CONTRIBUIÇÃO À SOCIOECONOMIA DA LAVOURA DE ARROZ IRRIGADO

Autoria: José Nei Telesca Barbosa – Engenheiro Agrônomo CREA/RS 24.886 – Advogado OAB/RS 48.631 – Especialista em Agronegócios MBA-UFRGS/UFPel.

I – INTRODUÇÃO:

O arroz é uma das mais importantes culturas produzidas no Brasil. Sua contribuição na produção nacional de grãos varia de 15 a 20%. Cultivado praticamente em todo o País e tendo o seu consumo difundido em todas as classes sociais, ocupa posição de destaque do ponto de vista econômico e social, sendo responsável por suprir a dieta básica da população com um considerável aporte de calorias, proteínas e sais minerais.

Considerado um dos alimentos com melhor balanceamento nutricional, que fornece 20% da energia e 15 % da proteína per capita necessárias ao homem, o arroz é uma cultura extremamente versátil, que se adapta a diferentes condições de solo e clima, sendo considerado a espécie de maior potencial de aumento de produção para o combate da fome do mundo. (1)

II – ÁREA PLANTADA, PRODUÇÃO, PRODUTIVIDADE E CONSUMO NO BRASIL:

A Região Sul é a principal produtora, com o total de 72,95%, seguida do Nordeste, com 9,58%, Norte, com 8,31%, Centro-oeste, com 8,05%, e, finalmente, a Sudeste, com 1,10%.

Nessa distribuição é importante atentar para o fato que há grandes diferenças na produtividade média regional, com a Região Sul produzindo a média de 7.410 quilos por hectare, onde predomina o arroz longo fino irrigado, vindo a seguir o Centro-oeste, com 3.132 quilos por hectare, Região Norte, com 2.757, Sudeste, com 2.632, e Nordeste, com 2.028 quilos. Nessas regiões há a predominância do arroz longo fino produzido em sistemas de sequeiro, mas é encontrado também arroz longo e longo fino irrigado. (2)

Há que se ressaltar que, na última década, houve uma melhoria significativa na produtividade do arroz no Brasil, passando da média de 3.197 quilos por hectare para 4.824 quilos, ganho de 50,80%. O Rio Grande do Sul, por ser o maior produtor brasileiro, foi responsável por esse desempenho, pois no período sua produtividade passou de 5.520 para 7.600 quilos por hectare, ganho de 37,68%. (2)

Os dados sobre a área cultivada no Brasil mostram que esta teve um decréscimo no período e passou de 3.151.600 hectares para 2.858.100 hectares, com uma redução de 9,3%. No entanto, o Rio Grande do Sul, que é o maior estado produtor de arroz, passou de 962.050 hectares para 1.176.597 hectares ou 22,3% de aumento na área plantada.

A produção nesse período saltou de 11,076 milhões de toneladas para 13,613 milhões de toneladas, ao passo que o consumo estabeleceu-se entre 12,00 milhões e 12,800 milhões de toneladas, resultando em um estoque final que não baixou de 1,685 milhões de toneladas nos últimos dez anos.

 

 

III – OS PROBLEMAS E AS ALTERNATIVAS:

 Diante desses dados promissores, as perguntas que devem ser feitas são: “Onde estão os principais entraves para que o cultivo do arroz no Brasil seja um negócio lucrativo para o produtor e seja demandado pelo consumidor a um preço justo e de forma suficiente?” E ainda: – Quais as alternativas que se apresentam?

1. Queda no consumo de arroz:

Tendo como fonte os dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF): “Aquisição alimentar domiciliar per capita – Brasil e Grandes Regiões”, publicado pelo IBGE – que avalia as quantidades de alimentos adquiridos pelas famílias brasileiras para consumo domiciliar, numa comparação entre os anos 2008-2009 e 2002-2003, aponta uma queda no consumo médio per capita de arroz polido de 24,6 kg para 14,6kg ou uma redução de 40,5%. Redução deste porte ou de 45,6% já havia sido apontada em estudo da Profª. Semíramis M.A. Domene da PUC-Campinas tendo como base a comparação das POF(6-8), num intervalo de 28 anos (entre 1974 e 2002).

Interessante é que a informação do livro produzido pela Associação dos Engenheiros Agrônomos de Pelotas “Perspectivas e Alternativas da Agropecuária e Agroindústria do Município de Pelotas, 1986, em sua página 234, estima um consumo per capita de “42 kg de arroz beneficiado, nos anos de preços altos e em 47,5 kg, nos anos de preços baixos”. Os dados obtidos junto a essa fonte consubstanciam a elevada queda em percentual apontada nas pesquisas do POF/IBGE.

Tamanha redução no consumo somada ao acréscimo de produção e produtividade resultou em um excedente de produção e um conseqüente aviltamento dos preços recebidos pelos agricultores.

2. Séries históricas de prejuízos e custos elevados:

 Segundo o trabalho realizado pelo Instituto Técnico de Pesquisa e Assessoria (Itepa), da Universidade Católica de Pelotas, estudando a produção de arroz em 28 municípios da Região Sul, na década de 1991 a 2000, concluiu que o produtor de arroz trabalhou no vermelho nestes anos. O estudo coordenado pelo economista Erli Massaú indica a descapitalização continuada na lavoura e mesmo que haja distorções nos números, o prejuízo foi elevado. Segundo o professor Massaú, após colhido, limpo e ensacado, o valor de produção do cereal aumenta em 83,9% e reduz substancialmente o prejuízo. “A atividade de produzir arroz e vende-lo ensacado foi extremamente deficitário, apenas as fases de comercialização e industrialização fizeram que o cereal fosse mais lucrativo”.

 

Noutro estudo publicado pela Revista Planeta Arroz  Edição 39, de agosto de 2011, que tem como fonte a Conab e Emater referente aos anos de 2003 a 2011, assinalam que neste período que soma nove anos em 06 deles 03 resultaram em prejuízo para o produtor.

De acordo com a capa da mesma revista especializada em arroz, citando estudo elaborado pela Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul – FARSUL a baixa competitividade internacional deve-se ao impacto da carga tributária sobre os custos de produção e não parâmetros econômicos, tais quais demanda, produtividade, eficiência dentro da propriedade etc. “Enquanto um produtor gaúcho gasta 2.200 dólares para produzir um hectare de arroz, a média dos produtores argentinos, paraguaios e uruguaios é de apenas 1.392 dólares e dos arrozeiros norte-americanos é de 1.300”, aponta o estudo”.    

              Podemos dizer que a afirmativa é parcial e não entra no mérito dos custos internos da lavoura e, ao mesmo tempo não questiona outros fatores que levam ao elevado preço dos maquinários, equipamentos e demais insumos agropecuários, quando comparados “vis a vis” aos praticados no mercado agropecuário nacional.  Há uma corrente forte de autores que atribui estes custos a elevada margem de lucro praticada no mercado interno, que fazem com que os produtos importados representem apenas 40% do mesmo produto vendido no Brasil (O Mito dos Preços Altos, Roberto Brizola –22/07/2002 e artigo de capa da Revista VEJA edição 2226 de 20.07.2011, A Preço de Banana?).

Na mesma direção do alto custo do saco de arroz produzido quando comparado com o preço médio de venda, em um estudo que tem como fonte o IRGA e que foi apresentado pela Federação dos Arrozeiros do Rio Grande do Sul – Federarroz,  mostra que computado o período de 1990 a 2010, em 67% dos anos resultou em prejuízo para o produtor. Isto é, em 21 anos, 14 deram resultado negativo. 

3. A antiguidade dos problemas:

A celeuma sobre as dificuldades da lavoura de arroz é um tema recorrente, antigo e se trata de um problema estrutural que vem sendo combatido com soluções paliativas, em especial por soluções de crédito e de políticas públicas de apoio ao setor.  Tais medidas são insuficientes, pois não interferem nos pontos que realmente estão ao alcance dos produtores e de suas lideranças a resolução destes problemas.  O Correio do Povo do RS do dia 07.04.2001 informa que, “há 35 anos, neste mesmo dia foi divulgado o manifesto do Congresso dos Orizicultores do Rio Grande do Sul com forte ataque ao Ministro do Planejamento Roberto Campos. O preço fixado para o produto era inferior ao da safra anterior”. A Coluna de Zero Hora RS, “ZH há 30 anos atrás” de 1º/02/2008 tem o título:-Produtores querem aumento – Com a elevação do custo de produção de arroz no Rio Grande do Sul, os produtores necessitam de um aumento de 50,6% no valor mínimo do produto, fixado em Cr$128,60. O pedido de reajuste será encaminhado ao governo federal. Novamente, na coluna ZH Há 30 anos atrás, de 16.06.2011, está a notícia: – Arrozeiros buscam ajuda em Brasília. “Acompanhados do secretário estadual da Agricultura, Balthazar de Bem e Canto, arrozeiros gaúchos partem hoje para Brasília. Eles debaterão com os Ministros da Agricultura e do Planejamento, Amaury Stábile e Delfim Netto, respectivamente. Os produtores vão pedir que o preço da saca de 50 kg de arroz suba de Cr$840 para Cr$ 992.

4.  Os principais problemas da lavoura orizícola:

A) ARRENDAMENTO:  De acordo com o Censo da Lavoura de Arroz Irrigado no Rio Grande do Sul – Safra 2004-2005, 35,5% dos agricultores são proprietários das áreas de cultivo e 64,5% são arrendatários de um dos fatores de produção, terra ou água. Dentre os plantadores 60,3% são arrendatários da terra de cultivo e 39,7% pagam arrendamento pela água usada na irrigação da lavoura. Com base nestes índices pode-se inferir que os 39,7% dos agricultores pagam o arrendamento sobre os fatores terra e água.  O censo referido não aponta o valor médio pago pelos produtores pela terra e água cultivada sob arrendamento ou “parceria”. No entanto, consultando os agentes  de assistência técnica das diferentes regiões arrozeiras do RS, pode-se afirmar que na Zona Sul do Rio Grande do Sul este valor varia entre 25% e 28%, no Litoral Norte é 32% e na Fronteira Oeste alcança 30%.

O pagamento deste montante pela utilização da terra e água se dá sem nenhuma contrapartida em insumos ou serviços pelo proprietário, fazendo com que ao valor pago ainda tenha que ser atribuído um valor de no mínimo 70% a mais como custo de produção da quantidade de arroz a ser pago.

Atribuindo-se um custo médio de 25% pelo arrendamento da terra e água de irrigação, isto significa que de 140 sacos por hectare colhidos em um primeiro momento, é repassado ao proprietário da terra e da água 35 sacos por hectare.  No entanto, como o negócio é feito sem nenhuma participação do proprietário nos insumos e serviços, pode-se afirmar que juntamente com os 35 sacos por hectare estão indo juntos outros 24,5 sacos por hectare ou 70% a mais na forma de custo para produzi-los, visto que o proprietário não participou com mais nada, além da terra e da água de irrigação. Poderiam ser acrescidos outros custos ao produto entregue como pagamento, pois o mesmo se dá na modalidade seco e limpo e depositado em armazém previamente estipulado.

Além do custo do produto entregue ao proprietário, há casos em que os arrendatários ainda são onerados com serviços de plantio de forrageiras nas restevas, edificação de cercas ou locação de outras áreas para o apascentamento  dos animais do proprietário. Deve-se ainda considerar que o arrendamento se dá apenas por um ciclo da lavoura de arroz, devendo a área ser devolvida ao proprietário, o que impede ao arrendatário preparar o solo na época mais apropriada, construir sede no local e ter outras atividades caso houvesse a utilização da área em tempo integral como prevê o Estatuto da Terra.

A problemática do arrendamento das áreas para o plantio do arroz inviabiliza economicamente o arrendatário, tendo o fato sido objeto de análise na Comissão Setorial do Arroz do RS, tendo sido anotado na Ata de 19.04.2011, nas linhas 102 a 110, a seguinte afirmação: “Com relação ao arrendamento, aspecto que foi abordado na primeira reunião, na segunda não foi tratado, não consta nesse estudo e foi mencionado pelo secretário. Hoje o sistema de arrendamento foi modificado, visto que quarenta por cento dos produtores que pagam vinte e cinco por cento, pela terra e água, já saem, por ocasião do plantio, sabendo que vão chegar ¨no vermelho¨ na colheita e comercialização. Então talvez este seja o principal problema da lavoura de arroz, hoje. E como o arrendamento é um sistema de safra, não é porteira fechada, impede todos esses usos alternativos da área de arroz para outros cultivos e outras criações. Tem que constar na Comissão”.

O presidente da Federação das Cooperativas de Arroz do Rio Grande do Sul -FEARROZ e da Associação Brasileira da Indústria de Arroz – ABIARROZ e coordenador por oito anos da Câmara Setorial Nacional do Arroz, em entrevista a Revista Planeta Arroz, Edição 39, quando perguntado “Que pontos trabalham contra a lavoura? Respondeu: – Creio que um dos principais seja o elevado custo de produção. O problema é que um alto percentual de produtores não tem como controlar alguns itens desse custo.  Não posso conceber como viável um negócio que retire da renda bruta parcela que comprometa de 25 a 30%, caso da maioria dos 65% de produtores que são arrendatários. O problema não é exatamente o percentual, o problema é que este percentual extrapola os itens terra e água e passa a incidir sobre o incremento da produção resultante da tecnologia adquirida pelo produtor e sua capacidade gerencial. A lavoura de arroz é uma lavoura cara e exige alta tecnologia, e o produtor/arrendatário termina deixando incidir aquele percentual sobre a parte da produção que é resultante da sua gestão e da tecnologia aplicada, nada tendo a ver diretamente com a capacidade produtiva da terra ou do insumo água. Outros itens problemáticos são tributação, logística, armazenamento, comercialização e tecnologia. Investimento em tecnologia precisa ser feito de modo criterioso, só aplicando-a em condições ideais, em áreas que proporcionem retorno suficiente para pagá-la e permitir sobra. Também é importante o controle rigoroso de gastos dos recursos auferidos nos raros anos em que se conjugam boa safra e bons preços. Há muito a ser feito pelos produtores, e muito que independe da sua atuação.

B) MONOCULTURA –  A lavoura de arroz na maioria dos estabelecimentos é a única fonte de renda do orizicultor. Embora seja uma lavoura com baixa taxa de risco de frustração na produção, apresenta alta taxa de risco da ocorrência de frustração no preço, especialmente para aqueles produtores que tão logo colhem a produção, necessitam vendê-la para fazer caixa, pois, normalmente na safra os preços tendem a ficarem deprimidos em função da maior oferta.

O Grupo de Trabalho 1 da Comissão Setorial do Arroz do RS no item justificativas do item 2 dos  “Encaminhamentos” diz que: – “Os solos de várzea da região produtora de arroz da Zona Sul em cerca de 1/3 da sua extensão apresentam amplas possibilidades de plantio com soja com plena expectativa de sucesso, já amparados pelo Zoneamento Agrícola e com tecnologia conhecida; há necessidade de fomento ao aproveitamento da facilidade de irrigação das áreas de várzeas para outros cultivos ou pastagens”.

Neste item pode ser acrescida, além da alternativa do uso das várzeas, a diversificação do uso do arroz como em ração animal diretamente no cocho ou na mistura com outros produtos ou com outros suplementos. Nesse caso, o produtor teria um maior controle da oferta, transformaria o grão em um produto mais nobre, que é a carne mais valorizada, evitaria os descontos sobre a parcela da produção que tem menor qualidade de engenho, somente oferecendo ao mercado grãos de maior qualidade.

C) ALTO VALOR IMOBILIZADO: É muito grande os investimentos existentes em máquinas e equipamentos (tratores, colheitadeiras, semeadeiras, silos, secadores), em especial pelo  alto grau de individualismo e conseqüentemente o baixo nível de organização existente entre os produtores. A dificuldade de implantação de modelos associativos acaba gerando um custo elevado de carregamento do custo financeiro do imobilizado, além do que praticamente todo o investimento está voltado para a produção e quase nada para a agregação de valor. No que tange aos maquinários a publicação da AEAPEL (3), mencionava que em 1986  “a relação CV/ha é de 2,6, mostrando que o setor está bem”. Este índice reflete o nível alto de investimento em maquinario bem acima do recomendado de um KW/ha.

D) BENEFICIAMENTO E COMERCIALIZAÇÃO: A comercialização tem sido um dos pontos de estrangulamento da atividade, eis que após um período dedicado as atividades internas da lavoura, o produtor vê-se diante da necessidade de buscar a melhor comercialização para o seu produto. Como não há nenhuma preparação anterior e nenhum mecanismo de formação antecipada de preço, a maior parcela dos produtores sem outra alternativa de comercialização é presa fácil dos engenhos, que há mais de 40 anos trabalham na sistemática de adquirir a matéria-prima, descascar, embalar e repassá-la aos supermercados.

Com o passar dos anos e sempre ocorrendo o mesmo modelo de comercialização, os engenhos passaram a estruturar-se para receber a produção.  Ampliaram os seus agentes de compra e suas capacidades de armazenagem fazendo com que cessassem os efeitos que eram normais da variação dos preços da safra para a entressafra, comuns em épocas anteriores. Dessa forma, mesmo os produtores mais capitalizados e com armazenagem própria não conseguem mais se beneficiar da vantagem competitiva que possuíam em relação aos menos capitalizados que entregam a depósito nos engenhos.

Os engenhos, por sua vez, acomodaram-se em ter a sua renda no momento da aquisição do arroz do produtor, não se preocupando em transformar o produto e ter a maior fatia do seu ganho sobre o consumidor. Como já temos publicado, o engenho não tem procurado investir em inovação, buscando transformar-se em uma indústria de alimentos aos moldes da cadeia do frango, que produz já mais de cem diferentes produtos.

A falta de inovação que se reflete em um produto final comercializado ainda na mesma embalagem de 40 anos passados, apresenta a dificuldade de obter renda diante de um consumidor mais capitalizado, com ânimo em investir em produtos mais sofisticados e que tragam maior satisfação, saúde e comodidade. Algumas empresas transnacionais de alimentos, já estão produzindo farinhas enriquecidas, cereais matinais, barras de cereais e bebidas “lácteas”, tudo que tem como principal veículo o arroz.

5) Alternativas para a geração de receita para a cadeia do arroz;

A geração de renda para todas as partes envolvidas na cadeia do arroz passa por modificações importantes nos intervenientes do processo. O avanço tecnológico ocorrido nos últimos anos tem chegado às lavouras apenas pelo avanço extraordinário da produção e produtividade destas e nos engenhos pelo aprimoramento do produto, mas ainda apenas para a “hora do almoço”. Também outras adequações aos “novos tempos” devem chegar as relações contratuais da terra, ao mercado e consumo, como se pode ver abaixo:

a)Arrendamento: Nos aspectos inerentes ao produtor devem ser renegociados os contratos agrários, propiciando o estabelecimento de parcerias efetivas com os proprietários das terras em que haja à divisão do resultado final do negócio, sendo ele positivo ou negativo como prevê o Estatuto da Terra.  O uso das terras deve ser por tempo integral ou em que as parcerias envolvam as atividades pecuárias do proprietário, propiciando o aumento da produtividade e da renda desse negócio. Este novo modelo proporcionaria a diversificação de atividades nos modelos de integração lavoura-pecuária, diversificação da lavoura de arroz com soja e a implantação de pastagens cultivadas com maior rentabilidade destes sistemas de produção. Isto, recentemente, passou a ser estimulado pelo Governo Federal, através da linha de crédito para a Agricultura de Baixo Carbono – ABC, com taxas favorecidas, carência  e prazos longos. No entanto, o fator arrendamento está impedindo o acesso desta parcela de produtores a este importante programa oficial.

b)Beneficiamento próprio: O produtor pode avançar na direção do consumidor oferecendo o produto já beneficiado, seja através do beneficiamento próprio, terceirizado ou cooperativado. Este acréscimo da renda já é apontado pela CONAB, que informa em sua página na internet (www.conab.gov.br/conjuntura/arroz): – como exemplos: – a partir do preço pago ao produtor na semana de 12 a 16.09.2011 pelo arroz em casca de R$ 24,44/saco/50kg,  em Pelotas-RS, e de um preço do arroz beneficiado de R$44,86/fardo/30kg no atacado em são Paulo, sobra ao produtor R$31,19/saco/50kg base casca (decompondo o preço do atacado até ao produtor em Pelotas-RS). Na sua última atualização, referente a semana de 27/02 a 02/03/2012, a CONAB informa que a partir do preço do arroz em casca de R$26,86/saco/50kg, em Pelotas-RS, e de um preço do arroz beneficiado em SP de R$47,18/fardo/30kg sobra ao produtor R$33,10/sc50kg.

            A mudança do padrão do arroz a ser comercializado deve passar do arroz em casca para arroz beneficiado através da Bolsa de Mercadorias, sendo que já existem tentativas de comercialização via bolsa, porém ainda na modalidade em casca. A comercialização ainda deste modo não permite o acesso ao mercado nacional dos atacadistas, supermercados, restaurantes industriais etc, por isso o padrão deve mudar para arroz beneficiado para sair do mercado regional.

Esta alteração na sistemática de venda do arroz em casca pelo produtor, passa pela modificação de um conceito que está arraigado entre os agentes do agronegócio brasileiro. Há a necessidade de um esforço conjunto e institucional das entidades de pesquisa e extensão que atuam no setor orizícola e das associações e sindicatos de produtores, demonstrando a possibilidade do beneficiamento ser realizado na propriedade ou através de  cooperativas ou ainda, mediante a integração efetiva com os atuais engenhos.

c) Novos usos para o arroz: Há cerca de 10 anos, o pesquisador da EMBRAPA/Agroindústria José Luiz Viana de Carvalho, publicou na revista Planeta Arroz uma listagem de produtos que podem ser feitos com o arroz, além do tradicional “arroz no saquinho”.    Dentre outros constam: – cereais matinais, macarrrão, pão, biscoitos, snacks, farinha enriquecida, bebidas isotônicas etc. Além de possuir um maior valor agregado que permite uma melhor remuneração pela matéria-prima, esta ação irá proporcionar o aumento do consumo, fazendo com que o arroz chegue ao consumidor em outros momentos da refeição e não como hoje, somente na “hora do almoço”.

Sem dúvida, que a apresentação do arroz há cerca de 40 anos na mesma embalagem do “saquinho plástico”, não desperta o interesse de compra do consumidor, tendo que ser estimulada a adoção de mais pesquisa e desenvolvimento pelos atuais engenhos, fazendo com que passem a se apresentar como indústria de alimentos. O caso da indústria do frango é exemplar, visto que esta há muito deixou de ter como produto principal o “frango inteiro”, congelado e com pés e miúdos dentro. Hoje, estas empresas trabalham com cortes variados, e para mercados diferentes, além de produtos processados de alto valor agregado.

Recentemente vem sendo discutida a possibilidade de uso do arroz na ração animal. Já existem notícias de produtores que vem usando o produto em casca direto na dieta diária de novilhos para engorda ou em mistura com suplementos, bem como o incentivo de políticas oficiais para a utilização do arroz na ração de suínos e aves. O bom desempenho obtido nos experimentos realizados, que são semelhantes ao obtido com o milho, permite recomendar essa nova aplicação para o produto. Um dos maiores problemas que emperra a adoção desta prática é a grande mudança de comportamento que é exigida do produtor que, ao invés de continuar vendendo o arroz apenas para o engenho, precisa direcionar a sua produção também para os pastos, fato que até então, nunca havia imaginado.

A diversificação do uso do arroz como ração animal diretamente no cocho ou na mistura com outros produtos ou com outros suplementos propicia que o produtor tenha um maior controle da oferta, transforme o grão em um produto mais nobre, que é a “carne” mais valorizada, evitando assim, também os descontos sobre a parcela da produção que tem menor qualidade de engenho e, por conseqüência, oferecendo ao mercado somente os grãos de melhor qualidade.

d) Diversificação de atividades: Este item, embora já mencionado no item “a” (logo acima), merece ser repassado, pois interessa também aos proprietários das áreas de produção. Senão vejamos, o aproveitamento de parte das áreas para o plantio de soja, apresenta bons preços de comercialização, alto retorno sobre o capital investido e a intensificação dos sistemas de produção da pecuária de corte são medidas essenciais para a capitalização dos produtores hoje dedicados apenas ao cultivo do arroz.

e) Exportação: a exportação do arroz vem crescendo, atingindo um valor médio de 843 mil toneladas/ano, que ajuda a escoar o excesso de produção, mas não se constitui na “grande saída”, que se imaginava em períodos anteriores. Até mesmo porque, o mercado internacional apresenta poucas trocas comerciais de arroz, alcançando um valor médio de 5% da produção mundial, em vista que os países que são os maiores consumidores também são grandes produtores do cereal.  Ainda mais que quem exporta a produção é o engenho, que não tem repassado o ganho ao produtor. Neste último ano de 2011 atingiu cerca de 1.988.001 toneladas (IRGA), em grande parte devido ao programa governamental PEP – Programa de Escoamento da Produção, que subsidiou em R$7,00/saco a operação. Para a próxima safra há a previsão da CONAB para uma exportação de 600.000 toneladas.

f) Campanha de aumento do consumo: Tem sido bastante divulgada a intenção de levar adiante campanhas de aumento do consumo do arroz, inclusive ressaltando suas propriedades funcionais. Em função da mudança de hábito na alimentação do brasileiro, que procura cada vez mais os restaurantes de comida a quilo, tem-se que o arroz tem dificuldade de concorrer com outros alimentos mais trabalhados nos bufês, como lasanhas,  empanados, carnes variadas etc., que na balança tem o mesmo preço. Sem tirar o mérito da iniciativa, vemos com poucas chances de ter impacto sobre o aumento do consumo, constituindo-se apenas em uma louvável iniciativa no que tange aos aspectos saudáveis de alimentação. Nesse item, nos parece com melhor possibilidade de sucesso o apelo ao uso do arroz integral, orgânico, agroecológico ou biodinâmico, que atinge um público cada vez mais preocupado com as questões de saúde e disposto a desembolsar um pouco mais em comidas saudáveis.  

g) Novos negócios:  A evolução tecnológica ocorrida no interior do país, permite visualizar que há a oportunidade da realização de outros negócios que não só mais agricultura e pecuária. Poderão estabelecer-se agentes especializados em armazenagem, prestação de serviços de secagem, plantio, colheita, oficinas, fabricas de ração etc. O surgimento do silo bag, oportuniza a secagem nestes “entrepostos” e o retorno do arroz para a armazenagem nesta modalidade na propriedade dos agricultores. É importante que as linhas de crédito, já estão acompanhando estas modificações, mas ainda não ocorreu o surgimento de empresários com este novo tipo de visão, “fora da porteira”.

h) Etanol de arroz: Surgiu recentemente a discussão deste tema, que parece muito importante para o controle da oferta do arroz. Mais importante ainda, pois que este controle  se dará sem a intervenção do Governo Federal, que tanto gasta com o carregamento dos  estoques que se avolumam há anos em armazéns privados e a custos altíssimos.  Já existem estudos avançados para o uso do arroz e outros cereais para a fabricação de álcool. Para o arroz já há o exemplo e em funcionamento no município de Jacinto Machado-SC da empresa ROZALCOOL, em funcionamento desde 2007 segundo o seu site,  e que podem ser obtidas mais informações em www.rozalcool.com.br . Tem-se o exemplo recente do milho, que a partir do uso do álcool nos EUA teve o seu preço valorizado no Brasil.

O uso do arroz para a produção de etanol, parece que não pode ser visto como um problema ou como causador de uma possível escassez de alimentos, pois há espaço para aumentos de produção e produtividade e, principalmente, para o retorno dos demais produtos agrícolas, que foram “sufocados”, no passado, pelos fantásticos incentivos do Governo federal dados ao arroz, em detrimento do feijão, batata-inglesa, mandioca etc. Outro ponto importante a considerar é que após a retirada do álcool do cereal, sobra um resíduo que pode ser usado na ração animal. O estudo do aproveitamento deste material como ração poderá compensar o direcionamento do arroz para etanol, através da transformação do seu resíduo em proteína animal.

i) Câmara Setorial do Arroz: Em importantes iniciativas, a União e o Governo Estadual do RS, implantaram a Câmara Setorial do Arroz, nacional e estadual. A primeira de pouco efeito prático e a segunda já com alguns resultados, em especial o direcionamento do IRGA – Instituto Riograndense do Arroz   para a pesquisa e o incentivo ao plantio  de soja nas várzeas. A EMBRAPA deu inicio as pesquisas para o uso do arroz em casca para o arraçoamento de bovinos e o uso da silagem do arroz verde. Até a pouco, os esforços destas duas instituições eram direcionados para o aumento da produção e produtividade, através dos Projetos 10 (dez toneladas/hectare) e Marca.

A implantação de comitês de Política Agrícola, em que haja a mobilização dos produtores e engenhos, devem ser coordenados pelas lideranças do setor, através de suas associações e sindicatos, bem como da EMBRAPA, IRGA, Universidades, Ministério da Agricultura e técnicos da área, de modo que a Política Agrícola para o arroz, seja discutida em suas várias nuances e não chegue aos governos apenas através de apelos e reivindicações de lugares comuns.

O uso do arroz para outros produtos ainda é muito incipiente, havendo necessidade da mobilização das universidades das regiões produtoras, da Embrapa Agroindústria, localizada no Rio de Janeiro e do Laboratório de Panificação da Embrapa Trigo.

j) Educação financeira: Por ser uma lavoura que envolve a inversão de vultosos recursos operacionais na implantação e colheita e na comercialização da produção, a lavoura de arroz requer muita atenção por parte do agricultor quanto à gestão destes recursos. Ainda mais, que os demais agentes envolvidos na venda de adubos, agrotóxicos, máquinas e veículos para os agricultores são melhores preparados nas lides comerciais do que os agricultores.  Assim,  estes devem ser treinados pelos agentes de assistência técnica no desenvolvimento de técnicas de administração visando a sustentabilidade da renda do produtor rural. Ações que compreendem um Plano de Negócios (produtos e serviços, planejamento estratégico, análise de mercado, comercialização, finanças etc), devem ser empregadas na administração dos empreendimentos orizícolas.

Com a adoção das alternativas apontadas acima, acreditamos que o arroz terá um novo posicionamento diante do mercado, irá adquirir independência das políticas oficiais e terá aumentada e distribuída a tão sonhada renda entre todos os agentes da cadeia de produção.

BIBLIOGRAFIA:

1. Arroz Irrigado no Sul do Brasil, EMBRAPA, 2004

2. Análise de Safra, Paulo Morcelli, CONAB/Planeta Arroz , agosto 2011

3. Prospecção para a Safra 2011/2012, CONAB

4. Perspectivas e Alternativas da Agropecuária e Agroindústria, AEAPEL, 1986

5. A preço de Banana? Revista VEJA, 20.07.2011

6. Censo da Lavoura de Arroz Irrigado do RS, IRGA 2006

7. Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009, IBGE

8. Tendências de Consumo de Alimentos Industrializados pela População Brasileira, Semíramis M.A Domene, PUC Campinas

9. ITEPA, Diário Popular, pg 18, 15.06.2003

10. O Mito dos Preços Altos, Roberto Brizola, 22.07.2002

11. Revista Planeta Arroz, Edição 39, agosto 2011

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  • Boa tarde,

    Trabalho no depto comercial de uma indústria de arroz em Cristal, RS, concordo em tudo que mencionando do artigo sobre, CONTRIBUIÇÃO À SOCIOECOMOMIA DA LAVOURA DE ARROZ IRRIGADO, mas também devemos incluir a grande dificuldade que as industrias do RS e SC estão tendo em comercialização do arroz nos centros do sudeste e nordeste e virtude da concorrência com arroz beneficiado originário dos estados de GO, MT e TO, os quais vendem com preço médio de 10% abaixo do preço que proponho pra venda nessas regiões. As vendas estão em baixa, pois os preços estão incompatíveis com os custos de produção e por sua vez com a grande oferta de arroz no mercado interno o supermercadistas apertam cada vez mais no preço, inviabilizando as indústrias do sul de vender. Pois bem, com essa grande polemica sobre água no país, resolvi escrever para vocês, com um intuito de tirar algumas dúvidas, talvez vocês possam me ajudar. No domingo de umas três semanas atrás assistindo o Globo Rural, vi uma reportagem que mostrava o baixo nível dos rios, os pivôs de irrigação parados, me chamou a atenção que no mapa das estiagens que mostraram, marcados em vermelho, casualmente os mesmos estados que estão produzindo arroz irrigado, vendendo com baixo preço dificultando a nossa venda no mercado. Pergunto: “Nessa mesma reportagem informaram que, como naquela região a terra é arenosa e que 30% da água se perde no caminho no canal que leva a água do rio ao ponto de captação dos pivôs, também em 1992 visitei uma lavoura de arroz irrigado em Alagoas no município de Igreja Nova, projeto experimental com apoio do IRGA, onde os caixões de lavoura eram de concreto para menor consumo de água, então imagina uma lavoura de 5, 10 mil hectares – com uma lamina de água de 15 a 17 cm de água, terra arenosa solta (fofa, discada) – a quantidade de água necessária para o cultivo dessa lavoura de arroz, . Ai vem a minha duvida. É coincidência? Ou essa utilização da água para o cultivo do arroz irrigado esta influenciando na baixo do nível dos rios e afluentes? Acredito que nas culturas secas gastam menos de 1% da quantidade de água utilizada no cultivo de arroz irrigado. Sabe-se que o arroz se adapta melhor em terra argilosa, como as que temos aqui, então não é melhor RS e SC ficarem com o cultivo de arroz irrigado e nas outras regiões com cultura do seco? ” Sendo o que tinha para o momento e certo de vossa atenção desde já agradeço. Abraço

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