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Valorização cambial e baixa internacional derrubam exportações
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As exportações do arroz brasileiro, que bateram recorde nos anos comerciais 2008/09 e 2009/10, sofreram um duro golpe para manterem o ritmo de saídas no ciclo de negócios 2010/11: a valorização da moeda brasileira em até 26% sobre o dólar (de R$ 2,20 para R$ 1,75 = US$ 1, em um ano) e a queda dos preços no mercado internacional, em outros 21%, retirou a competitividade do produto doméstico nos mercados externos.
A quebra da safra brasileira em quase 9% e o baixíssimo estoque de passagem das indústrias forçaram uma alta nos preços internos da matéria-prima, em torno de 8%, entre março e a primeira semana de maio. A soma desses fatores é que, se quiser exportar nesse primeiro semestre, a indústria brasileira terá que pagar por isso. “Hoje os preços do arroz brasileiro em dólar – na casa dos US$ 16,00 a saca – é o maior do mundo”, revela o analista de Safras & Mercado Élcio Bento.
A valorização cambial, a queda dos preços internacionais forçada pelos países asiáticos – principalmente Vietnã, que chegou a operar 12% abaixo da Tailândia – e a alta dos preços internos afetaram drasticamente a relação do Brasil com o mercado externo, tanto porque hoje os grandes importadores do mercado mundial têm arroz muito mais barato ofertado pela Ásia, Estados Unidos e Mercosul, quanto pelo fato do ambiente doméstico ter se tornado muito atraente a esses mesmos exportadores.
Essa é a razão pela qual há ofertas de produto do Vietnã e Tailândia batendo à porta brasileira com preços ligeiramente acima dos internos no Nordeste brasileiro. A agressividade dos exportadores asiáticos, baseado em um salto de produção e, principalmente, nos resultados econômicos para seus países, também retira clientes tradicionais do Mercosul, o que – associado ao fato de aumento da demanda brasileira nesse ano – faz prever uma maior oferta de arroz ao Brasil.
Barreiras para garantir o mercado interno
Para evitar prejuízos com essa oferta a preços baixos da Ásia, que poderia afetar o mercado com o excesso de importações, a cadeia produtiva brasileira e do Mercosul articula o aumento temporário da Tarifa Externa Comum (TEC) de 12% para 35%.
“A impossibilidade de exportar evidencia também outra situação: o peso da carga tributária sobre o nosso setor”, afirma o diretor comercial do Instituto Rio-grandense do Arroz, Rubens Silveira.
Para que o Brasil volte a exportar de forma mais significativa em 2010, segundo ele, ou acontece um milagre de elevação das cotações internacionais, de desvalorização do real (ambos improváveis) ou o Governo brasileiro decide criar mecanismos que favoreçam o escoamento da safra também para outros países. “Isso pode se dar pela redução de tributos pagos pelo setor, o chamado Custo Brasil, bem como pela criação de incentivos à venda de excedentes, seja por PEP exportação, seja por drawback”, explica.
TROCA
A cadeia produtiva já trata desse assunto com o Governo por meio da Câmara Setorial do Arroz. “Para compensar a questão cambial que afeta as exportações de diversos setores da economia, o Governo está criando um programa de apoio às exportações. O que estamos fazendo é levar as nossas demandas e sugestões. No caso, exportar não é apenas a garantia de divisas para o país, mas representa a equalização do mercado interno e uma remuneração mais adequada aos produtores”, acrescenta o presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul, Renato Rocha. É uma relação de troca. Os arrozeiros perdem com a moeda forte, mas recuperam com o equilíbrio dos preços gerados pelas exportações.
Uma questão de equilíbrio
Em 2009 o Rio Grande do Sul representou 93% das exportações brasileiras de arroz. A cadeia produtiva gaúcha divulgou que ao exportar 10% da safra do estado, cerca de 800 mil toneladas em 2009, o preço médio ao produtor tem uma elevação também em torno desse percentual. “Esse fluxo de exportações e importações em 2010, até fevereiro de 2011, terá um peso diferenciado na formação de preços internos”, opina Élcio Bento, analista de Safras & Mercado. Segundo a Conab, o Brasil deverá importar 1,2 milhão de toneladas, quase a totalidade do Mercosul, e exportará 500 mil.
Os números efetivamente realizados, porém, ainda não dão indícios de que as vendas externas se aproximem desse patamar. Como é uma informação de Governo, fica a expectativa de que algum mecanismo de suporte às vendas para terceiros países entre em operação ao longo do ano.
O problema é que, segundo o analista de mercado internacional do Centro Internacional de Cooperação Agrícola para o Desenvolvimento (Cirad) da França, Patrício Méndez del Villar, a janela de exportação brasileira se concentra no primeiro semestre do ano, quando há entressafra no hemisfério norte. “Nos últimos anos o desempenho do Brasil nas exportações do primeiro semestre é aquele que garante o recorde. O segundo semestre é mais importador, num movimento clássico do Mercosul esperando uma melhora dos preços internos brasileiros”, revelou. Para as trades internacionais não há dúvidas: o ano é de importar.
Faz subir
Os fatores que poderão determinar a alta de preços no mercado interno no Brasil no ano comercial 2010/11 começam pela quebra da safra brasileira e do Mercosul, o atraso na colheita – que alongou a entressafra -, o baixo fluxo de oferta do produtor, os estoques muito ajustados da indústria e a presença de uma garantia, pelo Governo, de mecanismos oficiais de comercialização caso as cotações caiam muito próximas do preço mínimo (R$ 25,80 por 50 quilos).
Nos últimos anos o percentual de propriedades com sistemas de armazenagem próprios aumentou, gerando maior controle da oferta. Há expectativas para a criação de um programa de apoio à exportação de arroz pelo Governo brasileiro, com isenção tributária e PEP e elevação da TEC para terceiros mercados. Por enquanto, os preços pouco convidativos e a baixa qualidade evitam a compra do arroz asiático.
Faz cair
A associação entre a valorização do real perante o dólar e a queda dos preços no mercado internacional são a causa da diminuição quase a zero das exportações brasileiras de arroz. O cenário só será revertido a curto prazo com compensações governamentais que gerem nova oportunidade de venda externa.
Outro fator de baixa é a oferta muito competitiva do Mercosul. Isso leva a novo fator que pode influenciar a comercialização interna e as cotações: o excesso de importações, seja do Mercosul ou de terceiros países. A demora na ação governamental de liberar mecanismos de comercialização diante de eventual retração dos preços pode também determinar uma baixa ainda mais acelerada no valor do cereal. A exploração eleitoral dos preços da cesta básica brasileira também preocupa e leva para outro fator preocupante com relação ao Governo: a má gestão dos estoques públicos, com sobreoferta.