Arroz de A a Z

 Arroz de A a Z

Gilberto Wageck Amato: paradoxos

Termos técnicos na indústria do arroz no Brasil

Um Paradoxo na Comunicação
O Brasil, em termos comparativos, é visto no exterior por uma característica ímpar: uma unidade linguística, não obstante sua imensidão territorial, permitindo perfeito entendimento entre seus cidadãos.
Porém, essa boa comunicação geral não é encontrada no segmento industrial arrozeiro.

Tem sido identificada uma verdadeira “torre de babel” no uso e entendimento de termos técnicos, causa de desencontros e litígios entre os atores do segmento, gerados por interpretações equivocadas ou imprecisas, tendo como consequências indesejáveis perdas em recursos e tempo.

Apesar da globalização de procedimentos, o engenho, o laboratório e o legislador seguem falando línguas diferentes.

Contexto do arroz nacional
Após décadas de esforços isolados, a cadeia produtiva nacional do arroz se aglutina e posiciona o país no patamar de primeiro não asiático na produção e consumo de arroz, superando, inclusive, o tradicional Japão. Ao aproximar-se da posição de quinta economia do planeta, o Brasil alcança celeremente posição no mercado internacional do arroz, sendo reconhecido externamente pelo potencial quantitativo e, principalmente, pelo crescente aprimoramento na qualidade desejada pelo consumidor, no que é auxiliado pela graça de ser uma expressão máxima do trinômio fotossintético água–solo–sol.

Passado, presente e futuro: Cientec 70 anos
Ao completar sete décadas de atuação junto ao setor produtivo industrial do RS e do país, a Cientec, sucessora do Instituto Tecnológico do Estado do Rio Grande do Sul – Iters, coloca à disposição da sociedade o “Arroz de A a Z”, um glossário de termos técnicos buscado na linguagem do dia a dia da indústria do arroz no Brasil.

A disponibilização em meio digital é a mais adequada à dinâmica dos tempos atuais, habilitada a permitir atualizações constantes e rápidas.

As informações estarão disponíveis no dia em que a fundação completa 70 anos, em 11 de dezembro de 2012.

No ano da criação, em 1942, o Iters já se antecipava à demanda do estado que viria a ser o maior produtor de arroz do Brasil.

A primeira pesquisa na área gerou conhecimento sobre a utilização do farelo do cereal. Assim, atendia à demanda de agregação de valor ao arroz, antecipando-se, através de pesquisas tecnológicas, ao atendimento das vocações e oportunidades locais e nacionais.

Esta primeira pesquisa tecnológica, tratando da produção de álcool a partir do farelo do arroz, foi estratégica, pois a 2ª Guerra se desenrolava e o álcool não conseguia chegar ao sul do país.

Outro caso de pioneirismo na América Latina trata da pesquisa do arroz parboilizado, iniciada na década de 70, estabelecendo novos paradigmas para uma produção, hoje altamente exitosa, levando ao cidadão brasileiro um produto de maior valor nutritivo e pautando a exportação de arroz.

A Cientec contribuiu para levar o conhecimento da academia à atividade produtiva, como na adequação dos engenhos de então, de higiene duvidosa, ao conceito de “fábrica de alimentos”.

O ápice dos trabalhos da Cientec na área do arroz foi com o pioneirismo na pesquisa da latino-americana sobre o parboilizado.

Três livros técnicos já foram publicados no Brasil e seguem sendo produzidos trabalhos hoje inseridos no parque industrial nacional e internacional, a exemplo de processos de parboilização e de geração de energia, com especial atenção a aspectos ambientais. No acréscimo de qualidade, no arroz parboilizado se destacam as parcerias com o Irga, Ufpel, Abiap, Sindarroz e Abiarroz.

Bases do glossário de termos técnicos
O acesso às informações é livre, sendo geradas para instigar interessados à busca de mais conhecimento e de levantar novos questionamentos sobre o significado de termos.

O aspecto de destaque do projeto é o comentário que acompanha cada verbete (exemplificado ao final).

O propósito de comentar os verbetes qualifica e diferencia a atividade.

Dá um caráter mais enciclopédico e menos “dicionaresco” ao “Arroz de A a Z”.
Os comentários permitem resgatar um entendimento diferenciado, como ocorre entre os dois estados maiores produtores do país – RS e SC. Junto à definição do verbete “palha”, comenta-se que, entre os gaúchos, se refere à parte superficial do vegetal remanescente na lavoura após a colheita. Já entre muitos catarinenses (e no Brasil central) pode significar “casca”, o mais importante insumo energético, gerado junto ao engenho (e não no campo).

Outro caso recorrente, bem elementar, ocorre com termos erroneamente usados como sinônimos: “renda” e “rendimento”. Agrega-se a estes verbetes o comentário “renda = 68”, expressa o percentual de massa de arroz obtida após a retirada de 22% de casca e de 10% de farelo.

Já um “rendimento de 58:10” (lê-se “58 por 10”), assim expresso, trata da relação “grãos inteiros:grãos quebrados”, cuja soma equivale à renda.
Estes valores, teóricos, já fizeram parte formal da legislação nacional, servindo ainda para dirimir litígios.

Os dados teóricos citados acima se referem ao arroz do subgrupo beneficiado polido (branco), pois, da mesma matéria-prima, quando submetida à parboilização, espera-se, por exemplo, um rendimento no subgrupo beneficiado parboilizado polido próximo a 68:04 [sic]. Comentando-se este aspecto, encaminha-se importante elucidação de controvérsia entre lavoura-engenho-fiscalização.

Também ocorre uma certa confusão no entendimento nas negociações internas no Mercosul, pois nos demais países membros o entendimento de rendimento corresponde à renda, e não rendimento, como induziria uma tradução mais direta [sic]. Por vezes, falta uma Pedra de Roseta.

Pedra de Roseta – Museu Britânico Fonte: Google/Figuras

Nota: A figura acima mostra a Pedra de Roseta, símbolo do entendimento entre culturas. Trata-se de um fragmento de uma estela do Egito Antigo, de 196 a.C., composto de três parágrafos, de um mesmo texto, que permitiu encontrar o elo perdido entre a forma hieroglífica do egípcio antigo, uma forma do egípcio tardio e o grego antigo.

Os geradores de informações
O estabelecimento de parcerias na área de industrialização do arroz junta sinergicamente conhecimentos da academia e do setor produtivo. Os parceiros são as principais fontes de grupos geradores da informação, com destaque para a Ufpel, pelo seu laboratório de grãos (LG) do departamento de pós-colheita e industrialização de grãos, e para o Irga, pelo seu departamento de sementes e pós-colheita.

A coordenação da CIENTEC se dá em seu Departamento de Alimentos (DEPALI).

Exemplos de Verbetes com seus Conteúdos e Comentários

Nota: As palavras marcadas em azul são links destinados a remeterem a outro verbete de interesse direto.

A
Abaixo do padrão – O arroz que não atende a classificação em tipos (de 1 a 5), segundo a Portaria 269/88. Abrange as formas de apresentação do arroz em casca, beneficiado e fragmentos de grãos.

Comentário: Foi também conhecido pela forma reduzida como “AP”. O conceito está fora de uso, aparecendo nas novas instruções normativas (2007 a 2012) como fora de tipo ou FT. A nova terminologia surgiu em 1997, por ocasião da primeira aproximação do Regulamento Técnico do Arroz do Mercosul.

Abiap –
Associação Brasileira das Indústrias do Arroz Parboilizado – organização fundada em 1986 com o objetivo de favorecer e fortalecer o desenvolvimento da cadeia produtiva do arroz parboilizado no Brasil.

Destacam-se entre suas atividades o incentivo e a divulgação de pesquisas científicas, propagando as vantagens e benefícios do parboilizado à população. Desde sua criação, a Abiap acompanha o crescimento da participação do parboilizado no consumo de arroz no mercado interno, de 5% para 25%. E o produto tem respondido por mais da metade das exportações nacionais de arroz do país, com crescente participação. Site: www.abiap.com.br. Ver Selo Abiap.

Comentário: Teve como sócios fundadores a Exportadora Sul Brasil S/A, Pinhatti Imp. e Exp. Ltda., Suprarroz S/A, Irmãos Valcanaia Ltda., Arrozeira Vencato Ltda., Reinaldo Roesch S/A, Arrozeira Camaquense Ltda., Agricape S/A Prod.Alim., Nelson Wendt & Cia Ltda., Emilio Romani S/A, Éffen Prod. Alim. Inc. Ltda., José Berta e Alfredo A. Treichel & Cia Ltda. Um dos idealizadores, Alfredo Albino Treichel, exerceu a presidência até 2011.

Água, água de processo– Usada em processos hidrotérmicos industriais cujas características de potabilidade se encontram definidas em legislação específica quanto aos aspectos de sanidade, metais pesados, resíduos e contaminantes (IN 06/2009, versão 2012).

Comentário: O principal uso de água no processamento industrial do arroz encontra-se na parboilização. A tolerância de contaminantes no efluente líquido do processo varia de acordo com as legislações ambientais, onde são levadas em consideração aspectos como a localização da indústria e características do corpo receptor.

Agulhinha, arroz agulhinha – Classe de arroz que na legislação brasileira corresponde à classe longo fino.
Comentário: Denominação informal utilizada no comércio para o arroz caracterizado por ser longo e delgado.

Arroz agulhinha
Fonte: Camila MiottoDalloglio – designer gráfica

Amarelo, grão amarelo – Grão descascado e polido, inteiro ou quebrado, que apresentar coloração amarela no todo ou em parte, variando de amarelo claro ao amarelo escuro, e que contrasta com a amostra de trabalho (IN 06/2009, versão 2012). O grão amarelo encontrado na mistura de arroz polido e parboilizado é proveniente do subgrupo beneficiado polido (IN 06/2009, versão 2012).

Comentário: Quanto à coloração, na Port. 269/88 nada constava sobre tonalidades. Este critério surgiu a partir da Port. 01/1989, onde consta: “…que apresentar coloração variando de amarelo claro (pálido) ao amarelo escuro…”.

Autoclave – Equipamento utilizado na parboilização, equivalente a uma panela de pressão industrial. Comentário: Segundo o processo, opera contínuo (ex.: Processo Malek Brasileiro), por batelada (ex.: Processo Gariboldi) ou semicontínuo (ex.: Processo Schule).

B
Bulgur– Produto resultante de um tratamento hidrotérmico sobre o trigo durum integral destinado a pratos típicos do Oriente Médio. Constitui-se em ingrediente para o preparo de quibe e tabule. Faz parte das cozinhas da Turquia, da Armênia e da Síria.
Comentário: Como é submetido às mesmas operações unitárias básicas da parboilização – encharcamento, gelatinização e secagem –, pode ser considerado um “trigo parboilizado”.

C
“Carmen Miranda” – Nome como são conhecidas vulgarmente as sarandas que classificam o arroz em casca, segundo suas dimensões.
Comentário: Mais recentemente conhecida como “Carla Perez”. O nome é atribuído em função do movimento (“rebolado”) apresentado pelas artistas.
“Carla Perez” – Ver sarandas e “Carmen Miranda”.

F
Farelo – Fração do beneficiamento do arroz obtida do polimento das camadas externas do grão integral, após o descascamento.
Comentário: A principal fração origina-se da película externa (marrom, geralmente), do gérmen e de parte do endosperma amiláceo. É importante fonte de vitaminas do complexo B e minerais. No caso do farelo do arroz parboilizado, a maior parte do gérmen fica emplastada do grão.

Federação do Arroz dos EUA,USA Rice Federation – Grupo de empresas norte-americanas composto por produtores rurais, engenhos e empresas afins.
Comentário: Tem realizado com sucesso programas promovendo o aumento de consumo e o uso alternativo do arroz naquele país e no mundo.

L
Longo, arroz longo – É o produto que contém, no mínimo, 80% do peso dos grãos inteiros medindo 6,00 milímetros ou mais no comprimento após o polimento dos grãos (IN 06/2009, versão 2012).
Comentário: Em países de língua espanhola, costuma ser considerado longo o arroz que simplesmente supera os 6 milímetros de comprimento. Já a legislação norte-americana, além da referência aumentar para 7 milímetros, define que o comprimento deve ter pelo menos cinco vezes a largura. É popularmente conhecido como agulha.

Longo fino, arroz longo fino – Classe do produto que contém, no mínimo, 80% do peso dos grãos inteiros medindo 6,00 milímetros ou mais no comprimento, 1,90 milímetros, no máximo, na espessura e cuja relação comprimento/largura seja superior a 2,75 após o polimento dos grãos (IN 06/2009, versão 2012).
Comentário: A espessura do grão de 1,85 milímetros da Portaria 269/88 passou para 1,90 milímetros a partir da Portaria 01/89. É popularmente conhecido como agulhinha.

M
Malekizado – Marca pioneira do Brasil (1952) em arroz parboilizado com gelatinização através do uso de vapor.
Comentário: Começou a ser produzido pela empresa Integral Arroz, no município de Eldorado do Sul (RS), em área que então pertencia a Guaíba. Obtido pela utilização do Processo Malek, originário da Inglaterra.

P
Pipoca, arroz pipoca – Ver popcorn rice.

Popcorn rice – Arroz pipoca, assim denominado um arroz de grãos longos, cultivado na Louisiana, Estados Unidos, resultante do cruzamento entre arroz aromático Basmati com variedades convencionais. Seu sabor lembra pipoca preparada na manteiga, mas o atributo aroma é mais marcante que o sabor.
Comentário: Em Santa Catarina, a denominação arroz pipoca é atribuída às cultivares que, quando parboilizadas pelo Processo Estufa, expandem-se tal como pipoca.

Q
Quirera – Fragmento de arroz que vazar na peneira de furos circulares de 1,60 milímetros de diâmetro (IN 06/2009, versão 2012).
Comentário: Também conhecida por quirela, uma variante do termo aceita pelo uso.

Quireras
Fonte: Ricebrasil

X
XM – Processo de extração de óleo do arroz a partir do arroz integral, ao invés do uso do farelo.
Comentário: Processo abandonado há décadas, por recomendação da FAO. É questionado em função da dificuldade de remoção total do solvente (n-hexana) do grão após a extração.

Gilberto Wageck Amato
Eng. Quím., M. Sc., Pesquisador
do DEPALI/CIENTEC

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