O arroz e o preconceito

Mas que vai faltar arroz na mesa do mato-grossense, isso vai! Além do preço estar cerca de 30% mais caro, com o risco de encarecer mais.

Os jornais trouxeram ontem com grande destaque o baixo estoque de arroz em Mato Grosso, 50 mil toneladas, previstas para durar apenas mais 60 dias. É uma longa história de falta de apoio à produção e de reiteradas denúncias dos produtores e dos industriais do estado. O presidente do Sindicato das Indústrias de Arroz, Joel Rodrigues, diz que a solução para o desabastecimento de arroz do país está em Mato Grosso.

Mas que vai faltar arroz na mesa do mato-grossense, isso vai! Além do preço estar cerca de 30% mais caro, com o risco de encarecer mais.

Não quero falar só da crise e do preço do arroz. Quero aproveitar a ocasião oportuníssima para tocar num tema oportuníssimo: o preconceito da população urbana de Mato Grosso contra a agricultura e contra os agricultores. É de imensa burrice o preconceito urbano contra tudo que vem do campo.

Pode parecer inacreditável que gente esclarecida compre no supermercado o arroz, o feijão, a carne, a farinha, os alimentos industrializados de grãos e de carne, como se eles nascessem na prateleira. Compram, enchem o carrinho e falam mal da agricultura e dos agricultores. Acho isso fantástico, porque a história de Mato Grosso é eminentemente rural pela sua agricultura e pela sua pecuária.

A diferença hoje é que acabaram as “lavouras de toco” das roças, e surgiram grandes plantações, e as vaquinhas pantaneiras hoje somam mais de 26 milhões de cabeças. Mas a população cresceu mais de 400% de 1970 até hoje. É claro que a produção de alimentos também cresceria. A população brasileira era de 50 milhões em 1950, de 100 milhões em 1970 e de 190 milhões em 2008. Mais gente comendo, mais gente produzindo. É tão ilógico assim?

Confesso que irrita-me ver gente urbana, sentada no bar, tomando cerveja e teorizando e criticando o campo, a produção, os produtores e até mesmo a cultura rural. Talvez, no fundo, por ter vindo do mundo rural nos anos 50, rejeite esse preconceito tão burro. Ora, a cadeia produtiva da cerveja é eminentemente agrícola.

O refrigerante é sintético, mas usa açúcar – que, certamente não dá na prateleira do supermercado. O iogurte, o danoninho, vem de onde? Mas o hambúrguer que enche os sanduíches da garotada também não nasce na prateleira do supermercado. Nem o queijo, nem a mostarda, nem o ketchup. E o carro movido à álcool, depois do bar?

E dê-lhe críticas e preconceito contra a agricultura e contra a pecuária. Morte aos produtores, e viva os supermercados com as prateleiras do arroz vazias! Aí, certamente alguém será culpado.

Provavelmente na visão urbana míope, será o agricultor “que não agricultou”. A cultura e a educação urbanas criaram esse distanciamento com a produção, através da intermediação dos mercados e dos supermercados. Tudo parece nascer em prateleiras. Quando falta, sente-se vagamente a falta de um elo da corrente, mas já se perdeu a memória de quem seja.

O bom mesmo é sentar num bar, pedir uma cerveja e falar mal de quem produziu as desconhecidas matérias primas que geram os produtos. Vagamente a cerveja é associada a uma marca e a uma indústria, como se malte, cevada, açúcar, nascessem num lugar ideal e imaginário, onde as culpas urbanas exorcizam o pecado de beber e de comer algo que vem da natureza.

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