Inverno deve ficar marcado por El Niño
Autoria: Jossana Cera é meteorologista, doutora em Engenharia Agrícola pela UFSM e consultora do Irga.
Condições meteorológicas ocorridas durante o mês de maio
Maio foi o mês mais chuvoso dos últimos anos na maioria das regiões do Rio Grande do Sul. Apenas no Sul do Estado é que a chuva ficou abaixo da média. Nas demais regiões, as anomalias ficaram em 200 milímetros (mm) acima do valor normal para o mês (Figura 1). O outono foi mais chuvoso que o normal e uma das causas é o próprio El Niño, com o que se chama de “repique do El Niño”, que ocorre no início do outono, com a intensificação das chuvas.
Em contrapartida, em função do grande número de dias chuvosos, as temperaturas, sobretudo as noturnas, ficaram acima da média. A temperatura mínima ficou acima do normal em todo o Estado, com valores entre +2 e +4 °C na maioria das regiões. Já as máximas ficaram dentro do normal em todas as regiões, exceto no setor Nordeste do estado, onde ficaram entre +1 e +3 °C acima do normal.
Imagem 1 – Foto: Reprodução
Imagem 1: Mapa da precipitação acumulada (A) e anomalia da precipitação (B) durante o mês de maio de 2019. As escalas de cores indicam o acumulado de precipitação em mm (A) e anomalia de precipitação (B), também em mm, onde valores positivos (azul) indicam precipitação acima da média e valores negativos (laranja-vermelho) indicam precipitação abaixo da média. Fonte de dados: CPTEC/INMET
Situação atual do fenômeno ENOS (El Niño-Oscilação Sul) e perspectivas
O El Niño continua atuando, sendo que já são sete trimestres consecutivos com anomalias superiores a +0,5 °C na região do Niño3.4 (Imagem 2). No entanto, esta anomalia tem sinalizado leve declínio no último mês, tanto que, alguns centros de meteorologia apontam para o término do El Niño ao final do inverno. Porém, mesmo que o El Niño se dissipe, a atmosfera ainda responderá como tal por mais um tempo (dois a três meses aproximadamente), conferindo uma condição mais úmida à atmosfera e, assim, favorecendo as chuvas no sul do Brasil.
A grande indefinição continua sendo na região do Niño1+2, que ora está com anomalias positivas, ora com anomalias negativas na temperatura da superfície do mar (TSM). Se esta condição continuar, se terá uma situação parecida com a da safra passada, onde se teve períodos de 10 a 15 dias chuvosos e 10 a 15 dias de tempo mais seco, uma espécie de “gangorra” nas chuvas. Ou seja, se a região do Niño1+2 ficar com anomalias negativas de TSM, haverá um corte nas chuvas no sul do Brasil, mas se a região ficar com anomalias positivas, haverá intensificação das chuvas por aqui.
Os centros internacionais mantêm a previsão de El Niño fraco até o final do inverno, mas a probabilidade caiu para 66% para o trimestre Jun-Jul-Ago, sendo que entre os trimestres de Ago-Set-Out a Jan-Fev-Mar as probabilidades de permanência do El Niño ficam em torno dos 50%. O que se pode afirmar é que as previsões estão indicando uma condição entre Neutralidade e El Niño, ou seja, a La Niña está descartada.
Com relação às águas do Oceano Atlântico Sul, elas têm se mantido mais aquecidas em toda a costa leste do Sul do Brasil, isso também tem favorecido as chuvas no Rio Grande do Sul, sobretudo na metade Leste do Estado.
Sob essas perspectivas, espera-se que o inverno seja mais úmido/chuvoso que o normal, embora tenhamos sistemas de bloqueio atmosférico, como o do início de junho, que reteve as chuvas no Uruguai e proporcionou uma condição de tempo seco e quente no Estado. Este é outro fator a ser destacado, as temperaturas deste outono de 2019. Março ainda teve temperaturas entre a média e um pouco abaixo do normal. Porém, abril e maio ficaram com temperaturas acima do normal, tanto as mínimas quanto as máximas (em torno de +2 a +4 °C acima da média em várias regiões do Estado).
Mas, os recordes ficam para o mês de junho, que até o dia 19/06, tanto as mínimas quanto as temperaturas máximas estavam entre +4 e +6 °C acima dos valores normais para o mês. Há quem goste deste clima mais quente que está ocorrendo fora de época. No entanto, essas anomalias acabam causando desequilíbrio no sistema, como florescimento de plantas antes do tempo, não há o controle de pragas (insetos) e fungos, que seriam causados pelo ambiente mais frio, proporcionando um sinal de alerta para a agricultura do Rio Grande do Sul.
Contudo, há a expectativa de entradas de massa de ar frio e seco que, por ventura causarão geadas, só que o frio não será duradouro como em anos anteriores. Outro aspecto do El Niño é que há a tendência de que o clima frio se prolongue por mais tempo, até setembro e/ou meados de outubro.
Imagem 2 – Foto: Reprodução
Imagem 2: Anomalia da Temperatura da Superfície do Mar no mês de maio de 2019. Fonte: Adaptado de CPTEC O retângulo na Imagem mostra a região do Niño3.4, região que os centros internacionais utilizam para calcular o Índice Niño (índice que define eventos de El Niño e La Niña).
Previsão para a precipitação para o trimestre Maio-Junho-Julho
As previsões, tanto dos centros internacionais, quanto os centros brasileiros de meteorologia, tem mostrado que as chuvas se manterão entre a média e um pouco acima da média até julho ou meados de agosto.
O modelo climático do INMET/UFPel (Imagem 3) mostra que, para junho, as chuvas ficariam dentro do normal na maioria das regiões gaúchas e acima do normal no setor Norte/Nordeste, no entanto, o que se tem até o momento, são chuvas bastante acima da média no extremo sul do Estado e chuvas abaixo da média nas demais regiões. Muito dificilmente esta situação mudará, já que se tem previsão de chuva apenas para os dias 25 e 26 de junho.
Já para julho, este modelo vem sinalizando uma condição de chuvas abaixo da média para o setor Norte/Nordeste do estado e dentro da média para as demais regiões. Para agosto o modelo coloca chuvas abaixo na média para todo o Rio Grande do Sul, com valores entre 25 e 50 mm abaixo do normal na metade Sul e entre 50 e 85 mm abaixo do normal mais ao Norte do Estado.
O modelo americano CFS v2, da NOAA (Seasonal Climate Forecast version 2 – National Oceanic and Atmospheric Administration), projeta chuvas acima da média para julho e agosto e abaixo da média para setembro, ou seja, essa “estiagem” ocorreria mais tarde do que a projetada pelo modelo do INMET. Independente de quando o período seco aconteça, o que chama a atenção é que outros modelos também estão sinalizando uma diminuição das chuvas entre o final do inverno e o início da primavera.
Imagem 3 – Foto: Reprodução
Imagem 3: Normal Climatológica (A,C,E), anomalia de precipitação INMET/UFPel (B,D,G) para os meses de Junho, Julho e Agosto de 2019, respectivamente, para o Rio Grande do Sul. Fonte: Adaptado de CPPMet-UFPel/INMET
Frente a essas projeções, deve-se ficar atento às próximas atualizações, a fim de verificar se essa condição de tempo mais seco se confirmará. Contudo, o produtor deve priorizar a preparação das áreas para a safra 2019/20 o mais cedo possível, se ainda não a fizeram. Pois assim, quando as condições de tempo permitirem, ele já poderá realizar a semeadura do arroz e/ou soja.