Onde está o dinheiro?

Arrozeiro colhe mais, mas não traduz o seu desempenho em renda.

Nos últimos cinco anos a lavoura gaúcha de arroz aumentou a produtividade por hectare de 5,5 mil para mais de 7,5 mil quilos/hectare. O ganho de mais de duas toneladas refletiu o uso de tecnologias e sistema de manejo mais eficientes. O custo por unidade produzida caiu e os rizicultores agregaram renda à atividade, mas o setor diagnosticou que esse ganho não foi parar no seu bolso – com o grosso dos recursos sendo transferidos para o caixa de outros segmentos da cadeia produtiva – e quer mudar esse cenário. 

“Se o produtor não obteve ganhos importantes, nem o consumidor foi tão favorecido, algo está errado”, diz o presidente do Instituto Rio-grandense do Arroz (Irga), Maurício Fischer, que lançou o programa Renda, ação do programa Arroz RS, do qual emergem quase 30 projetos focados na sustentabilidade da orizicultura gaúcha do ponto de vista agronômico, econômico, social e ambiental. 

Com apoio da Farsul, Federarroz e representantes das principais regiões arrozeiras, o Irga identificou algumas causas da transferência das riquezas, gargalos estruturais e sugestões para sanar, ainda que parcialmente, a evasão de renda do setor produtivo. Consultorias trabalham para, ao mesmo tempo, identificar o volume de renda agregado com o salto produtivo e para quais segmentos, e em que proporções, foi transferido. Assim, pretende-se estancar a sangria financeira com ações eficientes.

SALTO
Uma das constatações é a de que a agregação de tecnologias levará as lavouras gaúchas a produzirem perto de 9 milhões de toneladas de arroz até 2012. “Isso leva à necessidade de assegurar uma parcela mais significativa de renda aos produtores e à busca de mercados para o cereal”, diz o presidente da Câmara Setorial do Arroz, Francisco Schardong. Na safra 2008/09, por exemplo, o setor de fertilizantes, pelos preços praticados, apropriou boa parte dos ganhos com a produtividade. 

“Precisamos resolver problemas crônicos do setor, como armazenagem, concentração da oferta, vencimento dos créditos muito próximo da safra e alcançar maior eficiência na gestão da lavoura e da oferta”, enfatiza Renato Rocha, presidente da Federarroz. O desafio do projeto agora é identificar os gargalos, propor soluções eficientes e assegurar que sejam absorvidas e colocadas em prática pelo rizicultor. A intenção é de que algumas propostas já sejam colocadas aos elos da cadeia produtiva na Abertura Oficial da Colheita do Arroz, em Camaquã (RS), no mês de fevereiro.

FIQUE DE OLHO

R$?

O Irga e as demais entidades ligadas ao projeto, como Federarroz e Farsul, buscam, com o apoio de consultorias especializadas, como o Instituto Ícone, dar sustentação científica aos seus argumentos da transferência de renda, identificar os gargalos e assegurar que o segmento produtivo mantenha uma parcela maior das riquezas agregadas. Não há a pretensão de alcançar grandes resultados em curto espaço de tempo, mas de consolidar pequenas vitórias a cada safra, que se somem em um grande resultado final. 

Além disso, o setor está identificando profissionais para que assumam a representação do setor em Brasília (DF), para ser interlocutor e facilitador das demandas deste segmento junto às esferas do poder federal, um “lobista”, nos moldes do que os demais setores do agronegócio já fazem há bastante tempo. 

“Concluímos que o setor precisa ampliar a representatividade junto ao Governo Federal, que é de onde vêm as políticas de comercialização e o custeio”, frisa Maurício Fischer.

Por onde escorre a renda da produção? 

O Irga agrupou alguns dos gargalos do segmento arrozeiro considerados responsáveis pela transferência de renda do setor produtivo. Vamos listar alguns exemplos:

GESTÃO DE OFERTA:
O produtor gaúcho tem sérios problemas pela concentração da oferta nos primeiros meses após a safra (de março a julho). Isso está associado a fatores econômicos e financeiros: vencimento dos créditos de custeio e comercialização muito perto da safra, bem como os encargos financeiros e renegociações de dívidas.
Assim, os preços historicamente despencam anualmente entre março e julho e torna-se muito difícil voltar aos patamares antes alcançados. Uma solução passa por negociação com o Governo Federal referente a mecanismos e retardamento dos vencimentos. O setor atualmente pede o aumento das parcelas de vencimento de quatro para cinco e vencimentos a partir de agosto. A oferta seria fracionada.

ARMAZENAGEM:
O Rio Grande do Sul aumentou a produtividade em quase 40%, mas a armazenagem manteve-se praticamente a mesma. Atualmente, 30% dos armazéns arrozeiros estão nas mãos dos produtores. A deficiente estrutura de armazenagem é mais uma das razões pela qual a oferta logo após a safra é aumentada e o produtor perde o controle da entrada de seu produto no mercado.
Isso acontece porque 70% dos arrozeiros gaúchos não dispõem de silos e recorrem às indústrias e cooperativas, que podem “girar” com o produto no mercado e pagar na baixa. Assim, quem põe preço no cereal é a indústria, não o rizicultor. O produtor que dispõe de estruturas de armazenagem obtém renda de R$ 1,00 a R$ 2,00 acima da média por saca de arroz.

CONCORRÊNCIA:
O arrozeiro gaúcho tem uma mentalidade de concorrência com os vizinhos. Outros elos da cadeia produtiva se beneficiam disso, seja na hora de vender insumos, seja na hora de comprar o grão. Desta forma, o projeto Renda incentiva o associativismo em torno de objetivos comuns. Quanto maior o volume da compra, mais se pode barganhar preços.
Um grupo com volume significativo obtém preços melhores do que um único produtor. A mesma coisa vale para a compra de máquinas: ao invés de cada arrozeiro ter colheitadeiras e tratores ociosos parte do ano, podem se formar grupos de prestação de serviços, oferecendo ou contratando, deixando de imobilizar parte do capital. Uma aliança estratégica pode fazer a diferença entre o lucro e o prejuízo numa safra.

INFORMAÇÃO:
Na hora de vender o produto o arrozeiro precisa adotar uma estratégia comercial inteligente. Para isso precisa dominar informações que poderão definir as margens de comercialização. A gestão administrativa também é muito importante.

EXPORTAÇÃO:
Com a produção gaúcha em crescimento, a exportação é determinante para a estabilidade do mercado. Os arrozeiros têm uma proposta para o Governo Federal na forma de compensação às exportações de arroz. Querem que, à medida que o país importe produto do Mercosul, com subsídios indiretos, como o Reintegro, o Governo brasileiro crie facilidades para a exportação dos mesmos volumes. A ideia é a isenção de impostos proporcional às vantagens do Mercosul.

CONSUMO:
Desenvolver um bom programa para o aumento do consumo do arroz é um dos maiores desafios da cadeia produtiva brasileira. A proposta tem muitas possibilidades, está planejada, mas nunca passa do papel na hora de ver quem paga a conta.

AMBIENTAL:
O setor trabalha no sentido de criar e difundir um manual de boas práticas agrícolas para a lavoura de arroz. É um passo a mais para consolidar ações de certificação e rastreabilidade do arroz com vistas ao mercado externo.

CAPACITAÇÃO:
Capacitar o produtor de arroz para a gestão comercial e administrativa é um dos grandes desafios deste programa Renda. Assim, Irga, Farsul e Federarroz estão recorrendo ao Senar/RS, Sebrae/RS, consultorias e empresas especializadas para elaborarem cursos e ações de capacitação aos produtores. 

                                                                                                                                                       Fonte: Irga

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