Em alta, mas com percalços

Analistas apostam
em alta até outubro,
mas com obstáculos.

O cenário de preços ao produtor visualizado pelos analistas consultados por Planeta Arroz indica uma tendência de alta de preços nos próximos três meses, associada ao fôlego dos mecanismos governamentais. Mais otimista, Eduardo Aquiles, da Safras & Mercado, acredita que as cotações manterão até outubro essa tendência altista de junho e julho, porém com menor inclinação. Lembra, entretanto, que a paridade de preços com o cereal do Mercosul poderá conter a escalada, já que Argentina, Uruguai e Paraguai registraram boa produção.

Tiago Sarmento Barata, da Agrotendências Consultoria em Agronegócios, considera que toda a recuperação nominal tem como consequência uma desvalorização, com a inevitável retomada da oferta. “Devemos lembrar que, além da necessidade de capital, haverá, cada vez mais, a preocupação em abrir espaço para o armazenamento da próxima safra”, adverte. A abordagem é muito interessante, afinal, a Conab precisou ser “flexível” e aceitar o credenciamento até mesmo de armazéns de pessoas físicas na safra atual para poder colocar em prática os mecanismos de comercialização.

Alguma movimentação para liberar armazéns estratégicos pode acontecer se saírem do papel as doações de até 500 mil toneladas de arroz, autorizadas em portaria e que são alvo de leilões de troca simultânea (arroz em casca por beneficiado). Mas, faltando seis meses para o final do ano-safra, não se tem notícias de grandes doações humanitárias que afetem este cenário. A redução do ICMS do arroz no Rio Grande do Sul, há muito reivindicada, e o aumento na incidência de impostos, como o PIS/Cofins para o arroz importado, também podem favorecer o escoamento do produto interno.

De qualquer maneira, para Eduardo Aquiles, ainda não é hora de vender o produto. “Quem tem como armazenar, é melhor esperar os preços em alta e vender nos próximos meses”, projeta.

Para Tiago Sarmento Barata, diante do fato da alta das cotações estar associada à retração de oferta, a melhor estratégia é vender quando ninguém estiver vendendo.

Barata considera que a hora é de o setor produtivo se dar conta de que a baixa remuneração da atividade é consequência do alto custo de produção, e não do baixo preço. “Com o atual custo de produção, o produtor sempre será dependente da intervenção pública para diminuir prejuízos. É preciso que haja mudanças estruturais na produção, visando minimizar os custos por saca produzida”, destaca. Além disso, acredita que a cadeia produtiva precisa pressionar os governos federal e estadual para que o Rio Grande do Sul tenha maior competitividade no abastecimento do mercado doméstico, reduzindo a carga tributária incidente sobre o arroz.

Ações de governo são vitais

Até o final de julho, o governo brasileiro investiu R$ 598,7 milhões, 56% do previsto na Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM), para apoiar a comercialização de 2,1 milhões de toneladas de arroz (62% da quantidade estimada). Segundo o analista do mercado de arroz da Companhia Nacional de Abastecimento, Paulo Morceli, a predominância é das operações de Prêmio para o Escoamento de Produto (PEP) e Prêmio Equalizador Pago ao Produtor Rural (Pepro) para escoamento com finalidade à alimentação humana e industrial, seguidos pelo Contrato de Opções e Aquisições do Governo Federal (AGFs).

Além da operação de doação de arroz para o mercado internacional, o governo federal vai adotar mais uma operação de escoamento: o incentivo ao uso de arroz de baixa qualidade como ração animal. A operação consumirá R$ 60 milhões para escoar 500 mil toneladas. “Esta operação tem duas virtudes importantes: por um lado, consome parte do excedente de arroz de baixa qualidade, que pressiona negativamente os preços, e, por outro, substitui ou complementa o uso de milho na ração animal, fazendo que essa matéria-prima, que está com a oferta restrita, tenha seus preços com menores oportunidades de elevação, reduzindo os custos de produção de aves e suínos”, destaca Paulo Morceli.

Para tentar reverter a forte depressão de preços do mercado arrozeiro, o governo federal está apoiando, no ciclo 2010/2011, a comercialização de 3,65 milhões de toneladas do cereal, a um custo de R$ 1,1 bilhão. Paralelamente a estas ações, foi criado um grupo de trabalho para discutir ações estruturais para as próximas safras. A ideia é reunir os governos federal e do RS, a iniciativa privada e os representantes dos produtores para debater novas destinações para o arroz, custo de produção, otimização da área plantada, atividades e cultivos alternativos.

O presidente da Federarroz, Renato Rocha, reconhece que o apoio do governo federal é vital para a lavoura de arroz em 2010/11. “Temos obtido respostas positivas à maioria de nossos pleitos, embora a negativa ao preço-meta, que seria uma inovação importante. Sem este apoio do governo federal, os preços não iam reagir e os prejuízos do setor, dos municípios e estados que têm a orizicultura com importância na economia seriam incalculáveis”, diz. Rocha ainda lembra que nas últimas 21 safras houve prejuízos em 14 delas.

Prejuízos irreversíveis

Para Francisco Schardong, presidente da Câmara Setorial do Arroz, os prejuízos são irreversíveis. “O Brasil chegou ao nível de autossuficiência em arroz, mas a entrada indiscriminada de arroz dos países do Mercosul traz prejuízos irreversíveis aos produtores brasileiros”, alerta. Segundo ele, em igualdade de condições tributárias e de acesso aos insumos, os brasileiros seriam imbatíveis. “Mas amargando prejuízos safra após safra torna-se impossível. É um desestímulo”, considera.

Para ele, as medidas do governo são importantes, mas não há mecanismo que reduza o estoque que o Mercosul descarrega no Brasil anualmente, nem como barrar a entrada destes excedentes.

Schardong ilustra que a mesma colheitadeira que vale na Argentina R$ 243 mil é vendida no Brasil a R$ 311 mil. Outro fator que onera o produtor é a questão tributária. No Rio Grande do Sul, por exemplo, a arrecadação de tributos sobre o custo de produção do cereal chega a R$ 1,4 bilhão. Por isso o produto gaúcho é mais caro do que o importado em algumas regiões brasileiras. O endividamento também foi mencionado. Segundo ele, 65% dos produtores de arroz não têm mais condições de buscar recursos junto aos bancos para financiar a lavoura e acabam obrigados a encontrar outras fontes, com juros mais altos, o que aumenta ainda mais o custo de produção.

Vanir Zanatta, da Organização das Cooperativas de Santa Catarina (Ocesc), diz que as medidas para  recuperar os preços do cereal “chegaram tarde”. Ele revelou que 80% dos produtores catarinenses utilizaram toda a produção para pagar os bancos e ainda não sabem como vão formar a próxima lavoura.

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