Tabelamento de fretes já mantém mercado de grãos travado por mais de um mês

Com o tabelamento dos fretes, os carregamentos continuam inviáveis em grande parte dos estados produtores.

Os negócios com os grãos seguem travados no Brasil e já entram em sua quinta semana do que os participantes do mercado chamam de ‘paradeira’. A falta de um acordo efetivo sobre a questão do tabelamento dos fretes mantém uma incerteza grande rondando o comércio e todas as pontas da cadeia de comercialização acabam por se manter na defensiva.

Além dessa indefinição no setor dos transportes, um mercado mais fraco na Bolsa de Chicago – em função de uma boa evolução da safra norte-americana e da disputa comercial entre China e Estados Unidos – também contribui para um fluxo mais lento de negócios no caso da soja, como explica o economista e analista de mercado Camilo Motter, da Granoeste Corretora de Cereais.

"Há uma combinação negativa para os negócios: indefinição sobre fretes e, portanto, pouca coisa andando, e mercado mais fraco nos últimos dias – o que afasta vendedores. Resumindo, lentidão nos fretes e fraqueza dos mercados", diz.

Com o tabelamento dos fretes, os carregamentos continuam inviáveis em grande parte dos estados produtores, e em alguns locais as contas não chegam nem a fechar e os resultados acabam por se mostrar negativos. As alternativas têm sido transportadoras menores, que aceitam negociar os valores, ou as empresas que contam com frota própria para fazer os negócios fluirem.

Há grandes volumes de soja e outros produtos que já estão, inclusive, negociados, e não conseguem ser escoados pelos produtores ou cerealistas. Além da preocupação com a efetivação dos contratos e da realização de novos, há ainda uma preocupação com a armazenagem. Segundo números da Céleres Consultoria, já há cerca de 2,3% da área da segunda safra de milho colhida no Brasil.

Os armazéns que deveriam estar sendo esvaziados pelo escoamento da soja neste momento para, na sequência, dar espaço ao milho safrinha – que está em plena colheita – seguem cheios e não há espaço para o cereal. Da mesma forma, transportar os dois produtos e mais os insumos da nova safra de verão também deve ficar mais difícil.

"Por enquanto, estamos carregando com somente 1/4 da capacidade total. Há alguns novos negócios saindo, mas apenas com entrega para agosto", relata Vitor Marasca Junior, diretor da Marasca Incorporações Imobiliárias Comércio e Exportação Ltda.

Para Vlamir Brandalizze, consultor da Brandalizze Consulting, o não acordo sobre a tabela poderia ocasionar ainda um agravamento da crise e, na sequência, um aumento da inflação, o que deixaria a tabela defasada, causando ainda mais problemas.

"Em pouco tempo, a tabela estará defasada e desta forma poderá ser trabalhada a favor dos contratantes de fretes e não dos caminhoneiros. O Brasil já teve inflação forte neste mês de maio e tudo aponta que continuará em junho, porque os combustíveis subiram forte e não recuaram. Isso irá impactar na inflação e, desta forma, para o quadro geral da soja", diz. "Também, já passamos da hora de deixar os fretes livres e o país continuar a trabalhar, principalmente o melhor setor da economia brasileira que está parado", completa.

Em Rio Verde (GO), o diretor da Aprosoja Goiás, Adriano Antônio Barzotto, reforça que nos últimos 30 dias não houveram novos negócios, nem a retirada da soja da safra de verão, já negociada na região.

"Não acompanhamos a retirada da soja para os portos e as indústrias, isso irá acarretar em um problema logístico na colheita do milho safrinha. Uma vez que, muitos produtores irão querer transportar soja e milho ao mesmo tempo e não temos capacidade para isso", explica a liderança.

Por enquanto, os produtores estão iniciando a colheita da segunda safra de milho na região e as primeiras áreas são para o consumo próprio ou cumprimento de contratos feitos mais cedo. "Não há problemas logísticos até o momento, mas a partir do início de julho iremos acompanhar filas nos armazéns e a logística será um gargalo na região, pois não retiramos a soja. Quebrou-se o ciclo de transporte de commodities na nossa região e no Brasil", afirma Barzotto.

Embora os produtores já estejam gastando mais para levar o milho até os armazéns em Rio Verde (GO), as negociações entre agricultores e transportadores têm sido balizadas pela nova tabela de preço mínimo de frete reportada pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). Em torno de 50% da safrinha de milho ainda precisa ser negociada na localidade.

"E diante da recente oscilação do dólar, nós perdemos um bom momento de comercialização do milho. Tivemos algumas negociações pontuais e recentes com valores entre R$ 29,00 a R$ 30,00 a saca do cereal. E, todo esse cenário irá impactar na margem de lucros final do ano agrícola. O produtor deve estar atento para que não tenha prejuízos", diz o diretor da Aprosoja GO.

Cenário semelhante é registrado na localidade de Campos de Júlio, em Mato Grosso. Com 10% da produção de milho safrinha colhida até o momento, o produto tem sido armazenado dentro das propriedades e nos armazéns da região. A comercialização permanece bem lenta e também têm como referência os novos valores da tabela de frete.

"A nova tabela está impactando muito nos preços de retirada dos produtos na região. Os novos valores não dão viabilidade para retirada dos produtos dentro das propriedades. E em torno de 35% a 40% dos contratos de soja feitos em 2017 ainda não foram retirados", pondera o produtor rural da região, Tiago Daniel Comiran.

Com isso, a preocupação é com a estocagem do milho safrinha, já que a colheita tende a ganhar ritmo nos próximos dias. "As empresas não terão condições de retirar esse milho, irão empatar ou registrar prejuízos. Se não tivermos uma solução para o impasse, a partir da próxima semana teremos muitos problemas com a questão da armazenagem e não teremos fretes para a retirada da soja, nem do milho", alerta o produtor rural.

Em alguns pontos do país, a diferença do valor do frete passa de R$ 2,00 a R$ 3,00 por saca – podendo chegar a até R$ 5,00 – após o anúncio da tabela feito pela ANTT (Agência Nacional dos Transportes Terrestres. E nesta segunda-feira, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF) seu parecer sobre o tabelamento com uma constatação de configuração de formação de cartel.

A manifestação do conselho foi um pedido do ministro do STF Luiz Fux. O decano é o relator, nesse momento, das ações judiciais que questionam a constitucionalidade da medida. Na última sexta-feira, a Fazenda também se posicionou contra a medida. Fux exige ainda um novo posicionamento do governo sobre o caso. 

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