Caminho sem volta
Quebra na safra gaúcha não deve comprometer as vendas externas em 2010
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Com a quebra na safra do Rio Grande do Sul, estimada pela Conab em um milhão de toneladas, aliada à alta do dólar e à valorização do produto no mercado interno, há uma tendência natural de que o Brasil passe a importar mais arroz do Mercosul. Uma análise pormenorizada deste cenário, entretanto, mostra que não é bem assim que as coisas funcionam.
Basta lembrar que a Conab no início de 2009 fez uma projeção de exportação de 400 mil toneladas e importação de um milhão de toneladas com base em um quadro de oferta e demanda muito ajustado. Mas contrariando todas as expectativas, a balança comercial do arroz em janeiro de 2010 já estava superavitária antes mesmo do encerramento do ano agrícola.
Para o analista de mercado do Irga, Marco Tavares, o que precisa ser entendido é que neste mercado não existe uma visão de médio prazo em que se o quadro de oferta e demanda estiver muito ajustado a balança vai ficar no zero a zero. “O exportador olha o mercado que está no dia-a-dia, e neste aspecto o mercado é meio just in time. O pessoal não olha se depois vai ter arroz para comprar ou não, se vai ter que importar. Interessa é a oferta e a demanda física do produto naquele momento, desde que haja uma taxa de câmbio competitiva e tenha demanda e preços internacionais competitivos”, observa.
Tavares estima que se os preços do mercado internacional apresentarem uma recuperação prevista de 10% a 15%, o Brasil terá condições de exportar de 500 mil toneladas a 700 mil toneladas. “A meta do setor é exportar 700 mil toneladas, ou seja, 10% da produção da safra gaúcha”, prevê.
MERCOSUL
A quebra na safra do RS também gerou outro tipo de especulação, na verdade duas: a de que vai faltar arroz no mercado interno e consequentemente o Brasil precisará importar mais do Mercosul. E se isso for verdade, vale a pena continuar exportando?
Para o diretor comercial do Irga, Rubens Silveira, tudo isso não passa de especulação: “Em primeiro lugar não há nenhum risco de desabastecimento. A safra brasileira vai ser menor que as anteriores, mas o Governo tem um estoque de passagem em torno de um milhão de toneladas. Então o abastecimento está garantido”, ressalta.
Silveira também chama a atenção para o fato de que desde o advento do Mercosul, em 1989, o país importa anualmente em média 1.100.000 toneladas, basicamente do Uruguai e da Argentina. “Isso não é nenhum fato novo. O que é novo é que se passou muito tempo sem exportar e já faz quase cinco anos que o Brasil, especialmente o RS, vem se inserindo no mercado externo com uma participação importante em exportação. Estamos ganhando espaço nestes mercados e isso tende a continuar”, garante.
Outro fenômeno interessante observado no âmbito do Mercosul é que países como Uruguai e Argentina, que tradicionalmente direcionavam o grosso de sua produção para o Brasil, atualmente destinam somente 30% e 40%, respectivamente, de suas remessas para o país. O procedimento adotado por estes países, conforme Silveira, está sendo o de deslumbrar, a exemplo do RS, terceiros mercados compradores.
Na visão do diretor comercial do Irga, o que vai determinar o ritmo das vendas externas do Brasil em 2010 é o câmbio e as cotações dos mercados externo e doméstico. “A composição dessas três variáveis é que vai fazer com que se tenha um desempenho maior ou menor nas exportações, mas eu não tenho dúvidas que elas vão continuar. Porque isso é um caminho sem volta. O setor está maduro e consciente de que isso é importante, principalmente a indústria do RS, que ao longo dos últimos 30 anos esteve focada no mercado interno e agora vislumbra novas oportunidades”, avalia.
A MATEMÁTICA DA VALORIZAÇÃO
Outro reflexo positivo das exportações de arroz brasileiras é a valorização do produto no mercado interno. Rubens Silveira explica que o mercado doméstico é muito concentrado. “O RS consome 10% da sua produção, portanto 90% é comercializada para fora do estado, especialmente para as regiões Sudeste e Nordeste. Deste volume, cerca de 85% é vendido em grandes redes de supermercados e o restante vai para minimercados, padarias e lojas am/pm. Então o grosso da produção é vendido em grandes redes de supermercados, que estão cada vez mais concentradas. Atualmente são cinco grandes grupos no país. Com o passar do tempo e com o amadurecimento da cadeia produtiva o setor percebeu que ficar somente na mão desses grupos cada vez mais concentrados é estar à mercê dos preços que estes grupos impõem. Neste aspecto, a exportação é um canal que abre novos mercados consumidores. Então está provado matematicamente que se o setor exportar 10% no mínimo da safra gaúcha acabará valorizando os 90% que ficam internamente. Assim, é importante que o varejo saiba que aquela indústria que está oferecendo seu produto também tem outra opção de venda, que são as exportações”, explica.