Arroz parboilizado e macerado: diferenças e semelhanças
Autoria: GILBERTO WAGECK AMATO
Eng. químico, M.Sc.
Irga – Centro de Excelência do Arroz.
>>> Qual a diferença entre arroz macerado e parboilizado?
>>> O que é malequisado? E amarelão?
Estas são perguntas recorrentes que se arrastam pelas últimas décadas.
E ressurgem no momento atual, quando se discute o novo Regulamento Técnico do Arroz brasileiro.
PROCESSO MALEK: encharcamento em água quente, seguido de gelatinização por vapor em autoclave contínua e secagem em
secador rotativo, com ar quente
1. A origem da palavra parboilizado
A palavra parboilizado tem origem na adaptação do termo inglês parboiled, proveniente da aglutinação de partial + boiled, cuja tradução livre seria vaporizado (parcialmente tratado por vapor).
Já em alguns países existe uma aproximação com a idéia do “parcialmente cozido”, como na Itália (precotto), em Cuba e no Equador (precocido). Porém, nestes e em outros países cresce a predominância da expressão inglesa, como na Alemanha, com o parboiled reis. O termo pré-cozido merece uma análise especial, pelo risco de propaganda enganosa, em função de induzir o consumidor que este arroz terá um tempo de preparo na cozinha mais curto por ter sido “previamente cozido”. Exceto os arrozes de cocção rápida, disponíveis em outros mercados, os arrozes parboilizados presentes no mercado brasileiro costumam tardar cerca de 10% a 20% para cozinhar.
2. A síntese do processo
A parboilização, sinteticamente, pode ser descrita como um tratamento hidrotérmico a que é submetido o arroz em casca, pela ação tão-somente da água e do calor, sem qualquer agente químico.
Destacam-se três operações:
(1) Encharcamento, onde o arroz em casca é colocado em tanques com água quente por algumas horas. As vitaminas e sais minerais – então concentradas na película e no germe – são solubilizados na água que está sendo conduzida para o centro do grão, enriquecendo-o.
(2) Gelatinização do amido, sob temperatura mais elevada, quando vitaminas e sais minerais são fixados. A condução desta etapa é importante para incrementar outros nutrientes, como fibra (incluindo a novidade do amido resistente), proteínas e outros constituintes que habilitam o parboilizado para receber o destaque como alimento funcional (nutra-cêutico).
(3) Secagem, para garantir a boa conservação, seguindo o beneficiamento, através da retirada da casca e do farelo.
3. Processos industriais de parboilização
No Brasil ocorre uma divisão de rotas tecnológicas de parboilização, representadas pelo processo malek (autoclave) e pelo processo estufa. Os dois, basicamente, diferem quanto à gelatinização.
O malek é caracterizado pela uti-lização de vapor saturado, resultando em produto mais homogêneo. Dele surgiu a extinta marca Malekizado.
No processo estufa o arroz recebe calor por superfície de contato, no interior de um cilindro horizontal rotativo que recebe fogo direto oriundo da combustão de casca de arroz.
PROCESSO ESTUFA ANTIGO: encharcamento em água quente, seguido de gelatinização e secagem simultâneas em cilindro rotativo de fogo direto obtido da combustão de casca
Este processo promove simul-taneamente a gelatinização e uma secagem parcial, ao contrário da autoclave, onde o grão entra e sai com a mesma umidade, praticamente.
Muitas definições internacionais de parboilização restringem o uso do termo parboilizado exclusivamente aos processos que utilizam vapor (autoclave, uma espécie de panela de pressão industrial). Esta exclusividade merece ser contestada, não obstante reconhecer-se as vantagens técnicas da utilização do vapor. Experiências com outros meios, como microondas, leito fluidizado, leito de arraste, etc, têm se mostrado como altamente eficazes como forma de gelatinizar o amido.
4. Arroz macerado
O termo continua sendo motivo de controvertidas interpretações em função de sua origem. Inicialmente o termo dizia respeito ao processo estufa, para diferenciar do arroz produzido por autoclave. Resumindo, gelatinizando por autoclave, o arroz era denominado parboilizado; através de estufa, denominava-se macerado.
A legislação brasileira de 1977 definia arroz macerado como o arroz submetido à maceração por imersão em água à temperatura ambiente, originando um produto de coloração amarela, desuniforme. Era conhecido como amarelão. Uma instrução interna do Ministério da Agricultura restringia o termo parboilizado ao uso de autoclave. A inspeção era assim conduzida: tendo autoclave, considerava-se parboilizado; não tendo, os fabricantes eram obrigados a colocar no rótulo de seu produto “arroz macerado”. O macerado, salvo honrosas exceções, era considerado um produto de segunda linha.
Com a entrada em vigor da Portaria nº 269/88, a maceração a frio ficou desamparada. A justificativa, plenamente correta, baseava-se na exclusão em razão da água fria comprometer profundamente as condições de higiene do produto final. Surgiu então uma alternativa, que foi uma excrescência técnica: autorização transitória sustentando a permissão do processo a frio, em face de um mandado de segurança conseguido por praticantes de tal procedimento. Consta que a medida foi sustentada por alguns anos. Em nome da manutenção de poucos empregos, o consumidor foi submetido a riscos de intoxicação crônica, em razão de que o encharcamento com água fria exigia tempos variando de 48 a 72 horas. Como resultado desse equívoco técnico-jurídico, pessoas de mais idade ainda associam, erroneamente, o parboilizado ao “fedido” arroz macerado a frio.
Com a adequação para maceração a quente, o produto passou a ter uma higiene compatível, sendo o processo estufa incluído na denominação de parboilizado, ainda praticado por um número significativo de engenhos, principalmente em Santa Catarina. No Rio Grande do Sul predomina o processo malek. Este, transcorridas quase seis décadas de sua implantação no país, já merecia, por seu contínuo aperfeiçoamento por parte dos engenhos e dos centros de pesquisa, a denominação de processo brasileiro!