As baixas temperaturas preocupam para o arroz semeado bem mais cedo

 As baixas temperaturas preocupam para o arroz semeado bem mais cedo

Munhoz: ideal é não plantar antes de 20, 21 de setembro e, nessa época, evitar ciclos precoces

Expectativa de bons preços na pré-colheita levaram muitos produtores a antecipar o plantio e o frio das madrugadas preocupa na microsporogênese do arroz.

A entrada do verão 2020/21, nesta segunda-feira, às 7h02min, chegou com grande preocupação para uma boa parte dos arrozeiros que anteciparam o plantio desta temporada com a esperança de colher e vender para aproveitar preços mais altos no período de pré-colheita (entre janeiro e fevereiro de 2021). Isto porque as madrugadas têm apresentado temperaturas abaixo dos 15 graus.

Em algumas regiões do Uruguai, na Campanha gaúcha, na Zona Sul e Fronteira Oeste, os termômetros chegaram a registrar 11 graus na madrugada de hoje, terça-feira (22). As baixas temperaturas podem causar aborto e quebra produtiva nas lavouras que têm plantas entrando no ciclo reprodutivo, caso daquelas cujo cultivo foi antecipado.

Em teoria, o frio na microsporogênese pode causar esterilidade das espiguetas e a inviabilidade do grão de pólen que está se formando, portanto, afetar a produtividade e a produção esperada. É uma fase crítica para o arroz irrigado e as baixas temperaturas podem ser prejudiciais e provocar efeitos de grãos chochos ou vazios.

Apesar da preocupação de muitos rizicultores, os cientistas e assistentes técnicos de grandes lavouras não acreditam em grande efeito do clima. “A teoria e a prática, neste caso específico, estão um pouco dissociadas. Mais importante do que a temperatura alcançada é a durabilidade deste frio, e estes 12, 13, 14 graus têm se resumido a duas, três horas por madrugada. Como durante o dia muitas vezes a temperatura chega a 29, 30 graus, dentro da água, à noite, deve estar dois, três, graus mais quente do que no ambiente externo, o eu reduz o risco de danos”, explica Rodrigo Schoenfeld, consultor eu já foi gerente da Divisão de Pesquisa do Irga.

Schoenfeld encontra consonância na opinião do também engenheiro agrônomo Eduardo Munhoz, diretor de uma das mais importantes empresas de consultoria agronômica em arroz e soja no Sul gaúcho, a Porteira Adentro. Segundo Munhoz, em Pelotas (RS) a mínima foi de 14 graus na madrugada desta terça-feira, o que na água deve ter ficado acima. “Depende muito do tempo de frio, e no caso não acredito em problemas por esse motivo”, assegurou.

Munhoz enfatiza que dezembro costuma ter média de sete noites mais frias, contra cinco de fevereiro. “Analisando o histórico por decênio, em geral estas noites em que as temperaturas são mais baixas ocorrem até 20, 21 de dezembro, que é exatamente o fim da primavera”, observa.

Para Rodrigo Schoenfeld, uma recomendação recorrente para casos mais graves, como frio em janeiro e fevereiro, que pega uma gama maior de lavouras em fase reprodutiva, é elevar a lâmina de água. “Mas, isso num ano normal, pois nessa temporada está faltando água até para o básico”, explica. Eduardo Munhoz agrega que esta é uma prática muito usada porque a água tem poder termorregulador e ajuda a reduzir os riscos. “Manter a água um pouquinho mais alta pode ajudar, mas numa condição mais favorável de disponibilidade”, avalia.

Schoenfeld entende que uma ferramenta importante para escapar dos problemas com a oscilação e as baixas temperaturas é a escolha das variedades. “Hoje, temos duas que se destacam. A Memby Porã, da BASF, e a IRGA 424 RI, do Irga. Esta última, que deve predominar em área no Estado nesta temporada, fica 20 dias botando cacho e outros 20 dias florescendo, então se ocorrer algum problema num perfilho, sobram mais 16, 17 para produzir”, esclarece.

Munhoz lembra que a cultivar IRGA 424RI, a que deve ser utilizada na maior área, foi desenvolvida em Santa Vitória do Palmar, no extremo Sul do Estado, e até por isso é muito tolerante às baixas temperaturas.

Para Schoenfeld, outras ferramentas importantes são escalonar a semeadura – dentro da época recomendada – e dois a três ciclos em plantio. “Problema é se pega uma semana ou duas de frio que coincide com variedades que largam cachos e florescem em poucos dias, como o Irga 431, Puitá CL, Guri CL e Olimar”, acrescenta.

Eduardo Munhoz cita três recomendações que são importantes para evitar problemas como o impacto do frio na fase de florescimento das plantas arrozeiras: “A primeira é não plantar muito cedo para não ter arroz na microsporogênese em dezembro. Para isso, recomendamos não plantar antes de 21, 22 de setembro e, a quem semear neste período, indicamos que evite variedades de ciclo precoce e opte por cultivares como IRGA 424RI,  IRGA 431CL, BRS Pampeira CL”, enfatiza.

Ainda para Munhoz, mesmo que alguns produtores tenham optado por um plantio “de inverno”, com vistas a obter melhores cotações com colheita no cedo, tecnicamente não é recomendada essa semeadura. “Prefiro que nossos assistidos não tenham arroz com flor ou emborrachado no ano, porque o melhor mês para isso é janeiro e os estudos e as últimas temporadas ratificam isso" , resume.

A terceira, apesar da baixa disponibilidade, é manter a lâmina de água mais alta, mas apenas se a condição dos mananciais for favorável. Para ele, até o momento, mesmo com as limitações de água em algumas lavouras, o desenvolvimento da safra arrozeira gaúcha está dentro da normalidade e o frio nas últimas madrugadas ainda tem pouco ou nenhum efeito sobre a produtividade. "Não pode é seguir assim por muitos dias", alerta.

CICLO

A doutora em Agrometeorologia Jossana Cera, consultora do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), esteve revisando experimentos bioclimáticos na manhã desta terça-feira, na Estação Experimental do Arroz em Cachoeirinha, RS. Conforme avaliou, há registros de mínimas de 9,4 em Quaraí e 9,6 graus em Santa Vitória do Palmar na madrugada desta terça. "Foi o segundo dia que registrou temperaturas mais baixas, mas não há relatos de danos nas lavouras, embora exista a preocupação se o clima continuar por mais dias neste padrão e pegar alguma lavoura nesta fase delicada da microsporogênese", revela.

De acordo com a especialista, a literatura técnica fala em três dias de ocorrência de danos como queda do peso do grão. "Vale lembrar que na temporada passada tivemos altíssima produtividade e também ocorreu frio em dezembro, ainda que em geral as lavouras tenham sido plantadas mais tarde do que na temporada atual, em especial na Zona Sul".

O prognóstico climático para o trimestre janeiro, fevereiro e março, divulgado hoje pelo Irga, indica uma anomalia positiva de temperatura. "Mas, se a gente olhar os dados de novembro, vamos perceber que apesar de um prognóstico similar neste sentido, houve oscilação. É característico do fenômeno La Niña. A previsão é de janeiro com chuvas mais regulares. Isso quer dizer que podem ocorrer entradas de frentes frias, como do último final de semana, que vão provocar temperaturas noturnas mais baixas ao longo do mês".

Jossana Cera reforçou que há um fator que ameniza o risco de danos, que é a capacidade termorreguladora da água, que cria um microclima ao redor das plantas."Tanto que a recomendação é elevar a lâmina de água nestas circunstâncias, o que no momento não está sendo indicado porque estamos em uma temporada com uma estiagem preocupante em muitas regiões".

Mesmo que sem prejuízos maiores, uma característica do frio ao qual as lavouras de arroz, em especial da Zona Sul, não vão escapar é o atraso no ciclo de desenvolvimento. "Alguns produtores que semearam em setembro já tem comentado que a lavoura deve desenvolver um pouco mais lentamente do que o previsto no plantio", anunciou. Mas, nada preocupante. Apenas alguns dias.

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