Em busca do equilíbrio

Programa Campo Futuro prevê margens estreitas ao arrozeiro em 2021/22

A histórica margem de lucro obtida pelos arrozeiros ao longo de 2020 e 2021 graças à disparada do consumo e antecipação dos estoques durante a pandemia de covid-19 ficará para trás e não deve se repetir na temporada 2021/22. A conclusão é baseada no forte avanço dos custos de produção coletados nos painéis promovidos pelo Programa Campo Futuro, avaliado em território gaúcho, pela Federação da Agricultura (Farsul) com o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea) e coordenação nacional da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Os indicativos de custos são comparados às médias de preços e a histórica volatilidade das cotações do grão para a projeção de margens.

A praça de referência, neste caso, foi Uruguaiana, município com a maior área plantada de arroz irrigado do país. A planilha de custos é montada retratando a realidade de grupos de produtores, com participação de entidades setoriais, assistência técnica e instituições, como Irga e Emater/RS. O economista Ruy Silveira Neto, da Farsul, observa que os painéis do Campo Futuro demonstram que os custos produtivos da safra 2020/21 subiram 21% sobre o ciclo anterior. A inflação do país foi de 4,52%. A despesa operacional, portanto, subiu quase cinco vezes a inflação e chegou a R$ 9.127,17 por hectare. Um ano antes, era R$ 7.525,00.

Para a safra 2021/22, a expectativa é de uma alta de 23%, mais do que o triplo da uma inflação anual prevista em 7% no país. “A aproximação entre o custo e o preço de venda exigirá que o agricultor obtenha altas produtividades para ter lucro”, alerta Silveira Neto. Considerando o indicador de inflação dos custos de produção (IICP) da Farsul, base junho/2021, a variação de 23% dos últimos 12 meses eleva a importância por hectare para R$ 11.226,43. Avaliando o dólar a R$ 5,30 – média da primeira quinzena de agosto –, equivaleria a US$ 2.118,16. A elevação, considerando as temporadas avaliadas, beira os 50%.

2020/21
Voltando à safra mais recente, o economista da Farsul explica que a elevação ocorreu, em especial, pela trajetória do câmbio e o impacto sobre insumos, como sementes e defensivos, e também pelo salto de 32% do desembolso com energia elétrica, 34% em herbicidas e 29% da administração da propriedade e das sementes, por exemplo. O custo da energia tem grande peso no desembolso, pois a irrigação é um dos pilares da cultura. “Despesas de colheita e transporte foram altas pela alta de preços e a intensidade de consumo de combustíveis”, acrescenta. Já a valorização do cereal por maior demanda doméstica e internacional, enxugamento de estoques e produtividade fortaleceram a renda do agricultor.

O ano de 2019/20 havia registrado bons resultados, mas 2020/21 foi superior. Um dos fatores foi o recorde de produtividade, com média de 206 sc/ha (10,3 toneladas) em Uruguaiana. O arroz teve em parte do ano a trajetória de alta dos demais grãos, garantindo receita de 52%. “Porém, o comportamento do cereal mudou do vinho para a água”, avalia.

Aí que mora o perigo
Enquanto o custo de insumos e operações cresce, os preços do arroz recuaram e, em agosto, mostram estabilidade entre R$ 75,00 a R$ 80,00. É aí que mora o perigo. “Essa aproximação do custo ao valor médio estimado para a comercialização do arroz torna o potencial de renda do agricultor mais curto”.

Exercício realizado por economistas do Programa Campo Futuro para a Planeta Arroz mostram que a relação entre os valores de venda e o custo operacional total (COT), considerando o rendimento médio gaúcho em 167 sacas de 50 quilos, alcançaria equilíbrio em R$ 66,87. “Mas, para seguir produzindo e investindo, o agricultor precisa de lucro”, frisa Ruy Silveira Neto, economista da Farsul.

Pelo Estatuto da Terra, a margem de renda deve ser de, ao menos, 30%. Com base no exercício dos economistas da Farsul, portanto, diante desse custo, o valor adequado de venda da saca em Uruguaiana na safra 2021/22 seria, pelo menos, R$ 86,93. “Em 2019/20, eram R$ 44,41”, observa.

Avaliando que a região mantenha o alto rendimento em 200 sacas por hectare na safra 2021/22, só para cobrir custos, teria que vender a saca a R$ 56,13. “Parece baixo, mas um ano e meio atrás a cotação era menor, não podemos esquecer”, pontua. Lembra também que, diante de custos estimados de quase R$ 67,00, é importante lembrar que há pouco mais de um mês, entre 22 de junho e 7 de julho, indicador do arroz do Cepea esteve na casa de R$ 69,00.

“Considerando essa situação, preocupa a convergência entre custo e valor de venda em que a margem de lucro é quase eliminada”, registra. O preço variou muito em 2020, foi de R$ 50,00 em fevereiro para R$ 105,00 por saca em alguns meses, mas, do fim de 2020 até julho de 2021, baixou mais de R$ 30,00, para cerca de R$ 70,00.

Então, reagiu até R$ 80,00 em agosto em algumas praças. “Há muita volatilidade, o arroz ainda busca um ponto de equilíbrio, mas o cenário da próxima temporada é diferente da última safra”, acrescenta Ruy Silveira Neto.

O economista da Farsul enfatiza que faltam quase oito meses até a colheita e os custos podem mudar. “Muitas variáveis vão interferir até a próxima colheita, mas os R$ 100,00 do ano passado não são o que o cenário indica”, reconhece.

ECONOMIA FORTE AJUDARÁ RETOMADA
O economista Ruy Silveira Neto, da Farsul, acredita que uma remuneração adequada ao arroz no Brasil, em 2022, estará bastante associada à retomada econômica, que deve ajudar na recuperação do consumo e a tornar o grão nacional competitivo no exterior. Outros dois fatores são apontados pelo economista como relevantes para a renda dos arrozeiros: a diversificação em terras baixas, com soja, milho e pecuária, e o alto nível de inovação tecnológica. Para arroz e trigo a força não é a mesma, mas o mercado se mostra interessante para soja e milho. “Ao associar outras atividades, o agricultor dilui custos e risco, otimiza o uso de recursos e pode ter uma gestão comercial mais efetiva, depender menos de financiamentos que afetam seus custos ou o obrigam a vender quando, em geral, os preços estão mais baixos”, aponta.

Conselhos para 2021/22
Com base nas informações do Campo Futuro, os economistas apontam algumas recomendações:

1. Ter controle detalhado dos custos;

2. Estar informado sobre o mercado e tendências, tanto da produção quanto dos insumos;

3. Cautela na hora de fazer investimentos para não comprometer a renda;

4. Só investir em máquinas e equipamentos se isso agregar ganhos em rentabilidade e produtividade, redução de
custos ou se a situação obrigar ao investimento;

5. Aproveitar a renda obtida para priorizar a disponibilidade financeira, liquidez é fundamental para ter uma boa
gestão comercial, obter mais renda e reduzir a dependência de capital de terceiros, como CPR´s e a obrigação de
venda com preços mais baixos e/ou aquisição de insumos com valores mais altos;

6. Diversificar, se possível e dentro do melhor planejamento, para diluir custos, otimizar o uso de recursos e
assegurar um portfólio de produtos que garanta melhores e diversificadas gestão comercial e renda.

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