Tempos modernos
Mudanças no perfil
do consumidor brasileiro
impõem novos desafios
à cadeia produtiva do arroz
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O Brasil deverá colher 12,3 milhões de toneladas de arroz na safra 2013/14, tornando-se autossuficiente na produção do grão. Isto quer dizer que o país produzirá mais cereal na temporada do que consome em um ano e ainda haverá volume para exportar. Por outro lado, esta autossuficiência só será alcançada devido ao aumento da produção frente ao consumo, que ao longo dos últimos anos permanece estagnado, apenas acompanhando o crescimento populacional.
Dados levantados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) mostram que o consumo de arroz no país caiu de 12, 2 milhões de toneladas, na safra 2010/11, para 11,6 milhões de toneladas, em 2011/12. De lá para cá, estima-se que a demanda interna pelo produto venha se mantendo estável, na faixa das 12 milhões de toneladas.
Existe, no entanto, uma grande dificuldade em mensurar o consumo de arroz no Brasil. “Há uma variação entre as informações de consumo per capita de arroz mensuradas pela Conab, Instituto Brasileiro de Geografia e Pesquisa (IBGE), Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO) e Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda) em razão das diferentes metodologias utilizadas. A FAO, por exemplo, estima em 51,9 quilos por habitante ao ano, mas o dado é de 2009”, informa o analista de mercado da Agrotendências Consultoria em Agronegócios, Tiago Sarmento Barata.
Mesmo levando em conta as diferentes metodologias adotadas, Barata observa que todos os levantamentos mostram uma leve redução do consumo per capita, o que pode ser atribuído às alterações no estilo de vida da população. “O aumento do poder aquisitivo, a entrada da mulher no mercado de trabalho e a maior frequência de consumo fora dos domicílios são alguns dos fatores motivadores de tais mudanças. É uma característica da sociedade moderna buscar produtos com preparo facilitado, passando a ser uma necessidade das indústrias de beneficiamento se adaptar a essa exigência do consumidor”, avalia.
O arroz branco “in natura”, que passa por um processo padrão de beneficiamento para a retirada da casca e polimento (brunido), ainda é o principal produto consumido pela população. Entretanto, o cereal vem perdendo espaço na preferência nacional para outros produtos de maior apelo comercial. “Realmente, o consumo per capita está estagnado há muito tempo, e este será nosso grande desafio. Em parte, isso ocorre porque nossa alimentação está mais variada. As carnes, legumes, massas e saladas são alimentos que, de certa forma, acabam ocupando o lugar do arroz no prato. Mas também é evidente que há um processo de norte-americanização nos hábitos alimentares que está levando o povo brasileiro à obesidade”, afirma o presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul, Henrique Dornelles.
Em busca do mercado
A cadeia produtiva tem buscado alternativas para aumentar o consumo de arroz, como a veiculação de campanhas publicitárias e educacionais orientando a população sobre os benefícios à saúde proporcionados pelo cereal, a oferta de produtos com maior valor agregado e até novos usos para o grão, como a produção de energia, combustível e ração animal. Esta nova diretriz, no entendimento do engenheiro agrônomo e especialista em agronegócios José Nei Telesca Barbosa, sinaliza não apenas uma postura mais voltada para o mercado, mas também a necessidade de se adotar novas atitudes no agronegócio orizícola diante das mudanças que estão ocorrendo. “Há décadas eu digo que só descascar arroz não é industrializá-lo. É preciso agregar mais valor. E esta é uma matéria-prima de grande potencial para isso”, enfatiza.
Para o economista-chefe da Assessoria Econômica da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Sistema Farsul), Antônio da Luz, o consumo de arroz no país (da forma tradicional como é consumido, do saquinho para a panela) já atingiu seu nível de saciedade, ou seja, os brasileiros não vão consumir mais arroz do que já consomem. “Entretanto, o mercado para produtos derivados de arroz ou pratos prontos à base de arroz, por exemplo, tem um potencial enorme”, observa.
Antônio da Luz explica que, no Brasil, a exemplo de outros países, está havendo uma mudança no perfil consumidor brasileiro, que está mais exigente e, além de qualidade, também quer produtos diferenciados. “Ele compra no supermercado os mesmos pratos tradicionais que consome em casa ou em restaurantes, só que prontos, bastando para isso levá-los ao micro-ondas. A cadeia produtiva tem que acompanhar esta tendência e investir em um novo modelo de consumo. Novos produtos significam atender novos mercados e consumidores com novos perfis. Isto, automaticamente, refletirá em aumento de consumo e de demanda”, exemplifica o economista.
Mas será que as indústrias e engenhos do RS estão preparados para atender as exigências deste novo tipo de consumidor? O engenheiro químico e pesquisador da Fundação de Ciência e Tecnologia (Cientec), Gilberto Wageck Amato, acredita que sim. “Este tipo de demanda pode ser qualificada como ‘inovação vertical’, por acarretar alterações relevantes no status quo vigente. Para isso, os aportes mais exigidos são em tecnologia, não bastando capital”, destaca.
Para Amato, o perfil mais adequado de indústria deve ficar por conta de engenhos que tenham profissionais com qualificação específica. “Exige a ampliação do tipo de profissionais, a exemplo de engenheiro de alimentos e nutricionistas, altamente qualificados. A participação de indústrias que já estão no mercado de pratos preparados e congêneres é bem-vinda, pois elas têm equipamentos e procedimentos, isto é, hardwares e softwares, para serem mais competitivas. Assim, servem de benchmark, de modelo de referência”, define.