Exportando o parboilizado
Autoria: GILBERTO WAGECK AMATO
Eng. químico, M.Sc.
Irga Centro de Excelência do Arroz.
Há uma geração repete-se que 25% do arroz consumido no Brasil e no mundo é parboilizado.
No planeta, esse número equivaleria dizer que o arroz parboilizado “é o quarto cereal mais produzido”, logo atrás de trigo, milho e do próprio arroz.
E no contexto americano, o parboilizado brasileiro, com três milhões de toneladas/ano, é o “terceiro país” maior produtor de arroz, seguindo após os líderes, Brasil e EUA.
Além do aspecto quantitativo, o parque fabril brasileiro, com cerca de uma centena de parboilizadores, tem potencial para colocar no mercado externo mais de um milhão de toneladas de parboilizado de alta qualidade. Os números recentes de exportação ainda são tímidos, mas a demanda internacional pelo parboilizado é crescente, à espera de quem tiver “engenho e arte” para ocupar espaços.
Arroz: o cereal nacional!
O Brasil herdou da cultura européia o hábito do consumo de trigo, presente no “pão nosso de cada dia”, nas massas e nos biscoitos. Porém, a natureza vocacionou seus solos e climas para um cereal mais nutritivo e saudável: o arroz!
Aos grãos está reservada naturalmente uma maior fatia no mundo do consumo em função das facilidades relativas às demais fontes de carboidratos. Já as raízes e os tubérculos são caracterizados por apresentarem maiores dificuldades em cada um dos passos desde a lavoura até o consumidor final: coleta, secagem, transportes e armazenamento.
Entre os grãos, da competição do arroz e do trigo podem ser feitas análises sob os pontos de vista econômico e social. Analisando o consumo do arroz no Brasil, a dissertação do engenheiro agrônomo Tiago Sarmento Barata (UFRGS, 2005) registra o caráter complementar entre massa e arroz, sendo a preferência comandada primordialmente pelo preço.
O arroz brasileiro, devido aos dois sistemas de cultivo – terras baixas e terras altas -, responsáveis por 99% dos procedimentos de lavoura praticados no país, garante uma saudável diversificação, mitigando a vulnerabilidade de um sistema único. Por oportuno, surgem agora eufemismos de marketing sobre os dois sistemas; a denominação “de sequeiro” traz consigo um caráter negativo, tendo sido substituída por “de terras altas” e, mais recentemente, ensaia-se com o nome “tropical”. Por sua vez, o arroz de terras baixas, representado pelo arroz irrigado, segundo o professor Camilo Feliciano de Oliveira, ensaia a nova denominação de “arroz temperado”. Mais importante do que o simples jogo de palavras são as estratégicas possibilidades multiopçônicas de cultivo nacional. O fato é relevantíssimo na logística da segurança alimentar.
Do ponto de vista econômico, comparando o consumo entre os dois cereais, tem-se valores que são, grosso modo, de mesma magnitude, com 12,5 milhões de toneladas para o arroz e 10,0 para o trigo nos últimos anos no Brasil. A rigor sendo esta uma cultura de inverno e o arroz, de verão, pode-se afirmar que não se tratam de opções mutuamente excludentes. Além de não partilharem do mesmo tempo, ressalte-se o aspecto de não disputarem o mesmo tipo de solo. Porém, o paradoxo brasileiro no consumo de carboidratos ocorre em função da importação anual de até 70% do trigo consumido, contra a plena capacidade de auto-suficiência do arroz, com potencial para dobrar a produção. Para atender à crescente demanda externa, o país está apto a colocar no mercado produtos na qualidade exigida. E dentre os subgrupos de arroz, o parboilizado está pronto para o embarque!
A demanda pelo parboilizado
A escolha de grãos em detrimento de raízes e tubérculos tem sido motivada principalmente pela irreversível migração de pessoas do campo para as cidades. Paralelamente, tem sido constatado o crescimento do consumo de parboilizado mais facilmente em locais onde não está enraizado o hábito do arroz branco comum. Estas afirmativas são recorrentes no mundo inteiro, da África ao nordeste brasileiro.
Longe de esgotar o assunto, os principais apelos para o aumento de demanda pelo parboilizado estão relacionados a aspectos sociais e econômicos.
Do ponto de vista social, pode-se afirmar que há uma crescente busca por alimentos mais saudáveis. A telemática, segmento que comanda a presente onda globalizante, faz com que as informações cheguem com grande rapidez. A “geração informatizada” começa a chegar ao consumo, demandando produtos como o parboilizado, com mais vitaminas do complexo B (incluindo a B9, mais recente constatação) e vitamina E, com baixo índice glicêmico, alto amido resistente (uma especialíssima forma de fibra alimentar) e outros importantes apelos nutricionais e nutracêuticos.
Igualmente, dentro do ponto de vista social encontra-se o que foi chamado de “colheita virtual” (“Rice parboiling: a process to obtain ‘harvest of virtual plantation’”; Congresso Mundial dos Centros de Pesquisa; Amato, G. W., Anais da Waitro, 2002), devido ao ganho de cerca de 4% [sic], poupando áreas para a mesma produção. Esta vantagem é decorrente do acréscimo de massa proporcionado pelo processo hidrotérmico da parboilização (“Arroz parboilizado: tecnologia limpa, produto nobre”; Amato, G. W., Ed. Lenz, 2002; páginas 198-202, 215). São apelos capazes de sensibilizar e pautar as compras da nova “geração saúde”.
Os profissionais da logística, com o parboilizado, são beneficiados por trabalharem com um produto estabilizado sob os pontos de vista microbiológico e enzimático. Sendo menos sensível à infestação por insetos, resulta em baixíssimas perdas por respiração e menor tendência à “viragem” (conhecida ação fúngica ocasionada por variação de umidade no transporte e armazenamento). Estes argumentos têm sido sustentados como vantagens de um produto mais confiável, apto à obtenção de menor prêmio de seguro em transporte e armazenamento. As citadas referências comparativas são sempre relacionadas ao arroz branco polido, menos adequado às viagens longas e mudanças climáticas, variáveis típicas da exportação.
O mercado internacional
Uma aproximação da produção mundial de arroz parboilizado leva ao número de cerca de 150 milhões de toneladas, base casca. Na realidade há uma certa dificuldade em separar dados precisos de informações seguramente imprecisas. Um dos exemplos é a produção total de arroz do Paraguai, com os dados oficiais subestimados, equivalendo a menos da metade do que se sabe. Considerando-se o referencial de que a quarta parte da produção de arroz do mundo é parboilizado, pode-se inferir, de maneira figurada, que o parboilizado equivale à quarta posição na produção mundial de cereais, vindo logo atrás da produção total de milho, trigo e do próprio arroz.
Quanto a exportações, o arroz, em todos os seus grupos, é um dos cereais que menos ultrapassa fronteiras, sendo a exportação total mundial inferior a 5%. Basicamente, quem produz, consome. E o parboilizado não foge à regra.
Dados nacionais
Tomando dados de exportação brasileira de grãos inteiros de arroz das últimas três safras, o parboilizado representa 70%. Porém, considerando a predominância de grãos quebrados, conforme demonstrado no gráfico a seguir, os grãos inteiros ainda estão a merecer um maior espaço.
Internacionalizando o parboilizado brasileiro
Em junho próximo, La Habana recebe no simpósio Calidad del Arroz en el Escenario Industrial y Comercial, dentro do IV Encuentro Internacional del Arroz, importante divulgação do arroz brasileiro – e do parboilizado em particular. Na oportunidade serão aportadas informações sobre a qualidade do produto nacional.
Em resumo, serão propostas soluções à equação composta por um conjunto de variáveis da demanda mundial por arroz como:
– A “caixa baixa” dos estoques de grãos.
– O apelo por produtos oriundos de tecnologias limpas.
– A busca por produtos nutricionais e nutracêuticos por parte da informadíssima “geração saúde & telemática” que chega ao mercado.
– A estabilidade do produto durante o transporte e armazenamento.
Através da conferência Escenario del Arroz Parboilizado en Brasil pre-tende-se divulgar perante importantes atores de todas as geografias que o ar-roz parboilizado brasileiro está aí, em qualidade e quantidade para competir!
Mensagem final
Os momentos de transição, como o atual, de arranjos e rearranjos no intrincado mundo dos negócios internacionais de grãos, constituem-se em oportunidades para os que têm “engenho e arte”, na expressão épica do ciclo dos grandes descobrimentos (Lusíadas). A receita do momento consiste em identificar oportunidades, temperar com uma pitada de ousadia, lançar velas ao vento e rumar para o porto seguro do mercado de arroz parboilizado.