A agricultura pós-pandemia, negócio ou segurança alimentar?

Autoria: José Nei Telesca Barbosa, Engenheiro Agrônomo, Advogado e Filósofo.

A pandemia do coronavírus está proporcionando uma reflexão importante sobre a necessidade do seu enfrentamento, dentre outros meios, por condições ideais de higienização, equipamentos de saúde e de nutrição humana. No quesito agricultura, há algum tempo tem-se uma dicotomia no fornecimento de alimentos, em que a principal característica de segurança alimentar foi suplantada ou transformada em agronegócio com seus produtos comoditizados e os preços negociados em bolsas de mercadorias.

Desde que isso ocorreu, a agricultura teve um incremento em todos os seus índices de medição, especialmente quanto à produção e produtividade, como também surgiram muitos negócios noutros setores à montante e à jusante do estabelecimento agrícola em que está situado o agricultor. Nos setores localizados antes da porteira, teve crescimento toda a cadeia de fornecedores de insumos e de máquinas e equipamentos com suas tecnologias altamente especializados.

Nos setores após a porteira teve o surgimento das tradings de comercialização que faz chegar essa produção do estabelecimento agropecuário aos mais diferentes recônditos do mundo. Com toda essa transformação a agricultura na forma de commodity agrícola perdeu o encanto de alimento e foi transformado em negócio com toda a frieza dos cálculos comerciais e financeiros correspondentes. Nessa profunda transformação sofrida pela agricultura, perdeu o produtor por ver aviltado o fruto do seu trabalho e perdeu o consumidor por pagar elevados preços nos hipermercados, entre três a cinco vezes mais.

Com a pandemia do coronavírus parece que é possivel apresentar um questionamento a esse modelo e trazer a discussão para o importante campo de segurança alimentar, em que a necessidade do ser humano bem alimentado e saudável vem em primeiro lugar. Isto mudará a posição até aqui destinada ao agricultor, que passará de uma posição intermediária na cadeia de produção para protagonista na oferta de produtos necessários para a segurança alimentar da população.

Com isso há que se alterar toda a configuração estabelecida até aqui por muitos teóricos no século passado, quando teve início a formulacão das cadeias de produção, agribusiness e agora denominado agronegócio.

Todos os agentes deverão estar dispostos a colocar o estabelecimento rural como o centro da atenção, fomentando a produção e aportando os recursos necessários, sejam na área de crédito, insumos, máquinas e equipamentos! Essa reconfiguração pressupõe um sistema de integração do produtor ao consumidor em que os agentes intermediários sejam facilitadores e co-responsáveis pelo sucesso ou insucesso do empreendimento agropecuário, pparticipando dos riscos e incertezas que hoje ele contém.

O produtor sairá da difícil situação que pode ser chamada de “franco atirador” de um negócio completamente incerto, com muitos riscos, para uma situação que passa a ter compromissos num sistema integrado de produção, em bases pré-estabelecidas.

O sistema proposto poderá trabalhar a organização rural por localidade com aporte de infraestrutura, beneficiameno, agroindustrialização (quando for o caso), assistência técnica e equipamentos culturais e sociais.

Todo o complexo de produção ficará comprometido num sistema de integração rural, com os adiantamentos financeiros e os meios logísticos pré-definidos, até a garantia da segurança alimentar do consumidor, seja ele interno ou externo ao país. Os agentes das representações dos produtores, autoridades governamentais e empresariais participarão da administração e fiscalização do sistema integrado de fomento. Este Conselho irá atribuir as responsabilidades de cada agente e as margens de remuneração do produtor.

A produção destinada ao mercado interno seguirá para o órgão responsável por sua distribuição às populações cadastradas no programa de segurança alimentar.

No caso de produtos destinados à exportação será atribuído o custo do governo brasileiro com o desgaste de estradas, portos, bem como de outros investimentos relacionados com a exploração do produto agrícola ou pecuário considerado. É importane afirmar que os produtores que se acharem capazes de seguir na lógica atual do agronegócio, que o sigam, mas quando tiver dificuldade não invoquem a agricultura no formato atual como sendo essencial para a segurança alimentar. Assim como está, quando o empreendimento dá lucro este fica com o produtor e, quando dá prejuízo, este fica com a população, que paga os preços mais altos.

Já, os fornecedores de insumos e demais empresas não são afetados pelos resultados, pois já receberam o valor dos insumos e maquinários antecipadamente, isto é, nunca perdem. Com esta proposta tem-se a expectativa que o produto agropecuário chegará à mesa do consumidor nacional ou internacional, como um negócio sustentável nos países que demostram preocupação com a saúde da sua população.

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