Do campo à cidade, a cadeia do arroz venceu etapas, mas tem grandes desafios
Nos últimos 20 anos, durante o período de circulação da Revista Planeta Arroz, houve uma evolução muito grande na lavoura de arroz do Rio Grande do Sul e, porque não dizer, do Brasil e do Mercosul, uma vez que exportamos tecnologias e genética. Podemos destacar, em primeiro momento, o manejo – desde o pós-plantio até a colheita, passando pela irrigação, estrutura de lavoura, melhor entendimento das necessidades do solo e da fertilização – e cultivares com maior resistência a doenças, maior potencial produtivo.
Talvez o maior dos desafios – que está atrelado à renda – imposto aos arrozeiros tenha sido buscar a racionalização das áreas em busca de um aumento de produtividade com redução dos custos proporcionais. O perfil atual da lavoura e do agricultor exige um profissionalismo em gestão das propriedades e a busca de alternativas de cultivo como a soja e também a pecuária, que trazem no conjunto de práticas um aumento de fertilidade do solo e melhores resultados. Migramos da monocultura para um sistema de produção de alimentos, baseado em forte trabalho de pesquisa e agregação tecnológica, na introdução da soja e da pecuária em rotação. Mesmo nas lavouras que repetem o arroz, há um manejo mais eficiente e sustentável estabelecido entre safras.
O desafio dos próximos anos será buscar outros grãos para ingressarem neste novo sistema de produção na metade sul, e coberturas vegetais para intensificar o sistema com culturas de inverno, pastagens, adubação verde, ampliando as possibilidades nessa trajetória a caminho de uma agricultura multicultural, que melhore as condições de solo em termos de fertilidade a fim de alcançar acima de 170 sacos de arroz por hectare, que seria um ponto de equilíbrio em termos de renda. A partir deste número, o produtor começa a obter lucro com a cultura.
A tendência é de que permaneçam na atividade aqueles agricultores ávidos por informação, que estão se reinventando na busca de alternativas para baixar custos e auferir renda. A agricultura é cada vez mais uma atividade que exige sustentabilidade por meio dos diversos eixos, em especial o econômico, o ambiental, mas também social – por tudo o que a orizicultura representa no Sul do Brasil e no mundo – e também cultural, pois trata-se de uma lavoura que está há mais de um século integrada às terras baixas, presente em mais de 200 municípios gaúchos e nos quatro países do Mercosul. Não nos faltarão desafios. Estamos vivendo um ano completamente atípico, em que a pandemia, o câmbio, a redução de áreas e o superávit comercial dos últimos anos permitiram uma evolução histórica nos preços do arroz.
Em que pese a tragédia causada pelo coronavírus, o mundo voltou-se à importância do arroz e a lavoura, diante deste cenário, recuperou a sua relevância estratégica diante do consumidor, do varejo e dos governos. A cadeia produtiva respondeu à demanda. Esperamos que, diante de tantos problemas, tenhamos a possibilidade de ver demandas do setor atendidas, com a devida valorização do produtor, e tenhamos a capacidade necessária para discernir um ano atípico de um cenário de normalidade, que esperamos retorne em breve, e sejamos racionais na decisão do tamanho da lavoura que será plantada.
Foi preciso perder muitos anos e produtores, reduzir mais de 200 mil hectares, e uma pandemia e câmbio favorável para recuperarmos a capacidade de obter renda, e nem todos conseguiram. Muitos venderam arroz abaixo de R$ 60,00 este ano, poucos alcançaram os R$ 100,00. Agora, é preciso que sejamos estratégicos ao não aumentar a produção além do limite da capacidade de consumir, exportar e manter um estoque adequado. Nosso grande desafio é buscar o ponto de equilíbrio entre a oferta e a demanda e remuneração justa ao longo da cadeia produtiva, de forma que nos permita recuperar prejuízos, pagar dívidas, investir e manter o Brasil no mapa da autossuficiência em segurança alimentar e um fornecedor confiável e regular de arroz para o mundo.