Tábua de salvação
Bloqueios em rodovias federais concentram protestos de agricultores por retomada do crédito
Produtores buscam na securitização a solução para as dívidas
Após anos marcados por secas severas e a devastadora enchente de 2024, parte dos produtores de arroz do Rio Grande do Sul — maior estado produtor do cereal no Brasil — enfrenta um colapso financeiro. A situação alcança principalmente os agricultores da Região Central, atingidos pelas inundações, mas também os da Fronteira Oeste, que sofreram com a estiagem prolongada de 2023.
Sem conseguir honrar integralmente os compromissos com bancos, cooperativas, cerealistas, revendas de insumos e máquinas e, agora, com preços de comercialização abaixo do custo de produção, muitos arrozeiros apostam na possibilidade de securitização das dívidas, uma prorrogação parcelada em 30 anos, como única saída viável. A proposta está em debate no Senado Federal, por meio do Projeto de Lei 320/2025, de autoria do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS).
O texto prevê a conversão das dívidas rurais acumuladas desde 2021 em títulos com garantia do Tesouro Nacional, permitindo condições especiais para pagamento.
“Queremos nada de graça, apenas mais prazo para pagar dívidas que foram acumuladas em cinco anos sem colher”, defendeu a produtora Luciane Agazzi, que atua nas mobilizações, alertando a população para a gravidade da situação no campo.
Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a safra 2024/25 é estimada em 12,14 milhões de toneladas — 14,8% maior que 2023/24. A recuperação, porém, coincidiu com a queda no preço da saca, agravando o prejuízo dos produtores, já pressionados pelo alto custo de produção e dívidas acumuladas.
“Quem vende arroz, o faz com prejuízo. O preço está abaixo do custo”, afirmou Antônio da Luz, economista da Federação da Agricultura do Rio Grande do Sul (Farsul). Para ele, a situação resulta da combinação entre juros elevados e a falta de políticas eficazes de apoio à produção rural, além de retrocesso no seguro.
A Fronteira Oeste, que responde por quase 25% da produção nacional, foi afetada pela seca na safra 2022/23, elevando o endividamento e pondo agricultores em insolvência. A sequência de perdas climáticas mina a capacidade de investimento no setor e gera desânimo nos agricultores.
O presidente da Cooperativa Agrícola Uruguaiana Ltda. (Caul), Ariosto Pons Neto, teme que esse desânimo leve à redução da área plantada, com impacto direto na oferta e preço ao consumidor. “Se o produtor quebra, dependemos de arroz importado, de qualidade inferior e mais caro”, alertou.
Apesar de iniciativas, como a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) e o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), a Conab não se posicionou e sobre a proposta de securitização, o que é visto como solução pelos agricultores.
Entre estes, afirma-se que o modelo proposto pelo governo federal de prorrogação das dívidas apenas contempla um número muito pequeno de produtores, enquanto a maioria não terá o suporte necessário para negociar as dívidas, obter crédito e, principalmente, não alcançará condições de financiar a próxima safra.
FIQUE DE OLHO
O mês de maio foi marcado, no Rio Grande do Sul, por manifestações crescentes de produtores rurais em defesa da securitização, em especial nas rodovias federais e nos acessos às cidades. A mobilização será mantida em junho e terá um evento especial na Fenarroz, em Cachoeira do Sul, entre 17 e 22 de junho.