Recrudesce guerra nas bolsas de alimentos

Evoluções que trazem, ainda, recomposições de ordem geopolítica. O petróleo como motivo de guerra aumenta, internacionalmente, e eclodem guerras por água e alimentos.

Especuladores apostam em alimentos e biocombustíveis
Bruxelas – Pululando pelo planeta, especuladores internacionais abandonaram as bolsas de ações e câmbio e direcionaram suas ações às bolsas de alimentos (Chicago para grãos e Liverpool para algodão) ameaçando a sobrevivência de 3 milhões de seres humanos do mundo em desenvolvimento (a metade da população da Terra).

Evoluções que trazem, ainda, recomposições de ordem geopolítica. O petróleo como motivo de guerra aumenta, internacionalmente, e eclodem guerras por água e alimentos.

Além da orgia de especulação nas bolsas dos alimentos, existem dois elementos que provocam (ou justificam) a alta dos preços. A alta da cotação do petróleo provocou uma guinada aos biocombustíveis. Sabe-se que, para a produção de 100 litros de biocombustível, é necessário o volume de milho que consome um ser humano do Terceiro Mundo em um ano.

O outro elemento são os transgênicos. A crise no mercado de alimentos obriga, cada vez mais, o livre uso dos transgênicos. A China já assumiu a primazia internacional no cultivo de transgênicos com arroz e milho, seguida pela Índia e outros países asiáticos.

No caso de expansão da proibição das exportações de grãos pelos países produtores, a exemplo do que ocorre com o arroz, haverá problemas com o pão em todo o mundo, porque as reservas são mínimas. Além disso, o mundo é deficitário em arroz e açúcar.

Produção cai

A produção de algodão se reduz seguidamente e este ano calcula-se que será inferior à de 2004. Em 27 de março deste ano, os preços do arroz na Bolsa Chicago foram elevados em 30%. Esta alta foi provocada pela decisão do Egito (maior exportador de arroz do mundo) de proibir as exportadores do produto.

No dia 2 deste mês, os preços de arroz em Chicago aumentaram 2,4%, registrando recorde. O preço atingiu US$ 20,26 as 100 libras, preço historicamente superior (o dobro) ao correspondente do ano passado.

No mercado de arroz predomina grande confusão, porque muitos países, principalmente da Ásia, tomam medidas para garantir a suficiência do produto para a alimentação de suas populações.

Assim, além do Egito, proibiram as exportações de arroz o Vietnã, Índia e Camboja, enquanto Filipinas e Malásia compram qualquer volume de arroz disponível nos mercados.

De acordo com dados da Organização das Nações Unidas (ONU), as reservas mundiais do cereal foram reduzidas aos mais baixos níveis desde 1978 e neste ano as exportações de arroz serão reduzidas em 3,5%. Ainda, advertem que 36 países – entre eles a China – enfrentarão sérios problemas com o abastecimento de alimentos.

Reservas de trigo

Em junho deste ano, as reservas mundiais de trigo atingirão os mais baixos níveis dos últimos 30 anos, de acordo com informações da Secretaria de Agricultura dos EUA. Especificamente, nos EUA, as reservas de trigo serão 10% inferiores às do ano passado e consideravelmente menores desde 1946.

No dia 13 de março deste ano, os preços do trigo atingirão novo recorde (em um dia aumentaram 60 centavos de dólar, atingindo US$ 12,23 o bushel) e, desde então, registram novas altas.

Os preços do milho para entregas mês que vem registraram semana passada novo recorde, em US$ 5,99 o bushel. Por causa das condições do tempo nos EUA (chuvas, principalmente), está atrasada a semeadura do milho, provocando nova alta dos preços.

E já estourou no mercado europeu o primeiro produto para investimentos com base aos preços dos alimentos. O Citibank, maior banco norte-americano, lançou à disposição dos investidores europeus um produto com duração de três anos e com garantia do capital. Seu desempenho dependerá dos preços do trigo, milho, soja e açúcar.

O Citibank espera novos aumentos de preços dos produtos agrícolas, os quais, registram corrida e se encontram em níveis recorde de décadas.

Sem carne

No início deste século, a Europa dispunha de montanhas de carne, manteiga e lagos de leite. Mas tomou medidas restritivas à produção de carne e laticínios, alegando motivos de proteção do meio ambiente.

Em sintonia com a mudança das condições alimentares no mundo em desenvolvimento (a China, por exemplo, consome hoje 25% da produção mundial de carne), enquanto a Europa tem liquidado suas reservas e enfrenta o caso de se tornar parceiro importador, principalmente, em manteiga e leite.

O fenômeno se deve ao fato de a Rússia ter adquirido todos os rebanhos de vacas leiteiras da União Européia, porque o consumo de leite aumentou excessivamente no país. Também, guinada ao leite se observa na China que, para atender à demanda doméstica, adquiriu todas as reservas de leite em pó da União Européia.

De acordo com avaliações oficiais, ano que vem a União Européia será obrigada a importar leite, enquanto, nos últimos meses, os preços da carne bovina aumentaram 50% e os do leite foram superduplicados.

Algodão salta 25%

A alta geral dos preços acompanha, também, o algodão. De acordo com avaliações da Comissão Consultiva Internacional do Algodão (Icac), os preços do algodão neste ano serão elevados em 25%, enquanto, ano que vem, os preços serão elevados novamente.

No período comercial 2006-2007, o preço do algodão era de 59,15 centavos de dólar a libra. Neste ano, espera-se que atingirá aos 74 centavos de dólar a libra, enquanto ano que vem deverá superar o nível de 80 centavos de dólar a libra.

A alta dos preços se deve à redução das reservas mundiais, as quais, de 12,7 milhões de toneladas, ano passado, despencaram neste ano para 10.96 milhões.

Desde ano passado, a produção mundial de vinho se reduziu em 6,9% e continua insuficiente para o atendimento do consumo internacional, o qual, por sua vez, se manteve estacionado, de acordo com dados da Organização Internacional de Vinhedos e Vinho (OIV).

A produção mundial de vinho, ano passado, atingiu 25,57 milhões de toneladas, enquanto, o consumo mundial oscilou em torno de 24,05 milhões de toneladas. A queda de produção, ano passado, foi causada pela estiagem que atingiu vários países produtores, reduzindo para 79,99 bilhões de hectares as plantações de vinhedos, contra 79,08 bilhões hectares em 2006.

Mas os vinhos europeus continuam perdendo parcelas de sua fatia no mercado mundial. O percentual da participação européia foi reduzido para 61,8%, de 78,8% no início da década de 1980, enquanto os vinhos do chamado Novo Mundo (Chile, Argentina, África do Sul, Austrália, Nova Zelândia e EUA) conquistam cada vez mais maiores fatias, totalizando, ano passado, 28% do mercado mundial.

Finalmente, a grande surpresa: Brasil China e Índia estão se revelando as novas forças mundiais do setor vinícola.

Laura Britt

Sucursal da União Européia.

Egito, Haiti, Argentina e as revoluções do pão

Zurique – O mais recente exemplo, a crise social no Egito, cuja origem pode estar situada na crônica opressão que exerce o “moderado” regime do presidente Hosny Mubarak, mas o motivo do levante dos egípcios é o pão caro.

A inflação no Egito atingiu em fevereiro deste ano 12,1% (último índice oficialmente divulgado) registrando o maior aumento dos últimos 11 meses. Os preços dos alimentos e bebidas aumentaram 16,8%, enquanto os preços do pão – que não são subsidiados – e dos grãos aumentaram 27%, enquanto o preço da dúzia de ovos aumentou 20,1%.

Para enfrentar o crescente custo, o Egito deverá gastar mais de 16 bilhões de libras egípcias, quase 1% do Produto Interno Bruto (PIB), para cobrir as importações de grãos. O jornal situacionista Egyptian Gazette informou que sete pessoas morreram assassinadas em brigas nas filas para comprar pão.

Já no início da semana passada, durante manifestações no Haiti contra aos aumentos dos alimentos, morreu uma pessoa, aumentando o número dos mortos para cinco, além de 20 feridos em duas semanas.

Em Burkina Fasso, pequeno país da África Ocidental, freqüentemente se registram violentas manifestações e foi declarada greve geral em protesto contra a alta dos preços de alimentos e combustíveis.

Nas Filipinas, a presidente Gloria Kakapagal Aroyo enviou tropas armadas para “orientar” a venda de grãos subsidiados, enquanto, o governo ameaça condenar à prisão perpétua os comerciantes do “mercado negro”.

Na Argentina, a recente decisão do governo de tributar os grãos provocou novos “panelaços” de agricultores revoltados. Ano passado, as associações de consumidores argentinos haviam declarado boicote de uma semana contra o tomate, cujo preço – em conseqüência – despencou de 18 pesos o quilo para 2.

Mais mortes

Na Indonésia foram registradas mortes em conseqüência da fome, enquanto no México continuam as manifestações contra a alta do preço da tortilla (um tipo de pão feito de milho que está incluído em todos os hábitos alimentares nacionais). Também, manifestações contra os preços do pão e dos demais alimentos se registraram na Mauritânia, Moçambique, Camarões, Senegal e Peru.

O aumento de preço do pão provoca preocupações também nos países árabes, temerosos da expansão da “intifada egípcia”. Na Síria, os preços dos alimentos aumentaram 20% nos últimos seis meses, enquanto no Iêmen, um dos mais pobres países do Grande Oriente Médio, os preços dos grãos foram duplicados desde fevereiro deste ano, enquanto os preços de arroz e óleo vegetal foram aumentados em 20%.

Finalmente, também aqui, na saciada Europa, os italianos boicotaram seu prato predileto – as massas – cujos preços aumentaram 20%. A inflação nos países integrantes da Zona do Euro atingiu ao novo recorde de 3,5%, mês passado, com os preços dos alimentos registrando aumento de 5,8%, de acordo com dados da Agência Européia de Estatística (Eurostat).

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