Arroz na segurança alimentar

1. Evolução na preocupação com os alimentos
A segurança alimentar tem seu primeiro registro ao homem nômade passar a gregário. Ao selecionar grãos, inicia o melhoramento genético.
O Antigo Egito registra a preocupação dos faraós em armazenar grãos para atender localidades com carência alimentar.
Os romanos, com atenção à logística de suas conquistas, constroem a Via Appia, facilitando o encontro entre suprimentos e tropas.
Nas duas grandes guerras do Século 20, a carência dos alimentos no front é determinante para as derrotas alemãs para o “general inverno”.
Em 1945, é criada a FAO, com a preocupação com a fome do pós-guerra. Estabelece um estoque de segurança solidário: reservas de 18% das colheitas para atender catástrofes ou fenômenos naturais.
À medida que o problema quantitativo se afasta, o indicador vai sendo esquecido.
Hoje, atendida a demanda por quantidade, persiste o problema de suprimento pela falta de democratização na distribuição e/ou acesso ao alimento.
É a vergonha do mundo: o homo aparentemente mais sapiens, mas cada vez menos humano!
Napoleão, no entorno de 1800, também experimenta o mesmo sabor amargo da derrota, apesar de duas ações em segurança alimentar, patrocinando pesquisas sobre a conservação de alimentos por enlatamento, de Nicolas Appert, sobre a produção de açúcar de beterraba, para suprir o dano do bloqueio continental, impeditivo à chegada do açúcar de cana da América.
As três últimas globalizações também trazem sua contribuição à segurança alimentar.
A globalização das grandes navegações é comandada por dois tipos de conhecimento:
(1) O hardware, representado pela bússola, o astrolábio e o sextante, e
(2) O software, representado pela arte de navegar, de construir embarcações e de gerenciar suprimentos.
A gerência de suprimentos em uma nau singrando águas desconhecidas gera conhecimento sobre como distribuir bens finitos de sobrevivência em um espaço “infinito” de deslocamento.
A globalização da Revolução Industrial, comandada pela máquina a vapor, traz alívio ao trabalho humano enfadonho e consegue abolir a escravatura.
Na América, a mão de obra necessária troca de cor: do escravo preto africano para o colono branco. Este migra do desemprego e da fome, gerados pela mecanização do Velho Continente, para a esperança na construção do Novo Mundo.
A mecanização no beneficiamento do arroz resulta na substituição do trabalho manual em pilão pelo descascamento por máquina.
A globalização da telemática surge com avanços até então inimagináveis nas comunicações e na informática. É a terceira onda. Faz a informação chegar instantaneamente em qualquer lugar, acelerando decisões com novos pontos de vista sobre a segurança alimentar.
Junto ao turbilhão de informações sobre tudo e sobre todos, desponta o aspecto da sustentabilidade.
A segurança alimentar e nutricional sustentável surge da célere difusão da consciência sobre o meio ambiente e direitos humanos, questionando a “produção a qualquer custo”.
2. Segurança alimentar e nutricional sustentável
Essa modalidade de segurança é sustentada por dois pilares:
(a) Pelo termo “alimentar”, vinculado ao trinômio produção-comercialização-consumo, e
(b) Pelo termo “nutricional”, tratando da utilização do alimento e seu reflexo na saúde, complementado pela sustentabilidade pelas ópticas ambiental, cultural, social e econômica.
A linha do tempo avança: o amanhã é hoje!
Um legado positivos do Século 20 é a consciência de que o homem não dispõe de “uma natureza para experimentar e outra para viver”.
As ondas hertzianas derrubam fronteiras e muros. Contornos diferentes passam a exigir estratégias mais complexas. A segurança alimentar vê ampliada sua abrangência, recebendo – junto ao enfoque básico de alimentar e nutrir – preocupações com custos dos alimentos básicos, com hábitos alimentares e harmonia social e ambiental.
2.1. Programas governamentais e privados no Brasil
O Século 21 tem início com programas sociais em andamento. O aperfeiçoamento da merenda escolar e o Fome Zero (hoje relocados) ganham fama e têm sido disseminados pelo Terceiro Mundo, com adaptação às idiossincrasias locais. As ações desses programas priorizam alimentos de produção local, de hábito alimentar do público-alvo e dentro de um orçamento compatível. Atinge, assim, aspectos do amplo termo sustentabilidade.
No segmento privado, uma importante iniciativa é dos bancos de alimentos, pautados sobre a consciência da responsabilidade social.
A iniciativa visa combater à desnutrição e à obesidade (pela “fome oculta”).
2.2. Arroz vitaminado, enriquecido, fortalecido, fortificado
As quatro denominações têm sido consideradas como sinônimos!
Em relação ao vitaminado, o nome mais adequado seria enriquecido, por envolver, além de vitaminas, minerais.
A adição de vitaminas e minerais ao arroz é uma forma inteligente e barata de combater a “fome oculta”. Destacam-se a adição de minerais, como zinco e ferro, e vitaminas do complexo B, como niacina (B1) e ácido fólico (B9).
Trata-se de ação avalizada por organismos internacionais e nacionais.
Principais meios para o enriquecimento do arroz:
(a) Processo de aspersão: uma solução contendo os nutrientes é borrifada sobre os grãos convencionais beneficiados – branco ou parboilizado.
Apresenta questionamentos: perda de nutrientes por oxidação ou durante a lavagem.
É, ainda, o meio mais usado nos EUA.
O USDA aborda somente o arroz branco, talvez por considerar o parboilizado como naturalmente enriquecido.
O arroz longo fino tem como vantagem sua maior superfície específica, fator de maior capacidade de retenção superficial.
(b) Processo do grão reconstituído: uma farinha de arroz é adicionada de micronutrientes e extrusada, formando um novo grão. Segue-se a “diluição sólida”, misturando o grão enriquecido com arroz branco ou parboilizado. Recomenda-se a mistura de 5%, por ser mais garantida sua composição constante em micronutrientes na embalagem que chega ao consumidor.
É o mais moderno, sendo a extrusão do tipo formatação, tal como praticado na produção de massas.
Uma vez misturado, o “grão reconstituído” é de difícil diferenciação, exceto junto à ponta que seria do germe. Um fator importante é a conservação de hábito alimentar do consumidor de arroz, que recebe um alimento mais nobre sem diferenças sensoriais e culinárias.
A adesão das marcas de arroz ao Selo do Arroz Vitaminado pode ser feita de duas maneiras:
(a) Produzindo o arroz enriquecido e misturando-o, e
(b) Adquirindo o grão enriquecido e fazendo a mistura.
2. 3. Fatores da escolha do arroz como veículo para alimento
– Tem a proteína de mais alto valor biológico entre os cereais de grande consumo.
– É fonte de carboidrato (o principal nutriente do cérebro), cuja complexidade contribui para classificar o arroz com índice glicêmico mais baixo que o trigo.
– É hipoalegênico, incluindo sua isenção de glúten.
Outras características gerais, atendendo aspectos como a sustentabilidade:
– Produto de baixo custo.
– Grão escolhido pelos solos e climas, mas principalmente pela população do Brasil, o primeiro país na produção e consumo de arroz fora do continente asiático.
2.4. Arroz parboilizado: naturalmente fortificado
A possibilidade de compor a base do arroz fortificado traz a oportunidade para o parboilizado dar mais um saldo no consumo nacional e na exportação.
O fato de já possuir uma concentração maior de vitaminas e minerais, consagrada desde há muito pela FAO e OMS, o conduzem como matéria-prima importante para o arroz fortificado.
O parboilizado concentra fatores de segurança alimentar como estabilização enzimática e baixíssima “quebra técnica”, oferecendo maior quantidade de alimento durante mais tempo.
Hipócrates, “pai da medicina” – [460-377a.C.]:
“Que teu remédio seja teu alimento;
que teu alimento seja teu remédio”.
Nota: uma versão mais pormenorizada do presente artigo está disponível no site www.planetaarroz.com.br.

Gilberto Wageck Amato
Eng. Quím., M. Sc.
Pesquisador da Cientec

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