Tivemos que nos reinventar

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Velho: novo mandato, velhos desafios

A Federação das Associações de Arrozeiros do Rio Grande do Sul (Federarroz), em 10 de junho último, reconduziu a novo mandato o presidente Alexandre Azevedo Velho, que permanecerá no cargo até 2025. Também foi reconduzido o vice-presidente, Roberto Fagundes Ghigino. Aos 54 anos, Velho é produtor de arroz e soja em Mostardas (RS). Seu segundo mandato começou em 3 de julho. Também é conselheiro do Irga, Senar (RS), Conselho Externo da Embrapa Arroz e Feijão e da Cooperativa Arrozeira Palmares. Votaram 14 associações que representam 70% da área cultivada no RS.

Planeta Arroz – O que destaca como ações relevantes da gestão 2019/22?
Alexandre Velho – “Ações em busca de mercados, intensificação de negócios com o México; posicionamento forte quanto à guerra fiscal do ICMS e à perda de competitividade da indústria do arroz gaúcha e à cadeia produtiva frente a outros estados e países. Atuamos em busca de medidas que contemplem as necessidades dos produtores em termos de crédito, seguro agrícola e apoio à comercialização. Houve avanços em mecanismos que podem dar sustentabilidade ao setor, e incentivamos a intensificação do sistema produtivo”.

Planeta Arroz – Qual o impacto da pandemia para o arrozeiro?
Alexandre Velho – “A covid-19 trouxe problemas ao mundo todo. Afora a questão de saúde, na prática produtiva, houve dificuldades para a manutenção de equipamentos, houve demora para obter peças de reposição. Mas o setor precisava seguir pela responsabilidade que tem como protagonista na produção de alimentos básicos para o Brasil e o mundo. E demonstrou isso ao garantir o abastecimento nacional e exportar a mais de 100 países. Fretes marítimos caros, custos que dispararam e desabastecimento de insumos preocupam”.

Planeta Arroz – Como vê o salto na intensificação dos sistemas produtivos?
Alexandre Velho – “Se de um lado houve avanço nas tecnologias, de outro tivemos a disparada dos custos de produção e a exigência de investir para obter produtividades que compensem este custo. Isso obrigou o arrozeiro a buscar alternativas e ele percebeu que a monocultura não era sustentável. O conjunto de fatores levou o rizicultor a buscar alternativas, como soja e pecuária, onde é possível, que trazem vantagens econômicas e agronômicas”.

Planeta Arroz – Qual o desafio deste sistema?
Alexandre Velho – “Seguir buscando alternativas, como o milho, que aumentará a área nas terras baixas, e avançar em tecnologias que tragam estabilidade produtiva às lavouras e renda”.

Planeta Arroz – O arroz, só, não viabilizaria a propriedade?
Alexandre Velho – “A perda da rentabilidade do arroz, o avanço da produtividade e o aporte do grão do Mercosul, sem contrapartida do consumo interno, uma conjuntura tributária e um mercado complexo, além dos altos custos de produção, retiraram a renda do agricultor e ele precisou buscar alternativas. O avanço das pesquisas permitiu adaptar o ambiente produtivo para atividades que remuneram melhor e têm custos menores. Exige investimento, há percalços, mas estamos dominando as técnicas. Hoje, é impossível ver a rizicultura sem associá-la a outras atividades. Onde é possível, haverá rotação e integração pela expectativa de renda”.

Planeta Arroz – E surgiu o projeto Duas Safras da Farsul, governo do Estado, Embrapa e apoio da Federarroz?
Alexandre Velho – “O projeto Duas Safras quer ampliar o uso do solo, a produtividade e gerar a autossuficiência gaúcha em grãos, como o milho. O arroz gaúcho responde por 70% da produção nacional, mas há áreas que podem ser intensificadas, como os 400 mil hectares de soja em várzeas desta safra. Vamos crescer em milho. Há o desafio de aproveitamento maior e melhor das terras baixas no inverno, onde a pesquisa avança. O Duas Safras coincide com o título da próxima Abertura Oficial da Colheita do Arroz: ‘Arrozeiros como produtores multissafras’”.

Planeta Arroz – Por que o arroz foi a R$ 120,00 na pandemia, e caiu abaixo dos R$ 70,00?
Alexandre Velho – “Veja a complexidade do setor e a diferença em relação à soja e ao milho, que têm o mercado futuro a balizar preços. O arroz depende do humor do mercado e questões de produção, consumo, câmbio, demanda, oportunidade, intervenções governamentais. Avançamos em produtividade e qualidade, mas há muito a fazer em questão de mercado”.

Planeta Arroz – A situação econômica também impacta…
Alexandre Velho – “A queda dos preços reflete a crise econômica, embora o arroz siga sendo um alimento acessível e de qualidade. É mais consumido pelas classes C, D e E, que estão com poder aquisitivo menor e caiu um pouco a demanda. Mas o arroz cumpre seu papel social e é o alimento mais barato da cesta básica”.

“O arroz não deixa margem para erro”

Planeta Arroz – Que lições trazem as perdas da última safra?
Alexandre Velho – “As grandes perdas historicamente ocorrem sob condições de El Niño. A safra passada foi a que mais perdas ocorreram sob La Niña. A lição é que precisamos investir, dentro do possível, em sistemas de irrigação adaptados a cada realidade. E de seguro agrícola. Apesar das perdas, a safra ficou dentro do esperado para suas condições de clima”.

Planeta Arroz – O que espera da próxima safra?
Alexandre Velho – “O cenário indica redução da área plantada no Rio Grande do Sul para perto de 800 mil hectares. Isso trará ajuste entre oferta e demanda e deve elevar as cotações a um nível superior ao custo. O Brasil deve diminuir 200 mil hectares, para 1,4 milhão de hectares”.

Planeta Arroz – Como enfrentar o alto custo de produção?
Alexandre Velho – “É o grande desafio. Exigirá gestão eficiente do processo produtivo e diluição dos custos com outras culturas. A dobradinha arroz-soja é fundamental neste sentido. É preciso atualizar as planilhas, contratos de arrendamento e acompanhar de perto os números da gestão. Não é possível plantar neste custo e torcer para o preço superar o desembolso e trazer renda. O arroz não deixa margem para erro”.

Planeta Arroz – O que espera do mercado daqui pra frente?
Alexandre Velho – “O cenário não permiti enxergar recordes de preços, estou otimista em função da retomada das exportações, um câmbio mais favorável. A tendência de redução de área no país, que enxugará a oferta, pode trazer preços remuneradores”.

Planeta Arroz – Como o produtor pode ajudar a exportar e recuperar preços?
Alexandre Velho – “O produtor precisa entender que exportar é investimento. O sul precisa embarcar de 1,2 milhão a 1,5 milhão de toneladas anuais, base casca, para neutralizar as compras no Mercosul e ter superávit, ajustando oferta e demanda. Se vender 10% a 15% da colheita a preço de custo ou margem estreita, ele dá suporte aos preços internos e valoriza 85% a 90% do grão em seu poder. Poucos entendem essa lógica. É um dos desafios da nova gestão”.

Planeta Arroz – Como ter presença contínua no mercado externo?
Alexandre Velho – “Passando confiança aos clientes. O Brasil é um dos maiores exportadores de grãos do mundo. Precisamos buscar mercados, fidelizar os que já são clientes e conhecem a qualidade do nosso arroz, e isso quer dizer que, eventualmente, apesar de uma pequena diferença de preços, precisamos garantir o negócio. Se estamos com preços internos baixos, empatar exportando para garantir a reação das cotações e renda pode ser uma vitória”.

“Ao exportar 10%, se valoriza 90% do arroz no mercado interno”

Planeta Arroz – Ainda temos os gargalos do Mercosul?
Alexandre Velho – “As questões do Mercosul são tratadas há décadas sem avanço. Embora o mercado seja comum, é cheio de restrições ao agricultor brasileiro. Da liberdade à compra de insumos até a diferença tributária, há distorções na condição competitiva de cada um. Precisamos evoluir para que exista, sim, liberdade de comercializar, mas igualdade nas condições de produzir. Produzindo em condições diferentes, não há como competir em igualdade”.

Planeta Arroz – E em relação à guerra fiscal?
Alexandre Velho – “As diferenças tributárias, referentes às alíquotas do ICMS entre estados, fizeram com que Federarroz, cooperativas e indústrias buscassem no governo do Estado equalização tributária para recuperar a competitividade gaúcha. Enquanto temos 4% a 7% de ICMS, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo e Espírito Santo zeram alíquotas, pois são grandes consumidores. Além das vantagens pelo custo de produção menor, que já permite ao arroz paraguaio chegar R$ 10,00 abaixo dos preços gaúchos nestes estados, a norma tributária estabeleceu diferença ainda maior. É como se pagássemos uma TEC. Esperávamos do governo as medidas equalizadoras previstas em lei, mas não ocorreu. Será batalha da nova gestão”.

Planeta Arroz – O que esperar da próximas aberturas da colheita?
Alexandre Velho – “As duas últimas edições, em plena pandemia, foram grandes desafios. Em 2021, além das restrições, um temporal afetou as estruturas. Demos a volta por cima ao realizar a maior de todas em 2022. O desafio é seguir como referência, apresentando as melhores tecnologias, equipamentos e insumos, formar a agenda político setorial e manter-se como centro dos grandes debates da orizicultura gaúcha”.

Planeta Arroz – Quais as metas da nova gestão?
Alexandre Velho – “Seguiremos atuando fortemente em questões que impactem na redução de custos, impacto e desigualdade tributárias, em favor da competitividade, abertura de mercados, intensificação do sistema produtivo, renda ao agricultor e em defesa do arrozeiro”.

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