Cada vez mais natural

 Cada vez mais natural

A cada ano melhora a relação da natureza com a lavoura do arroz

Autoria: Eugênio Passos Schröder.

Uma boa notícia: usa-se hoje 1% do herbicida que era aplicado há 20 anos

Hoje usamos uma quantidade de herbicidas em cada hectare de arroz equivalente a apenas 1% do que era empregado há 20 anos. Parece impossível? Então, façamos uma análise do assunto. Na lavoura orizícola gaúcha são utilizados produtos fitossanitários para o controle de pragas, doenças e plantas daninhas há pelo menos 30 anos. Estes insumos químicos permitem que a cultura não sofra perdas significativas e possa, assim, expressar o seu máximo potencial produtivo.

Porém, o emprego em larga escala dos agrotóxicos é motivo de questionamento freqüente quanto a eventual ocorrência de resíduos no solo e nos grãos colhidos. Diversos estudos têm comprovado a rápida degradação das moléculas químicas no solo, com destaque para processos microbianos envolvidos, o que permite inclusive utilizar as áreas para a implantação de pastagens por ocasião da colheita do arroz.

Por outro lado, análises nos grãos confirmam a ausência de resíduos quando os insumos são aplicados respeitando-se os períodos de carência. Na busca de uma lavoura cada vez mais limpa e de baixo custo, os produtores têm adotado métodos de cultivo que reduzem ainda mais o uso dos produtos fitossanitários, com destaque para os herbicidas. Entre eles, destaca-se o cultivo pré-germinado, que hoje ocupa cerca de 10% da área do estado e, na maioria dos casos, requer apenas o controle químico de plantas daninhas aquáticas.

Outro sistema ainda mais limpo é a rizipiscicultura, que já é adotada por muitos produtores e não exige o uso de herbicidas. O arroz orgânico, isento do uso de químicos, já é cultivado principalmente em pequenas propriedades, e está gerando uma renda significativa aos agricultores devido ao preço favorável que o produto final obtém no mercado.

Por outro lado, o plantio direto e o cultivo mínimo já são responsáveis por aproximadamente metade da área plantada, e o manejo das lavouras, associado ao uso do herbicida dessecante, tem reduzido a necessidade de produtos para manter as populações de plantas daninhas em níveis aceitáveis. Se por um lado os produtores buscaram métodos de cultivo mais limpos, a indústria agroquímica também se adequou às novas tendências de mercado e tem lançado produtos fitossanitários mais eficientes, que necessitam doses cada vez menores de ingrediente ativo, o que torna sua degradação mais rápida após o uso. Além disso, as formulações modernas tendem a ser mais concentradas e menos agressivas ao ambiente.

Quando comecei a trabalhar com assistência técnica na aplicação de herbicidas em arroz, no final dos anos 70, ainda era usado o sistema de gotejamento de molinate diretamente sobre a entrada d’água na lavoura (pinga-pinga). Nestes 25 anos, a tecnologia de aplicação evoluiu muito. Os equipamentos terrestres tiveram seu sistema de rodado adaptado para transpor as taipas e novos bicos de pulverização foram lançados, mas o trânsito dentro das áreas úmidas, com taipas ou mesmo irrigadas, continuou limitando o seu uso.

Por outro lado, a aviação agrícola se modernizou, foram construídos aeródromos (pistas de pouso) em muitas propriedades rurais, reduziu-se o volume de calda de 40 a 50 litros por hectare para 20 a 30 litros a fim de tornar as pulverizações mais produtivas, equiparam-se as aeronaves com DGPS para balizamento orientado por sinais de satélites (eliminando o risco de exposição de balizadores humanos aos agroquímicos) e formaram-se muitos profissionais para atuar no setor.

A diferença na uniformidade de distribuição de um herbicida através do velho sistema “pinga-pinga” e por aviação agrícola nos dias de hoje é tão grande que nem pode ser quantificada, mas seguramente permitiu que menores dosagens dos insumos passassem a ser empregadas. O quadro em anexo ilustra, de modo resumido, a grande redução na quantidade de herbicida usado por hectare, tanto em ingrediente ativo quanto em produto comercial formulado. Mostra também a tendência do uso de formulações menos agressivas ao ambiente, substituindo os concentrados emulsionáveis (CE) que possuem solventes e outros adjuvantes derivados de petróleo na sua constituição.

Na primeira parte, cita alguns dos herbicidas mais usados no Rio Grande do Sul no início dos anos 80, onde podemos observar que a quantidade de ingrediente ativo variava entre quatro e seis quilos/hectare, chegando à quantidade de produto comercial formulado a valores médios entre oito e 15 litros/hectare. A formulação mais usada era concentrado emulsionável.

Na segunda parte, são apresentados alguns dos herbicidas mais empregados no final dos anos 90, onde podemos observar quantidades de ingrediente ativo inferiores a 100 gramas/hectare (na maioria dos casos ao redor de 50 gramas/hectare) e, no caso de produto comercial formulado, menos de um litro/hectare, com formulações mais modernas como as soluções aquosas e grânulos dispersíveis em água. Exceções são o glifosate, que passou a ser usado nos anos 90 no plantio direto e cultivo mínimo, e o propanil associado ao clomazone, que ainda resultam em doses elevadas, disponíveis em formulações mais concentradas.

A redução na quantidade de produtos alterou os tamanhos das embalagens, que antes consistiam em baldes de 20 litros e tambores de 100 a 200 litros, enquanto hoje se constituem em frascos com capacidade não superior a cinco litros na sua maioria. Práticas ultrapassadas de enterrio de embalagens vazias foram substituídas por um moderno sistema de descontaminação e recolhimento para reciclagem.

Em palestras e treinamentos temos ressaltado a necessidade de redobrarem-se os cuidados com os frascos dosadores para o preparo das caldas, os quais requerem escalas cada vez mais precisas e que permitam mensurar pequenas quantidades. Desta forma, passamos a falar em gramas e mililitros, no lugar de quilogramas e litros. A redução do total de ingrediente ativo de cinco quilos para apenas 50 gramas/hectare representa uma quantidade de moléculas químicas hoje equivalente a apenas 1% do que usávamos há 20 anos. Menos produto aplicado num hectare seguramente resulta em processos mais rápidos de degradação, tornando nossas lavouras mais limpas e seguras.


Quem é

Eugênio Passos Schröder é engenheiro agrônomo e consultor em fitossanidade e tecnologia de aplicação. Consulte também a internet em http://paginas.terra.com.br/negocios/eugenioschroder

 

O veneno de cada época

Alguns dos herbicidas mais utilizados no início dos anos 80 e final dos anos 90 em arroz irrigado no Rio Grande do Sul, com as respectivas quantidades aplicadas por hectare

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