Cenários e tendências de mercado e produção de arroz no Brasil

Com o início da pandemia em março de 2020, o setor orizícola brasileiro presenciou, ao longo do ano em questão, um intenso aumento de preços, principalmente em razão do menor estoque inicial da safra 2019/20, da redução de área plantada da cultura nas safras anteriores e da elevação da demanda externa por arroz brasileiro. Mais especificamente sobre a redução de área, a baixa rentabilidade identificada entre as safras 2016/17 e 2018/19 foi a principal causa do desestímulo de manutenção da superfície semeada da cultura, ainda mais quando comparada à rentabilidade mais elevada da soja. Ao encontro desse cenário, houve um intenso desenvolvimento no manejo e na tecnologia implantada da soja em tradicionais áreas de arroz, principalmente no estado do Rio Grande do Sul (RS).

Acerca da aquecida demanda externa, com a intensificação da pandemia, importantes países exportadores do grão restringiram a comercialização de arroz no mercado internacional, o que resultou em intensa busca pelo grão brasileiro por parte dos importadores. Somando todos os fatores expostos, no segundo semestre de 2020, notou-se um mercado com uma oferta mais restrita no Brasil e, como resposta a essa conjuntura, o governo federal zerou a tarifa externa comum (TEC) para a importação de 300 mil toneladas do cereal de mercados fora do bloco do Mercosul.

Na ocasião, observou-se uma intensa dificuldade por parte das indústrias de beneficiamento no encontro de produto que atendesse a exigência do público brasileiro, sendo que, após diversas tentativas frustradas, o setor encontrou um tipo de arroz tailandês mais em consonância ao paladar local. Apesar do volume limitado de 300 mil toneladas, em conjunto com o produto importado dos nossos parceiros do Mercosul, o Brasil importou na safra 2019/2020 aproximadamente 1,3 milhão de toneladas, o que refletiu em uma menor tensão do ajustado quadro de oferta e demanda na conjuntura em questão.

Valorização
Diante desse cenário de menor oferta, os preços nacionais tiveram uma forte valorização, o que resultou em incentivo ao incremento de área, após seguidas safras de redução de área plantada da cultura. Todavia, em razão de restrição hídrica no momento da semeadura, a expansão de área ficou aquém do potencial, crescendo apenas 0,8% na safra 2020/21, sendo que a produtividade recorde, alcançada na temporada em questão, foi o que garantiu um expressivo incremento produtivo para 11,8 milhões de toneladas, 583 mil toneladas acima da safra 2019/20.

Com a recuperação da oferta nacional e a intensa redução da demanda externa em razão principalmente das cotações nacionais acima das paridades de exportação e da normalização do fluxo comercial dos principais países exportadores, notou-se, ao longo de 2021, um intenso reajuste dos preços internos de arroz.

Na safra 2021/22, em conjunto com os preços mais baixos e ainda com a significativa elevação dos principais insumos da lavoura, observou-se o retorno da tendência de redução de área da cultura, com um decréscimo de 3,63% na comparação com a safra anterior. Somado a isso, a menor produtividade alcançada na safra 2021/22, em meio à escassez hídrica no desenvolvimento das plantas, refletiu em redução da produção brasileira, sendo colhidas 10,8 milhões de toneladas.

Paralelamente aos preços nacionais mais baixos que as paridades de exportação, identificou-se nos Estados Unidos uma forte redução de área e de produção de arroz, fatores que resultaram em uma exportação recorde no período, de 2,1 milhões de toneladas.

Na época de definição de área da safra 2022/23, como já ilustrado, a cotação do arroz não estava atrativa, o que, em conjunto com um bom cenário de rentabilidade e climático para a soja, dado que por mais um ano havia um quadro de La Niña e de menor regimes de chuvas nos terrenos de várzea (principalmente no RS), resultou em intensa redução de área, em 8,51% no país e, no Rio Grande do Sul, em -9,9%. Com uma produtividade próxima de uma normalidade esperada, a safra 2022/23 encerrou ligeiramente acima de 10 milhões de toneladas, sendo esse volume colhido o menor das últimas 20 safras.

Adicionalmente a isso, nota-se atualmente uma intensa demanda externa pelo grão brasileiro, sendo que, no acumulado entre janeiro e julho de 2023, o Brasil já exportou mais de um milhão de toneladas, com expectativa de que, mesmo que fique abaixo do recorde exportado em 2022, ainda assim seja um ano com um volume acima da média histórica do setor.

Cenário mundial
Esse prognóstico é fundamentado no atual cenário mundial do mercado de arroz, o qual apresenta significativo déficit produtivo na safra 2022/23 e projeção de manutenção de déficit produtivo para a safra 2023/24, segundo dados do Departamento de Agricultura Norte-Americano (Usda).

Ainda sobre o mercado internacional, destaca-se a recente restrição do principal exportador mundial do grão, a Índia, o que tem refletido em forte elevação das cotações internacionais e provavelmente manterá o intenso interesse pela aquisição de arroz brasileiro por parte dos importadores. Ademais, o quadro climático atual é de El Niño, o que já tem refletido em escassez de chuvas em importantes regiões produtoras no sudeste asiático, principal região produtora de arroz no mundo.

Tendências
Diante de todo o cenário exposto e ainda destacando uma redução de estoque de passagem ao longo de 2023, a estimativa é de recuperação dos preços nacionais e, com isso, projeta-se um novo estímulo para a recuperação de área de arroz. Corroborando tal expectativa, o atual fenômeno El Niño em curso deverá resultar em maior intensidade de chuvas no RS, o que elevará os riscos dos produtores plantarem soja em terras baixas. Cabe pontuar que o cenário da safra 2022/23 possui diversas semelhanças com o cenário vivenciado na safra 2019/20, porém, com uma demanda nacional menor do que a identificada no início da pandemia.

Por último, é importante pontuar que em meados de setembro/23 a Conab irá promover publicação das Perspectivas Agropecuárias para a Safra 2023/24, com os números projetados de área e de produtividade, além do quadro de oferta e demanda para a próxima safra. O evento poderá ser acompanhado de forma presencial e pelas redes sociais.

Sérgio Roberto Gomes dos Santos Júnior
Analista de Mercado do Arroz
Gerente de Produtos Agropecuários (Conab)

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