Ano quente

Preços em alta na colheita
geram expectativa
de renda no ano
comercial 2019/20.

 O mercado brasileiro de arroz dá sinais muito convincentes de que terá preços remuneradores no ano comercial que vai de 1° de março de 2019 até 29 de fevereiro de 2020, período em que será comercializada a safra 2018/19. Firmes desde março, as cotações engataram uma trajetória de alta de 0,7% em março, 8,75% em abril e até 6 de maio já acumulavam 2%, segundo o indicador de preços Esalq/Senar-RS, batendo na casa de R$ 43,83 por saca de 50 quilos em casca (58×10) à vista, ou 11,08 dólares.

A indústria precisou esperar o início da chegada das primeiras cargas para assimilar uma leitura que já era feita pelos arrozeiros: a produtividade foi até 15% inferior na média das colheitas de algumas regiões. A área central gaúcha, por exemplo, chegou a meados de maio em plena operação de colheita e, nestas lavouras, com uma produtividade média inferior a 7 toneladas por hectare.

A quebra de safra no Rio Grande do Sul ocorreu pela redução de área de plantio, causada pelo desestímulo gerado com a falta de renda dos cultivos anteriores e agravada pelos danos provocados pelo fenômeno climático El Niño em janeiro na Fronteira Oeste e na Campanha, que afetaram a produção de 15 mil hectares e atingiram as produtividades da Zona Sul e da Região Central.

Além da queda da oferta nacional e no Mercosul, outros fatores incidem sobre o comportamento dos preços. O principal deles é os baixos estoques, que devem ser ainda menores em fevereiro de 2020, uma vez que a produção brasileira é insuficiente para suprir a demanda anual, as exportações estão mantendo média superior a 140 mil toneladas ao mês em março e abril e as importações têm se mantido relativamente baixas.

O câmbio próximo de R$ 4,00 até 6 de maio favoreceu as vendas internacionais. E o Brasil alcançou avanços nesta área ao consolidar vendas de arroz em casca para a Venezuela, em plena crise, por meio de triangulação de trading chinesa, e de arroz branco de alto padrão para o Iraque e ao fortalecer suas posições nos embarques de quebrados para a África.

FIQUE DE OLHO
O arroz é parte da argumentação do governo federal para a proposta de reforma tributária. De olho na falta de competitividade do Brasil no Mercosul, o governo brasileiro pretende estabelecer medidas importantes. Entre as que estão sendo estudadas está uma alíquota única de tributos estaduais, em especial para a cesta básica, e medidas equalizadoras quando o produto importado gere prejuízos às cadeias produtivas nacionais.

Arrozeiros esperam valorização
O setor produtivo do arroz do Rio Grande do Sul espera comercializar a safra 2018/19 com valorização real, ainda que saiba que nem todos os produtores alcançarão este patamar. Com o avanço dos preços, quem pode segurar a oferta está fazendo, mas quem depende do financiamento por cédula de produto rural (CPR) já não tem a mesma sorte, pois precisa quitar os contratos até maio.

“Trabalhamos com uma expectativa de preços remuneradores mais ao final do ano, mas é importante lembrar que o custo médio de produção foi superior a R$ 48,00 para uma produtividade de 7.500 quilos por hectare, e essa foi a média produtiva do estado inteiro, em algumas regiões até abaixo disso, portanto, teve custo maior”, observa Henrique Osório Dornelles, presidente da Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz). “A média de preços de R$ 43,00 no início de maio não cobre o custo de produção. Em alguns casos, apenas o desembolso. Se por um lado isso já é melhor do que muita gente obteve no ano passado, por outro, ainda está longe do ideal e representa prejuízo para boa parte dos rizicultores”, reconhece.

Ele prossegue recomendando que os agricultores sigam investindo na diversificação com soja e pecuária, onde for possível, para ampliar o portfólio de produtos e as oportunidades de mercado, busquem recursos para financiar a comercialização quando isso compensar e realizem a oferta de maneira gradativa para evitar concentração de oferta e queda nos preços. “Cada produtor define sua estratégia de acordo com sua realidade”.

Para Dornelles, é difícil falar sobre a expectativa de plantio para o ano que vem, mesmo que a tomada de decisão precise acontecer dentro de dois a três meses. “O comportamento do mercado e dos preços ao longo desse período e a expectativa que for criada para o final do ano comercial vão determinar a área plantada, mas sem avanços estruturais na política agrícola, uma solução para o Mercosul e principalmente renda, a tendência é de estabilidade ou até uma queda, exceto se surgir um fato novo muito encorajador”, afirma o dirigente.

Élcio Amarildo Bento, analista da Safras & Mercado, acredita que uma evolução nas cotações, alicerçada na queda da oferta, pode ajudar os arrozeiros a respirarem, mas não recupera sua saúde financeira. “Há um conjunto de fatores que trouxeram até o atual cenário de dificuldades e uma safra com preços melhores, mas ainda abaixo do custo médio de produção, não resolve estes problemas. A necessidade de 60% a 70% das lavouras serem financiadas por cédula de produto rural (CPRs) é o pior dos cenários, com muitos produtores, numa situação definida pelo próprio setor, tendo que ‘vender o almoço para garantir o jantar’”, ressalta.

Bento avalia que reduzir a área e a produção pode até elevar as cotações em curto prazo, mas é uma alternativa muito arriscada na medida em que fortalece o aumento da produção no Mercosul, em especial no Paraguai, que é altamente competitivo no cenário regional. “O que ganhar imediatamente pela redução da oferta se perde mais à frente com o aumento das importações”, complementa.

Não há um ano igual a outro
Para o mercado do arroz, não existe ano de comercialização igual a outro. Ciente dessa realidade, Tiago Sarmento Barata, diretor executivo do Sindicato da Indústria do Arroz do Rio Grande do Sul (Sindarroz-RS), afirma que o período comercial 2019/20 é mais um completamente diferente dos demais. “Estamos verificando que a oferta nesta temporada é menor por causa do desinteresse do arrozeiro em função da descapitalização, inviabilidade econômica de muitas áreas, opção pela soja em busca de liquidez e rentabilidade e quebra causada pelo clima”, afirma. O setor industrial avalia que a safra não deve ficar perto de 7,5 milhões de toneladas no Rio Grande do Sul.

Barata enfatiza que a redução da oferta de grão pressiona as cotações para o alto. A partir de meados de abril, o mercado gaúcho perdeu as referências e se tornou mais emocional do que racional. Como o agricultor dificilmente vende na alta, esperando preços ainda melhores, se retrai. Com a queda da oferta, a indústria fica obrigada a buscar produto. Mas é importante observar que a disponibilidade menor de produto na lavoura é apenas um dos pontos de influência da formação de preços da temporada.

“Ainda é preciso vislumbrar que a demanda também está em queda, e este é um fator que começa a crescer em importância na composição dos preços”, alerta. Segundo ele, muitas indústrias encerraram abril pagando o que precisavam pagar, mas se for mantida a trajetória de alta nos patamares de abril também em maio e junho, gradativamente se alcançará um patamar de cotações em que a indústria seguirá precisando do grão para atender sua demanda, mas não poderá mais pagar porque não remunerará as suas posições por conta da condição competitiva das indústrias de outros estados no abastecimento do consumo em outras regiões, em especial no Sudeste.

Sob este cenário, começa a ter relevância o incremento das exportações. Vender arroz em casca para Venezuela, por exemplo, beneficiado para o Iraque e quebrados para a África trouxeram um sopro de liquidez a um período de comercialização que poderia ser mais complicado. As posições do câmbio ajudaram. “As indústrias e as tradings envolvidas nesta operação são sérias e eficientes e estão empenhadas em fazer com que estas cargas cumpram as exigências e sejam o melhor possível de maneira a garantir mais três ou quatro navios para o Iraque até fevereiro de 2020”, assegura.

Mesmo com as exportações em alta e a valorização dos preços internos, Tiago Sarmento Barata considera que as cotações andam perto de encontrar um ponto de resistência e estabilidade. “Os preços subiram de forma atípica em plena colheita por causa da dificuldade de aquisição da matéria-prima num primeiro momento, mas alguns fatores indicam que o interesse de compra deve diminuir na medida em que passar a inviabilizar o negócio porque os engenhos não conseguirão repassar esse custo para o fardo do beneficiado. “Além disso, a importação passará a balizar o mercado e se tornar mais compensadora”, estima.

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