Por que o preço do arroz caiu?
Auto-suficiência brasileira e do Mercosul custou caro.
A colheita de safras recordes no Brasil e no Mercosul é o principal fator que provocou a queda dos preços do arroz no mercado brasileiro e no bloco econômico. Os produtores nacionais até conseguiram segurar a oferta nos primeiros meses após a colheita, mantendo cotações acima de R$ 33,00 para o saco de 50 quilos (gaúcho) e 60 quilos (no Centro-oeste) para o produto com mais de 58% de grãos inteiros. A estratégia é resultado da experiência adquirida em safras passadas. Assim, até julho as cotações do mercado brasileiro se mantinham dentro de patamares aceitáveis, apesar da aceleração de um fluxo de arroz em casca do Mercosul, principalmente do Uruguai. }
A colheita brasileira, apesar de grande, teve problemas de qualidade, com grande volume de grãos quebrados. A indústria antecipou uma leitura de alta competição do mercado e buscou fora produto de qualidade e com preços convidativos para fazer preço. Assim, retirou-se do mercado gaúcho, responsável por 50% da produção nacional, e forçou uma baixa de preços. Refletia a política dos atacadistas do centro do país, que recebiam ofertas com preços muito atraentes do Centrooeste e também o resíduo das importações da ásia e Estados Unidos de 2003, que chegou aos portos brasileiros em janeiro e fevereiro de 2004 ainda com Tarifa Externa Comum (TEC) reduzida.
A partir de agosto, com a entrada em vigor da isenção de PIS/Cofins para o arroz beneficiado, que foi estendida ao produto esbramado e industrializado do Mercosul, esse fluxo, que já era grande, aumentou. Sem a diferença de 9,25%, o cereal do Mercosul tornou-se muito mais competitivo. Mudou apenas o perfil. Ao invés do arroz em casca predominar, atacadistas e a indústria passaram a importar beneficiado e/ou descascado. Aumentou a pressão sobre o mercado e os atacadistas e supermercadistas passaram a exigir uma redução de até 11% para a indústria. A pressão chegou instantaneamente ao mercado do casca, pois o arroz esbramado uruguaio, com alta qualidade, chegou a entrar no Brasil por até R$ 2,50 abaixo das cotações gaúchas.
FATOR – Também para o consultor da empresa Safras & Mercados, Aldo Lobo, o principal fator de cotações decrescentes no Brasil este ano, com picos de baixa em plena entressafra, é excesso de produção interna e no Mercosul. “Os outros fatores são coadjuvantes, mas também têm importância significativa”, revela. Segundo ele, os países do Mercosul sempre reservaram seus excedentes para o Brasil, pois todo ano havia importações. “Neste ano não precisamos, mas eles tinham produto de sobra. Entre procurar novos mercados pelo mundo (o que não é fácil) e baixar o preço para seguir vendendo ao Brasil, eles optaram pela segunda alternativa”, acrescenta.
Alguns dirigentes arrozeiros concordam que a estratégia de segurar demais o arroz abriu espaço para a entrada do cereal mais barato do Mercosul no primeiro semestre. A oferta poderia ser um pouco maior quando o arroz estava na faixa de R$ 33,00, pois parte do produto do Mercosul não teria entrado no primeiro semestre. O presidente da Federarroz, Valter José Pötter, no entanto, discorda. Lembra que se a oferta fosse maior, os preços cairiam mais rápido. “O que abalou nosso mercado, além da colheita cheia do Mercosul, inclusive o Brasil, foram as vantagens competitivas do Uruguai e da Argentina, como juros mais baixos, menor incidência de impostos, máquinas e insumos mais baratos e subsídios indiretos como o Reintegro”, afirmou.
Até tu, Tailândia
Além do excesso de produto do Uruguai e da Argentina, outra importação que prejudicou o mercado brasileiro foi o ingresso, a partir de março, de 65 mil toneladas de arroz beneficiado da Tailândia. Já havia um excedente asiático no país, referente às importações com TEC reduzida de 2003. Em outubro havia arroz branco tailandês sendo vendido a R$ 62,00/ 60kg CIF-São Paulo, quase R$ 7,00 mais barato que o arroz do Rio Grande do Sul. Portanto, enquanto o foco estava centralizado no Mercosul, o produto asiático também fazia estragos no mercado brasileiro. As quase 200 mil toneladas de arroz beneficiado trazidas do Mercosul entre março e setembro, e com boa qualidade, também interferiram nos preços.
A evolução da crise
Para não perder mercado, já que o arroz industrializado do Uruguai e Argentina entrava direto em São Paulo a partir da isenção do PIS/Cofins, a indústria brasileira, principalmente a gaúcha, passou a comprar mais produto barato do Mercosul. O resultado foi uma reação em cadeia. Os supermercadistas adotaram a estratégia de comprar apenas o essencial, forçando a alta competição da indústria pelo mercado, e, por sua vez, os engenhos passaram a pressionar para que o produto interno, em casca e na mão dos arrozeiros, alcançasse paridade com o Conesul. Foi deflagrada uma depressão histórica de preços, fazendo com que em algumas regiões a cotação caísse R$ 9,00 (mais de três dólares) em oito meses (março a novembro).
Um fator a considerar é que apesar das cotações terem batido na casa dos R$ 23,50, em paridade de preços com o Mercosul, os produtores gaúchos se retiraram do mercado e só vendem uma carga em casos excepcionais. Em novembro, quase 22% da safra gaúcha segue na mão dos produtores mais capitalizados, que conseguiram segurar o produto.
Sem mecanismos
Um dos fatores coadjuvantes que contribuíram para a queda acentuada dos preços do arroz no mercado brasileiro e no Mercosul em 2004, pode ser considerado uma falha de estratégia do setor. Como o mercado mantinha preços equilibrados em março, abril e maio, não foram disponibilizados mecanismos de comercialização. O contrato de opção privado, apesar de gestado desde 2003, só está sendo liberado agora no final de 2004, depois que a porteira já arrombou. A entrada desse mecanismo em julho ou agosto, para um volume de pelo menos 600 mil toneladas, poderia ter contido a queda dos preços. Em setembro, em um congresso em Porto Alegre, representantes do Governo Federal afirmavam que o preço do arroz não cairia abaixo dos R$ 29,00 para o saco de 50 quilos com 58% de inteiros. Na segunda quinzena de novembro chegou a R$ 23,50 em quase todas as regiões gaúchas, e o arroz de boa qualidade era vendido a R$ 26,00 (60 quilos) no Mato Grosso.
Questão básica
Na comercialização da safra 2003/ 2004, existem pelo menos três situações: os arrozeiros menos capitalizados venderam a safra logo após a colheita e fizeram uma boa média de preços, acima dos R$ 30,00/ saco. Outros escalonaram a venda e obtêm até o momento valor superior aos R$ 28,00. Os produtores mais capitalizados e/ou que esperavam alta dos preços na entressafra retiveram a maior parte do arroz e agora não conseguem vender a preços competitivos.
Fatores de Queda
1. Safra cheia no Brasil
2. Safra cheia e excedentes do Mercosul
3. Competitividade, isenção e vantagens tributárias do Mercosul
4. Isenção do PIS/Cofins para arroz esbramado e beneficiado do Uruguai e da Argentina
5. Importações da Ásia e dos Estados Unidos
6. Falta de mecanismos de comercialização no momento adequado
7. Valorização do real perante o dolar (câmbio)