Gaúchos trocam plantio de arroz e pecuária pela uva
Produtores de arroz da fronteira oeste e campanha gaúcha procuram novas alternativas de produção.
Os principais esteios da economia agrícola do Rio Grande do Sul balançaram nos últimos anos: soja, pecuária e arroz. Líderes no passado na produção de soja, os gaúchos tiveram grandes prejuízos com a oleaginosa nos últimos dois anos. Também líderes na pecuária no passado, viram essa atividade não render mais como antes. Neste ano, é a vez de o arroz – produto em que lideram – não pagar os custos com as vendas.
Diante dessas incertezas, muitos gaúchos acreditam que o caminho é a diversificação. E essa diversificação passa pela uva, mas em novas fronteiras do Estado. Descoberta há 30 anos pelos produtores de uva, a chamada Metade Sul, que compreende os municípios do sul do Estado, começa a receber um volume maior de investimentos.
A 600 quilômetros da Serra Gaúcha, tradicional região produtora do Estado, essa nova área se destaca pelo baixo valor das terras e relevo plano, que permite a mecanização e a produção em escala com baixos custos. Os investimentos estão sendo feitos com castas nobres de uva. Fabrício Domingues, engenheiro agrônomo da Almadén, destaca que a cultura da uva se desenvolve muito bem na região, principalmente devido ao solo profundo e bem drenado.
Outro ponto alto da região é a amplitude térmica: elevadas temperaturas durante o dia, que chegam a 32C, com recuo para 14C à noite, segundo Ricardo Haas, enólogo da empresa. Haas destaca, ainda, que a possibilidade de mecanização na região permite a colheita no ponto ideal de maturação da uva, o que dá maior qualidade ao vinho.
Sidnei Benvegnu, produtor que saiu da Serra Gaúcha para se instalar em Santana do Livramento, diz que, além das propriedades adequadas do solo, os custos de produção são menores devido ao clima. “É uma região de ventos constantes, que diminui a incidência de fungos provocados pela umidade no período das chuvas”.
Diante das boas condições do solo e de clima, alguns produtores afirmam que o vinho da região é melhor do que o da Serra Gaúcha. Mauro Zanus, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho, diz que o solo e o clima da região “potencializam um vinho diferente”. Mas a questão “não é se esse vinho é melhor ou pior”. “O fato é que ele tem características próprias”.
Arroz por uva:
O clima favorável, a disposição de terra e a boa renda trazida pela vitivinicultura estão levando vários pecuaristas e produtores de arroz e de soja para o setor. Afonso Hamm, produtor de arroz, é um desses novos participantes da vitivinicultura. “Quebrei duas vezes com o arroz, e em uma delas foi feio, e aprendi que é preciso diversificar”, diz esse engenheiro agrônomo que também é diretor administrativo da Emater/RS e presidente do Comitê de Fruticultura da Metade Sul.
Outro que inclui as videiras em sua propriedade é José Antônio Peterle, de Dom Pedrito. Com área de 1.500 hectares de arroz e outra idêntica de soja, Peterle pretendia verticalizar a produção de arroz, com investimentos em uma indústria de beneficiamento. Chegou à conclusão de que a melhor opção seria a vitivinicultura.
Vai destinar 150 hectares para parreiras e inicia, em breve, a industrialização e a venda de um vinho de marca própria. O segredo é entrar no setor com produção de uvas de qualidade, que podem gerar um vinho fino, diz esse produtor que tem o acompanhamento da Embrapa no projeto. A ampliação do cultivo da uva é muito importante para a região, que está empobrecida e dependente da pecuária, segundo Luís Fernando Fabrício, engenheiro agrônomo da Emater/RS.
Carlos Paviani, presidente-executivo do Ibravin (Instituto Brasileiro do Vinho), diz que a bebida agrega valores econômicos, culturais e sociais. Para Hamm, essa diversificação é importante na região para elevar a oferta de emprego e aumentar a renda dos produtores. Segundo ele, a região tem 1 milhão de hectares disponíveis apropriados à produção de frutas.
Hamm destaca o bom rendimento com a diversificação. Recém-chegado nessa diversificação, ele diz que, enquanto obtém rendimento de R$ 15 mil por ano em 100 hectares com a pecuária, retira R$ 100 mil por ano com 12 hectares de uva e pêssego.
Carta de Bagé:
Apesar dessa busca de novos produtores pelo cultivo da uva, o setor ainda tem muitos problemas para resolver. Representantes de 15 instituições ligadas ao setor, e que participaram do 5º Seminário de Vitivinicultura, realizado em Bagé (RS), assinaram uma carta com vários pedidos aos governos estadual e federal.
Ao governo estadual são solicitados 75% dos recursos do Fundovitis (especial para o setor) para a promoção das uvas, dos vinhos e dos sucos. É solicitado ainda o enquadramento do vinho como produto alimentício.
Ao federal a carta pede políticas de fomento, controle de estoques, criação de um fundo de suporte, combate ao contrabando, fiscalização e controle da produção e comercialização e recursos para uma campanha que estimule o consumo de vinhos e de sucos.