Tempo seco

 Tempo seco

Ao planejar a próxima safra, arrozeiros devem preparar o manejo para La Niña
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 Já é passado o fenômeno climático El Niño, que ampliou as precipitações na temporada 2015/16 e gerou perdas nas safras do Sul e do Nordeste do Brasil, no Paraguai e no Uruguai que somam perto de 2 milhões de toneladas de arroz. Agora os agricultores se preparam para a chegada do fenômeno climático La Niña, que trará menor volume de chuvas ao Sul e Norte do país e aumentará precipitações no Nordeste.

Segundo o Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (Cptec/Inpe), o fenômeno El Niño – Oscilação Sul (Enos), que iniciou em 2015, atingiu um grau de neutralidade em maio de 2016. Os modelos climáticos indicam a formação, a partir de agosto, do La Niña. O fenômeno deve manter-se em fraca intensidade até abril de 2017.

Meteorologistas apontam a intensificação entre setembro e outubro, permanecendo até 2019, interferindo no clima do planeta. O padrão do fenômeno, segundo os cientistas, tende a ser similar ao ocorrido entre os anos de 1999 e 2001, logo após o forte El Niño de 1997 a 1998.

Mantida a tendência, o clima deve ser caracterizado por chuvas abaixo da média em todo o Brasil Central, com exceção da região Sul, que deve receber um volume maior de precipitações durante a primavera e ter um verão mais seco. O estabelecimento da zona de alta pressão sobre o Brasil Central tende a desviar frentes frias que em geral passam sobre o Rio Grande do Sul, então há uma tendência de até 2017 a região receber um pouco mais de chuvas. Mas entre 2018 e 2019 o padrão climático deve sofrer alterações, causando estiagens ainda maiores no Sul.

Historicamente, em anos de fenômeno La Niña as chuvas na região são mais esparsas e períodos maiores de seca alcançam as áreas mais próximas do Uruguai, como a Campanha e o Sul gaúcho, e também o Vale do Itajaí, em Santa Catarina.

No entanto, estes períodos têm sido marcados por eventos climáticos extremos, como temporais e enchentes em algumas localidades isoladas, por exemplo, os que atingiram a zona Sul em 2007/08. O novo cenário de clima exigirá da orizicultura um conjunto de cuidados, dentre os quais o dimensionamento das lavouras de acordo com a disponibilidade de água reservada para a irrigação, uma boa revisão dos canais de irrigação e taipas das barragens.

FIQUE DE OLHO
Na safra 2011/12, produtores ligados à Bacia do Rio dos Sinos tiveram muitos problemas ao serem acusados, indevidamente, de consumirem a água das cidades e causarem poluição.
Naquela temporada, a oscilação de temperaturas na fase de floração alcançou a Campanha na virada de 2011 para 2012, com noites nas quais os termômetros marcaram 11 graus centígrados em Bagé e Dom Pedrito, causando esterilidade nas espiguetas.
A queda de produção na safra gaúcha foi de 6,7%, associada à estiagem e oscilação das temperaturas – com noites abaixo de 11 graus e calor excessivo durante o dia (acima de 38 graus) – no período de floração das lavouras.

 

Planejar é preciso
O volume de lavouras que ainda não prepararam o solo – ou incorporaram a palha das lavouras de arroz de 2015/16 – às margens das rodovias gaúchas e catarinenses dá bem a ideia de que a próxima não será uma safra fácil mesmo que o clima ajude. A previsão da ocorrência do fenômeno La Niña, de fraca intensidade, indica uma primavera com chuvas normais, verão mais quente e seco e estiagens em regiões pontuais. A intensidade do fenômeno aumentará nas temporadas 2017/18 e 2018/19, trazendo dificuldade de recarga dos mananciais.

Com crédito restrito, sem planejamento e solo para preparar e com uma lavoura para formar com parcos recursos, alguns agricultores ainda envolvidos com a “conclusão” da safra passada, prorrogações e parcelamentos de dívidas, enfrentarão o clima e os demais obstáculos “no peito e na raça”. Mas quem tem oportunidade e tempo para planejar-se com base nos prognósticos climáticos deve adotar medidas capazes de fazer a diferença entre o prejuízo e o lucro.

O engenheiro agrônomo Jaceguay Barros, consultor na Depressão Central gaúcha, aconselha o preparo antecipado do solo e o dimensionamento da lavoura de acordo com a disponibilidade de água para a irrigação.

“Ainda que na primavera as previsões sejam de volume razoável de chuva, isso não acontecerá de maneira uniforme em todas as regiões, então o rizicultor não pode contar com a sorte de uma recarga de água nas barragens e arriscar cultivar uma área maior”, explica.

Segundo Barros, o rizicultor deve buscar um controle mais efetivo do ambiente por meio das práticas agrícolas. “Não se trata só de reservar água, vistoriar os canais, despontes e taipas para evitar desperdício, estruturar o sistema de irrigação, mas de realizar as práticas no momento adequado e da forma correta, como recomenda a pesquisa”, avisa. A água não pode demorar dois, três ou quatro dias para alcançar toda a lavoura, a irrigação precisa ser eficiente para controlar invasoras e cumprir o seu papel.

“Banhar a lavoura só em último caso, se faltar umidade no solo para a germinação, para economizar água e também evitar a disseminação de ervas-daninhas”, avisa o engenheiro agrônomo Paulo Luciano de Siqueira, de Candelária (RS). Ele destaca que o nível de umidade no solo é fundamental para a eficiência dos insumos.

“Na Depressão Central temos um problema sério, que é o atraso na época de semeadura, seja por chuvas ou falta delas, pela maior parte das áreas serem arrendadas ou pelo endividamento. Isso reflete no resultado da safra, seja em quantidade ou qualidade. Observar a época de plantio é determinante para o sucesso”, acrescenta Barros.

CAMPANHA

O diretor administrativo do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), Renato Rocha, destaca que em sua região, a Campanha, os anos de La Niña são complicados. “Há uma tendência de estiagens mais prolongadas na região de Bagé, Dom Pedrito e Santana do Livramento, mas em temporadas nas quais o fenômeno se alonga essa tendência alcança a Fronteira Oeste, a Depressão Central e até o Litoral Norte”, explica. Nas proximidades da região metropolitana e das grandes cidades acaba havendo um choque de interesse entre produtores e consumidores urbanos na medida em que a vazão dos rios diminui.

Também sob condições de La Niña, rizicultores que dependem das lagoas Mirim e dos Patos enfrentam problemas de salinização da água. “Além de todas as práticas para mitigar os efeitos do clima, há uma decisão que depende só do produtor: fazer o seguro agrícola. A agricultura é uma atividade de risco, sob ação de fenômenos climáticos, mais ainda. Então o seguro é uma garantia”, diz Rocha.

SOJA
A previsão climática preocupa não só na lavoura de arroz. Para a soja, os riscos do cultivo da oleaginosa em terras baixas são grandes em condições de estiagem, pois boa parte dos solos não retém água por mais tempo e a compactação das várzeas costuma impedir a boa propagação do sistema radicular da planta.

“É preciso tomar as medidas necessárias para a soja se estabelecer bem. A deficiência hídrica para estas plantas pode ser mais limitante do que o excesso”, avisa o engenheiro agrônomo Jaceguay Barros. Segundo ele, a previsão de La Niña não quer dizer que em algumas regiões não vá chover bem, talvez em excesso. Mas quer dizer que é preciso estar atento para irrigar as culturas quando faltar água. “Além disso, com La Niña ou sem La Niña, um bom sistema de drenagem é fundamental para o cultivo da oleaginosa em terras baixas”, completa o consultor.

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