Formato tropical

 Formato tropical

Ensaios: desempenho melhor do que as testemunhas

Ajustes no sistema
de irrigação elevam rendimento do arroz
nas várzeas do Tocantins
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 Elevar a produtividade média de grãos entre 5% e 15%, reduzir o consumo de água em até 50% e potencializar o aproveitamento dos fertilizantes em 25% são resultados de dar inveja a qualquer sistema de produção do mundo. E podem ser comemorados por pesquisadores e produtores do Tocantins, terceiro maior estado produtor de arroz, no norte do Brasil, após três anos de ensaios e testes para adequar o regime de irrigação das lavouras. Um mecanismo foi desenvolvido e deve servir de modelo para a evolução da orizicultura no estado.

A orizicultura encontrou um clima propício à expansão nas várzeas tropicais do norte brasileiro, mas o modelo de manejo do cultivo – e até a maior parte das sementes cultivadas – é ainda aquele desenvolvido e praticado no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina, no extremo oposto do país. Este cenário levou o engenheiro agrônomo André Fróes de Borja Reis, doutor em fitotecnia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), da Universidade Federal de São Paulo (USP), a estudar a eficiência do uso da água e a adubação nitrogenada em ambiente de várzea tropical.

O estudo deu origem à sua tese de doutorado. Para Reis, as diferenças de comportamento do solo e das variedades também exigiriam um manejo adequado às características do ambiente e do clima do Tocantins. “Conforme crescia a área plantada no estado aumentava o conflito para o uso da água, o que desafiava os pesquisadores a estudarem o solo e diferentes manejos de irrigação nas planícies do Vale do Rio Araguaia, que costumam ficar alagadas durante as cheias”, explica.

Então ele procurou responder perguntas que sugeriam o rompimento de um paradigma: a inundação contínua dos quadros, conforme o formato sulista, também implementado na Ásia, Estados Unidos e países do Mercosul, era mesmo necessária na condição de várzea tropical? Como um regime alternativo de irrigação, que economizasse água, impactaria a produtividade do arroz? “A pesquisa precisava responder na prática, com a devida fundamentação científica, a estes desafios”, resume.

Se por um lado o manejo tradicional atende à demanda hídrica das plantas e favorece a absorção de nutrientes, por outro exige alto consumo de água. Para propor um sistema alternativo de manejo da irrigação seria necessário, em primeiro lugar, entender a relação solo-água-planta dentro do ambiente tropical e testar o impacto da ausência da lâmina de água permanente na absorção de nutrientes, em especial o nitrogênio, o mais demandado pela cultura arrozeira. Então foi iniciada uma pesquisa que durou três anos em campos experimentais em Lagoa da Confusão, a Capital do Arroz do Norte.

QUESTÃO BÁSICA
A tese de doutorado teve orientação do professor José Laércio Favarin, do departamento de produção vegetal, e foi recentemente defendida no Programa de Pós-Graduação em Fitotecnia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq/USP).

Pesos e medidas

Com o objetivo de esgotar as possibilidades e não deixar dúvida sobre os melhores resultados, André Fróes de Borja Reis adotou cinco regimes diferentes de irrigação nas suas áreas de testes: a lâmina d´água contínua, seguindo o modelo tradicional gaúcho; duas combinações de alternância entre inundação e drenagem em diferentes ciclos; solo saturado (quando todos os seus poros estão preenchidos por água) sem a formação de lâmina sobre a superfície; e solo insaturado com teor de umidade próximo à capacidade de campo, que é a quantidade de água retirada pelo solo após a drenagem ter ocorrido.

Em todos os modelos foram aplicadas doses de nitrogênio (N) para determinar se o regime de irrigação seria capaz de interferir no rendimento médio por área da cultura. “Foi usada ureia enriquecida com o isótopo 15 N (variante do elemento químico) para investigar o destino do nitrogênio proveniente do fertilizante”, pormenoriza o pesquisador.

O estudo conduzido por André Fróes de Borja Reis mostrou que os solos da região de Lagoa da Confusão apresentam características hidráulicas que permitem uma maior movimentação de água e, portanto, as plantas acessam facilmente o líquido necessário às suas funções fisiológicas mesmo em condição insaturada. Assim, estava quebrado o paradigma da várzea inundada. “Na várzea tropical os solos apresentam pronunciada macroporosidade. Tais características permitem condutividade hidráulica maior até 10 mil vezes do que nos solos das regiões tradicionais de cultivo do cereal”, explica o cientista.

O trabalho conclui que, desta forma, fica evidenciada tecnicamente a menor necessidade de aplicação de água por irrigação – o que, por consequência, diminui a perda por lixiviação e evaporação direta da lâmina d’água. “Nas três safras foi economizado até 50% de água ao ano quando comparamos este regime com o manejo tradicional de lâmina contínua”, especifica Reis.

PLUS
Se há economia de água obtida com a adequação do manejo de irrigação das lavouras, o pesquisador conseguiu ampliar os bons resultados: as avaliações de balanço do nitrogênio nas áreas experimentais apresentaram outros aspectos relevantes para o desempenho da cultura. Foi possível avaliar como o regime adotado impacta nos processos de transformação do nutriente. O excesso de água, independentemente do manejo usado, favorece perdas, seja por desnitrificação (eliminação de nitrogênio na forma gasosa por bactérias do solo), seja por lixiviação (espécie de “lavagem” de sais minerais e substâncias presentes no solo).

Mas irrigar com o solo insaturado apresentou-se como o formato mais adequado para a região. “A recuperação do nitrogênio do fertilizante foi 25% maior sob este modelo, o que indica maior eficiência do aproveitamento e relevante queda das perdas desse nutriente”, comemora o engenheiro agrônomo. As perdas de nitrogênio são nocivas ao meio ambiente.

 

Irrigação com o solo insaturado é sistema adequado à região

Mais produtividade
A economia de água sem restringir o crescimento das plantas e a maior recuperação de nitrogênio permitiram que o arroz tivesse melhor desempenho do que as testemunhas. “Nos três anos a produtividade foi de 5% a 15% maior no tratamento com o solo insaturado em comparação ao de lâmina contínua e, ainda, com diminuição da dose de fertilizante”, complementa André Fróes de Borja Reis, doutorando da Esalq/USP. Assim, os resultados demonstraram que é possível repensar o manejo de irrigação de arroz em várzeas tropicais e que a tecnologia de condução da lavoura deve ser desenvolvida com base nos atributos dos solos da região ao invés de incorporar recomendações de outros agroecossistemas.

“A economia de água a partir do regime de irrigação com o solo insaturado permitirá ampliar a área plantada e produzir mais arroz com menos recursos hídricos e fertilizantes e, com isso, reduzir custos. Portanto, pode gerar aumento da rentabilidade da atividade agrícola”, diz Reis. Para ele, também é vocação da pesquisa pública no Brasil estar atenta aos desafios técnicos que a agricultura enfrenta.

 

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