Soja brasileira inicia 2025 sustentada pelo câmbio

Dos três principais fatores que influenciam diretamente o preço da soja no Brasil, o câmbio, a partir de meados de novembro passado, teve a maior participação até o fim de janeiro. Efetivamente, a moeda brasileira se desvalorizou fortemente, passando de um patamar ao redor de R$ 5,77 por dólar na primeira quinzena de novembro para R$ 6,12 na média da primeira semana de janeiro, com pico acima de R$ 6,20 e ficando quase todo o mês acima dos R$ 6,00.

Na média, a desvalorização do real no período alcançou a 6,1%. Esse movimento se deu pelo efeito da eleição de Donald Trump à presidência dos EUA e suas promessas de iniciar uma guerra comercial, especialmente com a China, e pelo insuficiente pacote fiscal anunciado pelo governo brasileiro no fim de novembro.

Já o bushel da oleaginosa, em Chicago, chegou a bater em US$ 9,51 em 18 de dezembro passado, registrando uma das mais baixas cotações desde agosto de 2020. A média de dezembro/24 fechou em US$ 9,83, contra US$ 13,10 em dezembro/23. Com isso, os preços médios da soja gaúcha, no balcão, mantiveram-se entre R$ 125,00 e R$ 130,00/saco em grande parte do período (contra R$ 131,00 a R$ 137,00 um ano antes). Lembrando que o preço em nossos portos continua bastante baixo para março e abril próximos, girando ao redor de apenas US$ 0,10 a US$ 0,15/bushel.

Assim, no início de 2025, se o câmbio tivesse permanecido na média da primeira quinzena de novembro, os preços da oleaginosa teriam girado ao redor de R$ 110,00/saco no balcão gaúcho. Dito isso, é a partir do início de janeiro/25 que a situação se altera um pouco, com o bushel se valorizando e o real ganhando força. A ponto de, na terceira semana de janeiro, o real voltar à casa dos R$ 5,90 (e até um pouco menos), enquanto a soja, em Chicago, subiu para o patamar de US$ 10,50/bushel (bateu em US$ 10,67 no dia 21/01, sempre considerando o primeiro mês cotado).

No caso cambial, o mercado ainda espera maiores definições dos rumos que o controle fiscal brasileiro irá tomar neste novo ano, ao mesmo tempo em que Trump, a partir de sua posse, aliviou seu discurso protecionista em relação ao comércio mundial em geral e aos chineses em particular. Mas ainda há muita coisa para acontecer e mudanças especulativas importantes não podem ser descartadas nesta área. Não é por nada que o Banco Central brasileiro, entre meados de novembro e meados de janeiro, gastou ao redor de US$ 30 bilhões de nossas reservas visando evitar maior desvalorização do real. Já pelo lado de Chicago, mais uma vez a seca no sul do Brasil e na Argentina, entre meados de dezembro e o mês de janeiro, com calor extremo em boa parte das regiões produtoras de soja, foi o principal gatilho para o aumento das cotações.

A possibilidade de uma menor safra na Argentina elevou o preço do farelo em Chicago, com o mesmo ganhando 11,4% em valor entre o início de dezembro e o 21 de janeiro.

Já o óleo de soja, puxado pelo momentâneo aumento nos preços mundiais do petróleo e menor safra internacional de soja, ganhou 17,4% em valor nos primeiros 10 dias úteis de janeiro. Soma-se a isso a redução na produção final dos EUA na safra 2024/25, com reflexos nos estoques finais locais, assim como na oferta mundial de soja e seus estoques finais, conforme o relatório de oferta e demanda do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda) divulgado no dia 10/01.

Hoje já é possível considerar que o Brasil dificilmente terá a safra de 170 milhões de toneladas inicialmente prevista, embora a tendência indique que a mesma ainda possa ser um recorde. E na Argentina, as 52 milhões de toneladas esperadas também já estariam parcialmente comprometidas.

Em tal contexto, a tendência de curto prazo é o mercado se acomodar nos atuais níveis, com viés de baixa se as chuvas retornarem nas regiões produtoras do Sul brasileiro e da Argentina. Nesse caso, um retorno de Chicago aos níveis de US$ 9,50/bushel não pode ser descartado, embora haja uma possibilidade de a área de soja, a ser semeada nos EUA em 2025, vir a ser menor, o que dará sustentação às cotações.

(*) Primeiros 15 dias úteis (até o dia 23/01, inclusive). Nota: um bushel = 27,21 quilos. Fonte: Ceema, a partir de dados diários da Cbot.

Já os preços em reais, com a pressão da colheita nacional, nas próximas semanas, e sem novos prejuízos climáticos, estarão na dependência do câmbio, o qual deve voltar aos níveis de R$ 5,70 a R$ 5,80 por dólar se o governo brasileiro indicar um mínimo de responsabilidade fiscal neste primeiro semestre. Lembrando que o Banco Central já indicou dois aumentos de um ponto percentual na Selic até o fim de março, o que a levaria para 14,25% ao ano. Isso é outro fator de valorização do real caso os juros estadunidenses se mantiverem estáveis.

Resta verificar como os produtores irão administrar os novos custos de produção, já que a forte desvalorização cambial destes últimos dois meses elevou os preços, mais uma vez, dos insumos importados. Pelo sim ou pelo não, o quadro continua exigindo muito cuidado econômico-financeiro, pois uma nova realidade de mercado se consolidou, passada a euforia do período 2020-2023, assim como uma nova realidade climática se faz presente desde 2020.

Argemiro Luís Brum
Professor titular do PPGDR da UNIJUI, doutor em Economia Internacional pela EHESS de Paris (França), coordenador da Central Internacional de Análises Econômicas e de Estudos de Mercado Agropecuário (CEEMA/PPGDR/UNIJUI).

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