo se dá pela vulnerabilidade climática causada pelo fato do Senegal se localizar abaixo do deserto do Saara. Em FanayeDiery, região próxima à cidade de Saint Louis, no noroeste do país, onde foram realizados os trabalhos de pesquisa com as cultivares da Embrapa com o apoio do Isra, a restrição hídrica é a mais grave, com taxas pluviométricas de 300 mililitros por ano, se assemelhando muito ao clima do nordeste brasileiro.

Na busca de reverter as importações excessivas de arroz e de outros cereais, bem como reduzir o risco à segurança alimentar, o governo senegalês vem atuando, desde o acordo firmado em 1972 com o Brasil, para incentivar o desenvolvimento socioeconômico nas áreas agrícolas. Mas foi em 2009 que se firmou legalmente o apoio de cooperação técnica às regiões de vocação especificamente rizícola. Uma tarefa nada fácil, diante dos problemas existentes.

Na rizicultura irrigada, praticada mais ao norte, entre as principais restrições estão, por exemplo, o estado de deterioração dos depósitos de armazenamento, a ação dos pássaros granívoros e a falta de equipamentos agrícolas e de crédito para o plantio. Já na rizicultura pluvial, mais praticada ao sul, há o problema de salinização e acidificação das terras, falta de sementes de qualidade e de variedades adaptadas, bem como secas periódicas que lá ocorrem, limitando o rendimento de grãos do arroz pluvial (ou de sequeiro).

Capacitações potencializam o desenvolvimento

Tecnologias brasileiras: podem fazer a diferença à produção da África

Os bons frutos colhidos não foram só em relação à adaptação das cultivares da Embrapa no país africano. Outro importante objetivo alcançado no acordo entre os dois países foi a capacitação de técnicos e produtores. Segundo o pesquisador João Batista Marques, foram capacitados durante os dois anos e meio de trabalho 104 pessoas, entre técnicos do Isra e produtores de arroz de todo o Senegal. Além dos trabalhos diários, foram realizados no Brasil e no Senegal cursos sobre manejo da cultura do arroz, desde o preparo do solo até a pós-colheita.

“Fizemos cursos de mecanização agrícola, estudos de teste varietal com as cultivares brasileiras e curso de valor de cultivo e uso (VCU), além de oito dias de campo, que foram fundamentais para apresentação e divulgação das pesquisas e discussão com os produtores dos resultados alcançados”, conta o pesquisador da Embrapa Pecuária Sul (Bagé-RS), João Batista Beltrão Marques.

Foram testadas 12 variedades de arroz da Embrapa, sendo quatro delas de arroz irrigado e oito de sequeiro ou pluviais. As cultivares de arroz irrigado (BRS Biguá, BRS Alvorada, BRS Jaçanã e BRS Tropical), devido aos resultados positivos e à boa adaptação, receberam indicação para serem homologadas no país, uma etapa anterior ao registro da variedade para plantio no Senegal.

Porém, na estação experimental localizada no norte, as variedades pluviais não tiveram bons resultados, por exigirem um sistema de irrigação impróprio para o clima da região. “As variedades pluviais continuam a ser testadas no sul do Senegal, por isso é necessário que aconteça uma segunda fase do projeto”, aponta Marques.

Estavam previstos também no acordo inicial entre os países a doação e introdução de máquinas maiores e a reabilitação de estações experimentais que servirão de unidades piloto no projeto. “Estas etapas, porém, ainda não foram finalizadas, pois houve uma desaceleração de investimentos. Após o término da revitalização da estação experimental, pretende-se testar a produção de sementes para distribuição a outros produtores, bem como o oferecimento de cursos a outros países”, diz.

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